Vivian
-Que cara é essa, meu filho? -Acariciei seus cabelos. Como ele havia crescido! Pensei tristemente, era como se cada vez que o visse, anos e não apenas meses houvessem se passado. Cada vez que eu visitava Ricardo via o quanto perdia por estar longe dele.
-Ja está escurecendo, logo a senhora vai embora.
-Meu filho, não pense nisso. -Esbocei meu melhor sorriso com o coração apertado.
-Como não pensar, mamãe? -Ele me olhou tristemente. -Capaz de eu ir no banheiro a qualquer minuto e quando voltar a senhora não estará mais aqui, como das outras vezes.
Meu coração pareceu explodir em várias partes. Como explicar para ele que eu só fazia aquilo porquê eu era fraca e não tinha coragem de dizer adeus toda vez que tinha que ir embora?
Eram aqueles momentos que faziam com que eu odiasse ainda mais a minha vida.
-Por que eu não posso morar com você, mamãe?
-Um dia, você vai vim morar com a mamãe. -Eu apertava um de seus carrinhos contra a minha mão tentando suportar a dor que crescia dentro de mim, eu não poderia chorar na frente dele, eu não me perdoaria.
-Que dia?
-Um dia, Rick. -Abaixei a cabeça, faziam cinco anos daquela promessa e eu não estava nem perto de cumpri-la.
Então a porta se abriu, Wesley e Eliza entraram. Ambos riam abraçados, mas quando o olhar do pai do meu filho recaiu sobre mim, seu sorriso se desmanchou. Ele sabia que era o dia de visitar Ricardo, mas ainda assim, me ver na sua casa era pedir de mais para nós dois.
-Vivian. -Ele pronunciou meu nome, e em cada sílaba o nojo era nítido. -Amor, por que você não sobe com o Rick? Preciso conversar com a Vivian.
-Vamos tomar banho, garotão? -Ela sorriu para Ricardo, ambos começaram a subir as escadas, mas o garoto voltou correndo e me abraçou.
Mesmo sendo um criança, sabia que eu iria embora e que demoraria para voltar. Engoli em seco e dei uma piscadela para meu filho.
-Te amo muito! Não se esqueça disso.
-Eu também te amo muito, não se esqueça disso. -Ele sorriu me imitando e saiu correndo para os braços de Eliza.
Por momentos que pareciam intermináveis desejei ser aquela que segurava meu filho nos braços sem se preocupar com a ideia de que amanhã não estaria por perto.
-Ele gosta muito que você venha até aqui. -Wesley sorriu, mas não era um sorriso amigável. -Mas eu acho muita cara de pau você vim aqui com três meses de pensão atrasados.
-Eu vou pagar, Wes! -Falei endurecendo o rosto e fechando os punhos.
-Ah, por favor, nem se preocupe com isso. Não vejo a hora de poder tirar totalmente seu direito de ver o Ricardo.
-Você não pode fazer isso!
-Sete anos e você ainda não me conhece. -Ele segurou meu pulso e me puxou mais para perto de si de uma forma ameaçadora.
-Me solta. -Falei com os o maxilar cerrado. O medo estava instalado na minha garganta, Wesley nunca havia levantado a mão para me agredir, mas eu sabia que não faltaram oportunidades. -Eu vou pagar.
-Eu duvido muito. -Ele fez a menção de cuspir em meu rosto, mas me soltei de seu aperto antes. Sai de lá e fechei a porta com todas as minhas forças.
Lágrimas escorriam pelo meu rosto. Ah! Se arrependimento matasse!
***
-Finalmente! -Vitória jogou meu avental e eu o peguei no ar. -Como está o Rick? -Ela sorriu para mim, mas não tive forças para retribuir seu sorriso. -Ei, mana! Que cara é essa?
-O Wesley me cobrou a pensão. -Respondi pegando o pano e passando no balcão.
-Mas que saco! Ele deveria cobrar era vergonha na cara aquele imprestável! Parece até que precisa do seu dinheiro!
-Ele disse que posso perder o direito de ver o Rick.
