Capítulo 23 - Vitor

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Vitor

Eu subia o morro, enquanto cantarolava uma música que haviam mandado em meu celular. Era sexta de manhã e até a noite ainda precisava ficar de tocaia até que o turno terminasse e eu pudesse voltar para casa para me arrumar. Lili havia dito diversas vezes que não gostaria que eu fosse para o baile depois dos boatos que um rapaz havia sido baleado, mas eu a ignorava sem pensar duas vezes, todos os dias que eu podia, estava naquele lugar, estar ao redor de pessoas que tinham medo de mim e por isso me respeitavam, era algo que me deixava bem e eu gostava daquilo.

Me aproximei da casa de Luciano e Zequinha já estava na porta, mas antes que eu entrasse, um rapaz passou por mim, me encarando. Já era normal eu receber olhares daquele tipo por ser quem eu era, mas dentro de mim senti algo pesar. Eu já havia visto aquele maluco algumas vezes, e sabia que tinha algo errado. Ele não era da nossa quebrada, eu conhecia quase todos os moradores dali e poderia jurar de pés juntos que ele não era dos nossos.

-E ai! -Zequinha me cumprimentou. -Bora lá, Duarte está te esperando.

Olhei para trás onde o rapaz havia se encostado em uma casa que dava para outra rua como se estivesse me esperando.

-Vai na frente, eu só vou pegar um cigarro ali e já colo lá.

-Beleza.

Zequinha entrou novamente na casa e eu me virei, o rapaz havia andado um pouco para a esquina e eu corri para acompanha-lo.

-Ei! -Gritei e o rapaz parou de andar. -Por que tu ta me seguindo, filhote?

-Eu? -Ele se virou e olhou para mim com um meio sorriso.

-É, algum problema?

-Não sei, tu tá com algum, menor?

-Tu tá me seguindo por quê? Acha que eu tenho medo de você?

O rapaz se aproximou calmamente até mim:

-Não, sei que não tem, mas deveria. Tu mexeu com a pessoa errada.

-Vai ter que ser mais especifico. -Cruzei os braços na frente do corpo.

-Tu não deveria ter matado o Nascimento.

-Ah, então é isso?

-Tu vai se arrepender, menor.

-Nada do que vocês possam fazer, pode me atingir. -Falei, afinal durante todos aqueles anos eu tinha me certificado que ninguém teria algo para me atingir.

-Será mesmo? Eu não me garantiria tanto. -Ele se virou e começou a rir.

-Ei! Explica isso! -Gritei, incomodado.

-Se eu fosse você, eu iria para casa agora, procurar alguém.

Ali eu senti o chão sobre os meus pés sumindo. Sem reação, fiquei ali parado, enquanto o rapaz saia correndo pelas ruas e rindo, certamente pensando que eu iria atrás, mas a minha cabeça começava a latejar, com milhares de pensamentos sobre uma única pessoa.

Liliane.

-Cara, o que tu ta fazendo ai? Vamos entrar. -Zequinha se aproximou de mim e eu o olhei assustado. -Eita, cara. O que tu tem? Parece que viu os tira.

-Antes fosse. -Falei e o empurrei correndo em direção a casa de Pâmela.

Todo o caminho parecia ser um borrão e eu não sentia minhas pernas, todo o meu corpo gritava apenas por minha irmã. Quando dei por mim, batia na porta de Pamela, estremecendo o barraco inteiro.

-Já vai! -Pamela gritou e abriu a porta. Entrei em sua casa, sem olhar para o seu rosto. -Vitor? O que tu ta fazendo aqui?

-Cade a Liliane? -Perguntei entrando em sua cozinha e em seu quarto me certificando que ela não estava ali e aumentando ainda mais meu desespero.

-Ela ainda não chegou...

-Não chegou? -Olhei furioso para Pamela que não compreendia o meu desespero.

-O que é estranho, porque ela nunca se atrasa, normalmente ela sempre chega aqui umas dez horas da manhã e já são onze e pouca. -Ela falou olhando para o relógio confusa.

Meu peito se apertou ainda mais lembrando que eu havia saído de casa cedo e sequer havia olhado para o rosto de Liliane.

Sai correndo em direção a minha casa com Pamela em meu encalço. Não precisei abrir a porta de casa, ela já estava entreaberta e olhei todos os comosdos gritando por Liliane:

-Liliane! -Gritei, minha voz parecia rasgar a garganta e voltei para a sala onde Pamela se encontrava.

-A encontrou?

Peguei Pamela pelos cabelos com a raiva e a frustração crescendo dentro de mim:

-Cade a minha irmã? -Falei com o maxilar cerrado.

-Me solta, Vitor!

-Onde ela está? -Gritei.

-Eu não sei! -Lágrimas escorreram pelo rosto de Pamela.

-Como não sabe, sua irresponsável! Era para você estar cuidando dela! -Falei trazendo seu rosto para mais próximo que o meu. O medo estava estampado no rosto de Pamela e seu rosto estava vermelho de dor por conta de estar puxando seus cabelos. Suas mãos em vão tentavam tirar as minhas, mas era impossível com a força que eu a estava segurando.

-Vitor, por favor... -Sua voz era um fio de dor.

Meu celular tocou, tirando o meu foco dela. Soltei seus cabelos enquanto pegava meu celular que estava em meu bolso e Pamela foi ao chão, choramingando. Abri o celular e vi na tela do Whatsapp a foto de Liliane, amordaçada e machucada.

[16/09 11:47] Número Desconhecido: Diga olá para sua irmãzinha.

[16/09 11:47] Número Desconhecido: Nunca que eu iria adivinhar que você tinha um parente, soube esconder bem essa informação de seus inimigos.

[16/09 11:47] Número Desconhecido: Mas tu mexeu com a pessoa errada ao matar o Nascimento, nem que eu tivesse que ir no inferno, eu acharia um jeito de te destruir, já que todos falam que você é indestrutível.

[16/09 11:47] Número Desconhecido: E eu achei, pelo visto você não é tão sem sentimentos assim.

Senti as lagrimas escorrerem pelo meu rosto, minhas pernas fraquejaram e eu soltei o celular caindo no chão.

-Vitor... -Pamela correu até mim e me abraçou após ver a foto que estava no meu celular.

Liliane estava pagando o preço por um caminho que eu havia escolhido e não ela, e isso não era justo.

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