Vivian
Eu estava sentada na poltrona da igreja, era segunda-feira e eu não via a hora de começar a reunião do Algo a Mais. Era uma reunião um pouco diferente do Encontro Jovem, era mais séria, onde o obreiro Henrique explicava coisas como o batismo nas águas, o novo nascimento e o Espírito Santo, e como eu tinha ainda muitas dúvidas, não perdia nenhuma reunião.
Além do fato que eu não havia conseguido ir na reunião no domingo, havia alguns domingos que eu ia buscar meu filho para passar o dia com ele, e Wesley não deixava eu sair. Eu passava o domingo inteiro na casa dele e isso atrapalhava de vim até a igreja.
Eu queria trazer Ricardo para a igreja, mas além do medo de Wesley não concordar, em partes eu tinha um pouco de vergonha.
Eu sei, é horrível dizer isso, o fato era que eu não tinha vergonha do Ricardo, porque ele era a melhor coisa da minha vida, mas tinha vergonha do fato de eu ser a única mãe jovem da igreja. Todas as meninas não tinham passado metade do que eu já havia passado, eu estava me sentindo muito deslocada, então preferia não comentar nada.
E por mais que viessem pensamentos para eu parar de frequentar a igreja, aos poucos eu podia ver uma diferença. Ali na igreja eu aprendia tanta coisa!
Até que chegou um sábado, assim que eu cheguei o obreiro Henrique caminhou até mim e eu senti meu estômago revirar, não era um sentimento de nojo que eu tinha, mas parecia algo que eu havia sentido a muito tempo atrás, tanto tempo que eu nem sabia como nomear aquela sensação. Só sabia que era boa, talvez fosse porque Henrique, mesmo sem me conhecer, havia sido uma das únicas pessoas que me convenceu a continuar viva, que me apresentou uma saída melhor do que a morte.
Ele era um bom amigo, ele transmitia uma paz e uma segurança que os demais rapazes que eu conhecia não eram capazes de transmitir, porque eles não tinham o que o obreiro tinha.
-Vivian, tudo bem? -Ele sorriu para mim e automaticamente sorri de volta.
-Tudo bem, obreiro.
-Não vi você no domingo passado...
-Ah, sim. Eu tive alguns assuntos para resolver, sabe. -Não sei porque não falei a verdade, o obreiro nunca havia me julgado, mas acabei deixando de lado.
-Eu não sei se você soube o que aconteceu entre a Vitória e o Saulo...
-Ela acabou me contando, contou também que agora não pode ajudar mais nas coisas da igreja...
-Não é questão dela não poder ajudar mais nas coisas da igreja, mas ela precisa se ajudar primeiro. Como posso pregar para o jovem que ele precisa se manter fiel a Deus e não se entregar antes do casamento, se permito que um dos jovens faça isso e continue como se não fosse nada grave? Querendo ou não, existem algumas meninas que tem sua irmã como exemplo, que me tem como exemplo, não podemos pregar uma coisa e fazer outra.
-Eu entendo.
-E eu gostaria de saber se por enquanto você não gostaria de me ajudar?
Dei uma risada fraca:
-Obreiro se eu abaixar em uma dança, pode ter certeza que eu não volto mais. -Brinquei, por mais que eu dançasse muito antigamente para os rapazes que pagavam por aquilo, eu entendia que nenhuma das danças que sabia agradava a Deus.
-Não, não é em dançar, não! -Ele soltou uma risada. -É em cantar. A Vitória comentou que você gosta muito de cantar, me mostrou até um vídeo seu cantando!
Olhei para ele abismada e minhas bochechas esquentaram, pela primeira vez, fiquei sem graça diante de um homem.
-É sério? -Perguntei ao ver que ele realmente estava levando aquela ideia a sério.
-Sim! Por que não? Eu te passo a música, você ensaia e canta ela no encontro.
Concordei automaticamente, ele agradeceu e saiu andando.
Ali eu percebi que por incrível que parecesse, eu estava começando a gostar do obreiro.
Levei a mão na testa, como eu era burra! Até um cego notaria que não tinha nenhuma chance daquele sentimento dar certo! Era só observar e ver que Henrique me tratava como qualquer outra jovem, seu carinho, respeito e amor não eram pela minha pessoa, mas pela minha alma! Era só o que me faltava! Eu estava confundindo aquilo com outra coisa!
Respirei fundo, sabia que me sentia daquela forma porque fazia muito tempo que um homem se preocupava comigo, que não me via apenas como algo para se satisfazer, mas como uma pessoa normal.
Balancei a cabeça, Henrique praticamente havia nascido no caminho certo, desde pequeno tinha aprendido sobre a Bíblia e as escolhas que deveria fazer.
E eu? Estava engatinhando, como se agora tivesse nascido.
Eu tinha um passado tão podre, como o obreiro me olharia com outros olhos?
Eu não era nada, e ainda tinha um filho.
Fechei os olhos para a oração e uma lágrima escorreu pela minha bochecha.
Eu precisava reprimir aquele sentimento, não era a hora, não era o momento, e pelo visto nem seria a pessoa. Eu precisava focar no amor que realmente cabia na minha realidade, o amor que me aceitava sem nenhum julgado, o amor que me salvaria de mim mesma.
-Senhor, por favor, que eu venha continuar olhando só para o seu amor. -Sussurrei.
Eu reconhecia que aquela sensação era uma carência, eu ainda não me amava de verdade, e precisava do amor dos outros para me sentir bem, mas eu não queria mais aquilo, eu queria me amar de verdade.
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O CAMINHO
SpiritualA vida de Henrique virou de cabeça para baixo, quando sua mãe contraiu diversas dívidas para tentar tirar seu irmão, Heitor do mundo do crime e das drogas. Agora ele se depara em morar em uma comunidade do outro lado da Ponte do Silêncio em um barra...