Capítulo 87 - Saulo

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Saulo

Eu estava com as mãos na grade apoiando a testa e observando os rapazes jogarem bola.
Era uma tarde de domingo e o obreiro havia levado todos os jovens para a quadra para passarmos uma tarde juntos fazendo algo diferente.
-Lembra quando eu te conheci? Você estava jogando nessa quadra. -O obreiro Henrique se aproximou de mim e se apoiou na grade também.
-Parece que faz tanto tempo, se eu soubesse o tanto que ia bater a cabeça ainda, eu deveria não ter só aceitado o convite do senhor, eu deveria ter aceitado muito antes o convite do Senhor Jesus de entregar a minha vida. Se eu tivesse feito isso, não teria sido preso.
-O importante não é o que passou, Saulo. O importante é agora. -O obreiro pegou o celular e abriu a Bíblia online. -Como sou ruim de memória, escuta esse versículo:
13 Irmãos, quanto a mim, não julgo que o haja alcançado; mas uma coisa faço, e é que, esquecendo-me das coisas que atrás ficam, e avançando para as que estão diante de mim, 14 Prossigo para o alvo, pelo prêmio da soberana vocação de Deus em Cristo Jesus Filipenses 3:13-14
-Se Paulo ficasse pensando nas coisas ruins que já havia feito, ele nunca ia conseguir fazer as coisas que precisavam ser feitas naquele momento e que eram boas. Muitas pessoas ficam presas ao seu passado porque não conseguem enxergar o seu futuro. Outras se acomodam, achando que já conseguiram fazer tudo, e na verdade é uma luta diária. Você e eu temos um objetivo, ser salvos, então não podemos andar para trás. Precisamos seguir em frente.
Concordei.
-E falando em seguir em frente, eu preciso da sua ajuda.
-Pode falar.
-Eu sei que você gosta de jogar futebol, gosta dessas coisas de esporte.
-Dessas coisas de esporte... -Repeti rindo.
-Isso, que tem que se mexer muito. Eu tento, mas eu vejo que esse não é o meu forte... Queria que você me ajudasse, a organizar os jogos, times, para que a gente pudesse chamar mais jovens e fazer algo bacana com eles.
-Com toda certeza!
-E aí, obreiro! O senhor não vai vim jogar, não? -Vitor o chamou sorrindo.
O obreiro fechou os olhos.
-Conta aí cinco minutos, quando der você faz um sinal e aí eu caio como se alguém tivesse me chutado para eu poder ser substituído, ficar sentadinho ali nos bancos e depois falar que damos o nosso sangue pelo time!
-Ninguem é louco de chutar o senhor, obreiro. -Falei rindo.
-Droga, ensinei certinho vocês.
Ele sorriu e correu para o campo.
-Você não vai jogar? -Laura se aproximou de mim timidamente com a câmera em suas mãos.
Estava com um chapéu para proteger o rosto pálido do sol que combinava com o restante das suas roupas e por mais que eu soubesse que Laura era filha de um homem cheio de dinheiro, sua simplicidade fazia a gente não notar isso.
Existiam tantas pessoas que ostentavam, e isso era só um detalhe na vida daquela menina.
-Hoje não, hoje só tô observando. Jogador caro que fala, né? -Comecei a rir.
Ela riu discretamente.
-E eu posso gravar um vídeo desse jogador sobre sua experiência aqui hoje?
-Desculpa, hoje não posso dar entrevista. -Brinquei, mas logo fiquei sério. -Desculpa, Laurinha, como estou cumprindo em liberdade ainda, acredito que não posso ter a minha imagem divulgada.
-Entendi, sem problemas. Eu vou apagar a foto que tirei de você, sério, desculpa, eu nem pensei nisso... -Ela começou a falar rápido demais.
-Tudo bem, calma. -Segurei uma de suas mãos, mas logo afastei sem graça. -Desculpa, eu só queria ver a foto.
Ela virou a câmera e me entregou, era uma foto simples em que eu estava sorrindo.
-É tão bonito, né?
-Sim. -Ela falou baixinho.
-Ver o quanto Jesus nos muda.
-Sim, isso também.
Olhei para ela e Laura se engasgou.
-Esta tudo bem? -Me aproximei e ela também deu um passo a frente e acabamos batendo a cabeça um no outro, fazendo derrubar o seu chapéu.
-Ai! -Falamos ao mesmo tempo. -Desculpa!
Laura pegou a câmera de volta enquanto massageava a testa, ao contrário de mim, em sua pele pálida dava pra ver a marca da batida.
-Desculpa, Saulo. Eu sou uma desastrada mesmo.
-Fica em paz. -Me abaixei e peguei seu chapéu e ajudei a colocar em sua cabeça.
Ela levantou o rosto e me encarou e eu não pude evitar de começar a rir com o seu sorriso.
Tentei desviar o olhar, era como se Laura fosse o sol, e como se fosse sol, mesmo que eu não estivesse olhando diretamente, eu conseguia enxerga-la.
Laura não era o tipo de menina do mundo, ela não tinha nada a ver com as demais. Era tímida, falava baixo e discreta.
Ela acenou para mim e saiu andando.
Voltei com a testa na grade.
A menina tinha tudo que quisesse a hora que quisesse, o pai dela me mataria antes mesmo de eu conseguir dizer meu nome completo.
Respirei fundo a tempo de ver o obreiro Henrique tomando um rola, sozinho porque tinha tropeçado no próprio pé.
E daquela vez, realmente não parecia que ele tinha forçado, e sim que ele não levava jeito mesmo com coisas que eram de se mexer muito.

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