Saulo
Meu estômago doeu e eu sabia que era de fome, mas como das outras milhares de vezes, eu o ignorei.
Eu estava ficando bom naquilo. Tentei fechar os olhos para dormir novamente, pelo menos enquando estava dormindo eu não sentia tanta fome, mas naquele momento não consegui. Me levantei e vi que já era a hora de ir para o treino, pelo menos, alguma coisa eu poderia fazer para fugir daquilo tudo.
-Filho! -Minha mãe sorriu para mim. -Bom dia, fiz mingau para tomar. -Ela colocou a tigela na minha frente, minha barriga se agitou sinalizando que não via a hora em que eu colocasse aquilo para dentro.
Olhei para a senhora que estava a minha frente. A mulher que estava aguentando tudo sem reclamar parecia cansada e seu físico magro.
-Sabe, mãe. Acordei enjoado hoje. -Empurrei a tigela para longe de mim.
-Então eu vou guardar para mais tarde...
-Não, mãe. Coma, eu vou dar um jeito.
Minha mãe fechou os olhos querendo chorar:
-Como eu queria poder trabalhar para te dar as coisas... Mas esse meu corpo inútil e podre... Só sirvo para dar trabalho e morrer!
-Não fala isso! -A olhei horrorizado, eu não poderia sequer pensar em perde-la. -Eu vou dar um jeito, a senhora vai ver. -Sorri confiante e ela começou a tossir, quando parecia que não tinha mais ar em seus pulmões, ela olhou para mim.
Quem olhasse para minha mãe, jamais diria que ela tinha apenas trinta e oito anos, ali magra, pálida e com os olhos fundos, parecia ter envelhecido cinco anos.
Dei um beijo em sua testa fria, peguei minha mochila e caminhei até o campo aonde seria o treino, meus pensamentos voavam, me lembrava do dia em que o médico havia dado o diagnóstico daquela doença... Eu precisava de dinheiro, precisava dar um jeito em nossas vidas.
-E aí, campeão! -Lucas me abraçou. -Trouxe café da manhã para nós. -Sentamos no vestiário e começamos a comer. Lucas não tinha como saber que eu não me alimentava por algum tempo, ele como meu amigo, sabia que a situação em casa não era fácil, mas nada tão angustiante que eu contasse.
-Tá sabendo da novidade? -Ele falou enquanto eu bebia o café e meu estômago finalmente se acalmava. -Teremos um jogo em que virão olheiros, certamente irão escolher alguns de nós para começar a investir.
Olhei para ele desacreditado.
-Investir para um time de verdade?
Meu coração se agitou já imaginando como seria quando eu fosse um jogador profissional. Todos me amariam, eu teria dinheiro e pessoas, minha mãe ficaria bem.
-Isso! Então hoje nós temos que dar o nosso sangue nesse treino. -Ele limpou a boca com as costas da mão. -Não serão todos do time que vai jogar amanhã, apenas os que mandarem pra valer hoje.
-Pra você não vai ser difícil... -Joguei os papéis e os copos usados no lixo. -Você deu um banho nos cara semana passada!
Lucas olhou para os lados se certificando que não havia mais ninguém ali e me levou até o banheiro:
-Preciso te mostrar uma coisa, mas não pode contar para ninguém. -Ele sussurrou, muito próximo de mim.
-Tá me estranhando, é menor? -Olhei desconfiado para ele e Lucas me deu um soco de leve no ombro. -Aí!
-Você é lindão, mas não é pra tanto. -Ele brincou e tirou do bolso alguns comprimidos.
-Mas que bagulho é esse?
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O CAMINHO
SpiritualA vida de Henrique virou de cabeça para baixo, quando sua mãe contraiu diversas dívidas para tentar tirar seu irmão, Heitor do mundo do crime e das drogas. Agora ele se depara em morar em uma comunidade do outro lado da Ponte do Silêncio em um barra...