-Aí meu Deus! -Vitória me olhou assustada. -Vamos dar um jeito de pagar essa pensão! Eu tenho algum dinheiro guardado e...
-Vai ficar tudo bem. -Coloquei a mão no ombro da minha irmã. -Você não vai tocar nesse dinheiro, eu sei que você está guardando para pagar a faculdade lá na frente.
-Mas, Vivi...
-Nós vamos sair desse buraco, Tori!
-Ei, vocês duas aí! -Nosso tio Leônidas gritou da cozinha. -Parem de tagalerar e bora trampar!
-Bom dia, vim buscar as marmitas que eu havia feito o pedido. -Um rapaz alto, com os cabelos loiros se dirigiu a mim.
Vitória olhou para mim maliciosamente. Pegou as marmitas e colocou sobre o balcão, se inclinando um pouco para que se o rapaz quisesse, olhasse o seu decote.
Mas ele sequer pareceu notar, apenas entregou o dinheiro, pegou as marmitas e saiu do bar.
-Quem era? -Perguntei curiosa, a forma como ele havia ignorado completamente o charme da minha irmã era algo a se espantar, praticamente todos os rapazes faziam suas vontades.
Vitória revirou os olhos:
-Se mudou esses dias para cá, às vezes compra marmita para sua mãe. Não sei muita coisa, ele é um rapaz discreto, parece ser uma pessoa direita...
-Então sem chances de se interessar por Vitória.
Vitória riu sarcasticamente.
-Na verdade, era por você.
Revirei os olhos. Até parece que alguém com um rumo na vida ia querer estar com alguém tão perdida quanto. Abaixei pegando a garrafa de bebida e dei um gole enorme.
O álcool parecia água e eu precisava de algo mais forte que a realidade.
-Vivian! Tome! -Leonidas apareceu pela janela da cozinha colocando os pratos a serem servidos.
Peguei os pratos e comecei a circular entre as mesas até onde aguardavam o pedido.
-Ora, ora! Que delícia! -Maicon elogiou sorrindo para mim com segundas intenções.
-Esta falando da comida ou de quem está colocando o prato sobre a mesa? -O outro homem riu.
-É claro que é sobre a comida. -Senti uma mão descendo pelas minhas costas até onde não deveriam sequer encostar.
Eu deveria reclamar, mas aquilo era comum. Os homens me achavam bonita e desejável, e eu me sentia a pior das pessoas.
-Mas não posso deixar de dizer que Vivian é deliciosa também. -Ele umedeceu os lábios com a língua, se lembrando de quando eu aceitava sair em sua companhia. -Saudades de ter você, Vivi. -Sua mão deslizou sobre a minha coxa até a barra da saia. -Me diz, quando você vai ficar comigo de novo? -Eu não respondi, Maicon me encarava implorando por alguma atenção, enquanto o outro homem que eu não conhecia ria sem parar.
-A mocinha está se fazendo de difícil!
-É sério, Vivi. Fique comigo de novo! Eu daria todo o dinheiro do mundo pra ter você.
Terminei de por os pratos na mesa, mas não sai de imediato como era de se esperar. Olhei para Maicon e seu olhar não mentia.
Ele me pagaria para ficar comigo em uma noite.
O pensamento de usar meu corpo para aquilo me causou ainda mais repulsa, mas eu estava desesperada. Lembrei da voz de Wesley dizendo que eu nunca mais veria meu filho e eu sabia que iria me arrepender daquela atitude mais tarde. Minha vida já estava ruim, não poderia ficar pior, não é?
Me sentei no colo de Maicon e depositei um beijo em sua boca.
Se eu pudesse voltar no tempo e evitar tudo aquilo, eu o faria. Porque naquele momento eu queria muito mudar, ser qualquer outra pessoa no mundo, mas não parecia ter como.
Eu estava no fundo do poço, e não tinha nenhum caminho a vista.
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O CAMINHO
SpiritualA vida de Henrique virou de cabeça para baixo, quando sua mãe contraiu diversas dívidas para tentar tirar seu irmão, Heitor do mundo do crime e das drogas. Agora ele se depara em morar em uma comunidade do outro lado da Ponte do Silêncio em um barra...