Capítulo 56 - Henrique

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Henrique

Nós fomos retirados da sala enquanto tentavam reanimar o corpo de Renato. Eu havia ido para lá logo após que o pai dele havia me ligado desesperado. Os dois se abraçavam ao tentar se consolar e eu orava silenciosamente.
Sabia que as chances de Renato estar a salvo eram pequenas, eu não sabia como ele estava, se havia dado tempo, se ele havia pensado em Deus durante aqueles dias...
Foi quando meu celular começou a tocar e o nome de Helena brilhou na tela:
-Helena? Alô? Irmã, não é um bom momento para falar...
-Rick! Só me escuta! Aonde você está? -A voz dela era chorosa.
-Estou na hospital, por quê?
-É no hospital central?
-Sim, por quê?
-Estou indo para aí agora, mamãe acabou de passar mal no trabalho, foi de ambulância para aí!
-Mal? Como assim? -Perguntei preocupado.
-Eu não sei, Rick! -No fundo da ligação dava para escutar os barulhos da rua e perceber que a minha irmã corria. -Em dez minutos eu estou aí. -E desligou.
Olhei para os pais de Renato e expliquei a situação. Ambos concordaram e me aconselharam a ir até ao balcão de informações para ver se minha mãe já havia dado entrada no hospital.
***
Helena chegou junto com o médico. Minha mãe havia dado entrada as pressas no hospital e havia sido internada, ainda não havíamos conseguido vê-la, e não tinha muitas notícias.
-Os senhores são o que da paciente?
-Somos filhos. -Respondi, minha irmã entrelaçou seu braço no meu. Suas mãos estavam geladas e seus olhos azuis estavam arregalados.
-Ela mora com vocês?
-Apenas comigo.
-Como estava a saúde dela nesses últimos meses? Fizeram algum exame? Ela reclamou de algo? Chegaram a ir em algum hospital?
Olhei para minha irmã, e me lembrei de todas às vezes que minha mãe havia reclamado. Lembrei de quando a minha irmã havia me aconselhado a levar nossa mãe ao médico.
Eu havia sido tão irresponsável! Como eu pude deixar as coisas chegarem naquele ponto?
Como eu não respondi, minha irmã deu seguimento respondendo as perguntas que o médico fazia. O estado da minha mãe era grave, seus pulmões estavam fracos e eles estavam a medicando, mas que alguns danos poderiam ser irreversíveis.
Ficamos um bom tempo lá, as horas se arrastavam, o ponteiro parecia estar brincando conosco. Já era tarde quase noite quando finalmente foi permitido a nossa entrada no quarto onde minha mãe estava.
Ela estava com os olhos semiabertos. Minha irmã se aproximou dela, o médico disse que haviam feito de tudo, mas apenas por um milagre minha mãe sairia daquela situação.
Me aproximei também, e segurei sua mão. Estava gelada e meus olhos se encheram de água, mas não chorei. Esbocei um sorriso fraco:
-Oi, mamãe!
Helena não conseguia falar. As lágrimas deslizavam sobre suas bochechas.
-Oi, meus amores. -Sua voz era fraca e abafada pelo inalador. -Como é bom ver vocês... Queria tanto que o Heitor estivesse aqui também, mas... -Ela parou um pouco para recuperar o fôlego. Cada palavra era como se ela tivesse andado por uma hora sem parar. -Por favor, falem para ele que eu o amo demais.
-Mãe, não será necessário, a senhora mesmo vai falar isso para ele! -Tentei anima-la. -A senhora vai sair dessa.
-Por favor, meus queridos. -Ela começou a tossir. -Nós sabemos que não.
-Henrique! -Helena gritou. -Por que você não ora? Não faz alguma coisa? Pede para o seu Deus! Ele não pode fazer tudo? -Ela estava desesperada.
