Laura
Eu caminhava em silêncio ao lado de Saulo em direção a minha casa. Estava escuro e não havia muitas pessoas nas ruas, então fora o barulho dos nossos sapatos contra o asfalto, não se ouvia mais nada.
Até pensei em algumas vezes puxar algum assunto, mas além de ser tímida demais, qualquer coisa que eu falava, Saulo apenas respondia com um aceno ou um murmúrio, certamente seus pensamentos estavam ainda no rapaz que havíamos acabado de ver sendo jogado da ponte.
Eu pensava naquilo também, e lembrava exatamente do dia que havia planejado me jogar dali.
-Está pensando no rapaz, não é? -Falei.
Saulo deu um pulo se assustando com a minha voz.
-Sim, nunca tinha visto acontecer. Já ouvi muitas histórias de assassinos, ladrões... -Ele se calou por um breve momento. -Que foram jogados dali.
-Eu também, mas a maioria das histórias que escuto é sobre pessoas que se jogam de lá. -Dei de ombros. Tínhamos realidades diferentes, mas que a maioria dava para o mesmo caminho, a morte trágica.
-Imagine só, chegar ao ponto de querer dar cabo a própria vida...
-Eu sei bem como é, quando eu quis tirar a minha vida, era ali que eu ia me jogar.
-Você ia se matar?
Concordei: -Aquela noite foi horrível, para mim eu não ia conseguir mais, meus pais brigando, no caminho até a ponte fui assaltada... -Me calei ao perceber o que havia falado. Em nenhum momento eu tinha intenção de trazer aquele assunto à tona, eu sabia que havia sido Saulo quem havia me assaltado, mas aquilo era tão pequeno comparado a tantas coisas que havia acontecido.
Por mais que eu gostasse demais da corrente que haviam tirado de mim, eu tinha tantas outras que não preenchiam o vazio que eu tinha ao longo de todos aqueles anos.
-Laura... -Saulo parou de andar e olhou para mim.
-Saulo... -Engoli em seco, parando em sua frente e levantando o rosto para poder encara-lo. -Eu posso ir daqui sozinha para a casa.
-Mas...
-É melhor que ninguém veja eu acompanhada. Meus pais podem não gostar. -Me virei para começar a andar e sair o mais rápido daquela situação, mas Saulo pegou e me segurou pelo pulso.
Naquele momento um flash de memorias ruins me atingiram e senti meu corpo recuar e o coração bater acelerado:
-Me solta! -Minha voz se elevou, no mesmo instante ele me soltou.
-Me desculpa, eu não quero te machucar. Não queria ter te roubado... -Ele parecia desolado.
Eu queria chorar. Meu corpo começou a tremer, não adiantava, eu não conseguia me livrar daquilo.
-Tá tudo bem, boa noite. -Falei o mais rápido que eu conseguia.
-É sério, Laura, me desculpa por ter te roubado.
Mais uma vez, aquilo era o de menos.
-Boa noite. -Respondi e sai correndo, o deixando sem entender nada do que havia acontecido.
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O CAMINHO
SpiritualA vida de Henrique virou de cabeça para baixo, quando sua mãe contraiu diversas dívidas para tentar tirar seu irmão, Heitor do mundo do crime e das drogas. Agora ele se depara em morar em uma comunidade do outro lado da Ponte do Silêncio em um barra...