-Helena, as coisas não são bem assim.
-Como não? -Ela se levantou. -Por que toda vez que eu preciso de Deus, Ele nunca me ajuda? -Ela chorava e foi impossível eu não chorar. Me levantei para abraçar a minha irmã, mas Helena recusou meu consolo e saiu do quarto me sentei ao lado da minha mãe e passei as mãos pelos cabelos.
-Rick, cuide dos seus irmãos. Não desista deles, Helena é só uma menina cheia de traumas e o Heitor precisa saber que ainda tem uma família. Estar na cadeia é muito difícil. -Ela pareceu sorrir. -Eu não te contei, mas esses dias eu estava indo para a igreja. -Olhei para ela confuso. -Eu ia a tarde, na igreja lá de São Vicente, a que nós íamos. Eu ia te contar, mas eu quase não te via. Filho, eu tô em paz. Se for para eu morrer, irei para os braços de Deus.
Chorei, e como chorei. Tentei sussurrar um pedido de desculpas por não ter me atentado a tudo aquilo, mas não consegui. Chorei como se tivesse sete anos. Inclinei minha cabeça e apoiei em seu peito. Com dificuldade ela ainda acariciou os meus cabelos como fazia quando eu era pequeno para afastar tudo de ruim.
Minha mãe era uma mulher incrível, havia dado a vida por nós três e nenhum de nós havia reconhecido isso.
-Eu te amo, mãe. Não vou desistir da nossa família.
Meu celular começou a vibrar e eu atendi.
-Alô?
-Obreiro? É o Saulo.
-Opa, Saulo. Tudo bem?
-É, mais ou menos. Espero não estar incomodando o senhor.
-Não está.
-Então, eles disseram que eu poderia ligar para alguém, e eu achei melhor não ligar para a minha mãe.
-Eles quem?
-Obreiro, eu estou na cadeia.
Prendi a respiração:
-Como assim?
-Eu fui um tonto, obreiro. Fui na ideia do meu primo, e deu tudo errado! Eu não sei o que fazer...
-Fica calmo, logo, logo, estarei aí.
-Obrigado, obreiro. De verdade.
Desliguei o telefone e olhei para a minha mãe.
-Mãe... Eu preciso...
-Está tudo bem, meu filho. Eu tenho tanto orgulho de você!
-Mas eu não queria te deixar sozinha...
-Eu não estou sozinha, Ele está comigo! Mas esse jovem, precisa da sua ajuda, ele está sozinho.
Concordei. Beijei sua mão.
-A benção, mãe.
-Que Deus te abençoe.
Me levantei e dei uma última olhada para a minha mãe, eu ainda chorava, eu sabia que aquela era a última vez que eu a via com vida. Eu poderia ficar ali, tinha todos os motivos para ficar, mas eu fechei os olhos e limpei as lágrimas.
-Aonde você vai? -A voz de Helena chegou até mim no corredor.
-Lena, preciso que fique com a mamãe.
-Rick, aonde você vai?
-Tem um jovem, ele foi preso e precisa da minha ajuda... -Helena segurou meu braço fortemente e arregalou os olhos.
-HENRIQUE! Nossa mãe está morrendo! Como pode cogitar com a ideia de sair daqui?
-Eu preciso ir, Helena.
-Henrique... Por favor! Peça para outro obreiro, eu não sei... Mas por favor, fique aqui.
Confesso que nesse momento eu amoleci. Meu coração doeu, não somente pela minha mãe, mas principalmente pela minha irmã. Aquela mulher poderosa que todos os homens admiravam, eu conseguia enxergar. Seus olhos mostravam o quanto ela era vazia, solitária e triste. Abracei minha irmã e beijei o topo da sua cabeça.
-Eu te amo, Lena. A gente vai ficar bem, fique aqui, eu já vou voltar. Seja forte pela mamãe, tá bem?
Ela não me respondeu, suas unhas estavam fincadas na minha blusa impedindo que eu me soltasse. Com cuidado, soltei um dedo de cada vez. Me virei e fui até a delegacia aonde Saulo estava.

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