Capítulo 83 - Vitória

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Vitória

Havíamos acabado o nosso domingo e nos reunimos em uma lanchonete próximo da igreja, cada um contribuiu com que tinha para podermos todos comer e poder conversar.
Ríamos e era um momento que eu não trocaria por nada, tudo que eu já tinha, nada valia o preço do que eu estava tendo naquele momento.
Os jovens se sentaram.
-Nao se esqueçam de guardar um lugar para mim! -Renato sorriu. Ele havia anotado o pedido da maioria e por acaso haviam deixado um lugar vago ao meu lado.
Ele trouxe alguns pedidos, e colocou o copo de açaí na minha frente.
-Aqui está o seu, açaí sem kiwi e manga, com muito leite em pó e amendoim com jujuba.
Franzi as sobrancelhas:
-Acertou de cara...
-Viu só como eu presto atenção no que você fala? Eu disse que eu ia mudar! -Ele brincou e se sentou ao meu lado.
Olhei para Laura que estava ao meu lado e me levantei:
-Deixa eu trocar de lugar com você.
Laura concordou sem questionar, mas Renato segurou meu braço.
-Ei, por que você tá trocando de lugar? -Ele sussurrou.
-Porque você não gosta de sentar do meu lado, sempre troca, ué?
-Fica aí, somos líder e auxiliar, estou me esforçando para ser seu amigo, da um desconto! -Ele me cutucou com o cotovelo.
Meu Deus, o que estava acontecendo? Senti o estômago revirar.
Continuamos conversando, e em tudo Renato solicitava a minha opinião. E sim, era nítido que ele estava se esforçando para mudar, e de alguma forma não fiquei incomodada com aquilo, ele estava tentando ser o que era com todo mundo, e eu pude ver pela primeira vez, como ele era educado, gentil e inteligente.
Renato apoiou o braço sobre a mesa e eu observei a tatuagem toda torta em seu pulso.
-O que significava essa tatuagem aí? -Perguntei.
Renato respirou fundo:
-Uma das besteiras que fiz com a minha vida. Eu estava muito bêbado, meu amigo que fez.
-Não sabia que tinha amigos que eram tatuadores.
-No caso, ele não era. Fiz isso no cemitério com agulha e tinta, não sei como não peguei uma infecção.
-Meu Deus...
-Vitoria, fiz tanta coisa ruim, eu só estou vivo porque Deus permitiu, certeza que era para eu estar no inferno agora. -Ele fechou os olhos com uma expressão de dor.
-Mas agora você está aqui. -Num impulso coloquei minha mão sobre seu pulso. -Aproveite cada minuto para poder ter um fim diferente.
-Sim, um fim de ser salvo e de ajudar outras pessoas a serem salvas também. -Ele abriu os olhos e sorriu olhando para mim.
Recuei e desviei o olhar para as minhas mãos. Eu estava tão sem graça.
Terminamos de comer e eu me levantei:
-Melhor eu ir indo, essa hora Vivian já deve estar preocupada e ainda não é bom eu ficar andando sozinha por aí.
-Pode deixar que eu te acompanho. -Renato se dispôs.
-Nao precisa, você mora do outro lado da ponte... Posso ir com o Vitor.
-O Vitor vai ir visitar a Pamela para convidar ela para domingo de manhã, não é, Vitor? -Ele olhou para o amigo que estava mais interessado em seu sorvete.
-E é? -Ele olhou confuso.
-É!
-É... -Ele deu de ombros.
Sem meios para contestar, Renato me acompanhou até em casa.
-Sabe, eu acho que se não fosse por termos encontrado o Senhor Jesus, eu nunca seria seu amigo. -Ele confessou sendo sincero. -Eu nunca tive problema com as pessoas, mas meu grupo social era bem restrito, acho que você nunca conseguiria se encaixar.
Soltei uma risada baixa:
-Renato, você que pensa que não. Para eu poder ser aceita em algum lugar, eu sempre fazia o que fosse necessário, me vestia como o padrão mandava, falava como era necessário, tinha comportamentos iguais, tudo para ter a aprovação dos outros. Nunca tive uma identidade, eu era o que as pessoas queriam que eu fosse.
-Mas... Quando te conheci você era muito diferente das garotas que eu estava acostumado a lidar.
-Mas, se eu quisesse eu poderia muito bem ser como qualquer uma das suas namoradas. -Quando falei, novamente fiquei quieta, que frase mal colocada. -Quer dizer, não que eu tivesse a intenção de ser a sua namorada. -Engoli em seco e ele arqueou uma das sobrancelhas. -Não que também você não fosse alguém que eu tentaria ser, quer dizer... Aí meu Deus, eu não sei mais o que eu queria dizer. -Levei as mãos ao rosto, morta de vergonha.
-Esta tudo bem. -Ele riu envergonhado também. -Bem, está entregue!
Ele falou e olhei para a minha casa, por um momento fiquei aliviada por não passar mais vergonha, mas fiquei triste por ter que me despedir de Renato.
-Obrigada por ter me acompanhado até em casa. -Agradeci. -E estou gostando de poder ser sua amiga.
-Obrigado por me desculpar por ser um completo idiota no começo, melhor eu ir indo, fica com Deus.
-Va com Ele. -Fiquei na porta esperando até que Renato desse a última olhada para trás e eu não conseguisse mais vê-lo.
Ah, meu Deus! Era só o que faltava! Eu estava gostando de Renato!
Balancei a cabeça e entrei em casa. Fui direto para o quarto e fechei os olhos abraçando a Bíblia.
-Meu Deus, eu não quero me decepcionar, já fiz tanta coisa errada na minha vida sentimental, preciso focar no importante agora!
Que era servir a Deus, e no momento certo, as coisas iriam se encaixar.
E eu já sabia por onde deveria começar, no dia seguinte fui até o obreiro Henrique e implorei para que ele me colocasse novamente no Cultura.
-Olha, eu não sei, Vitória. Você pisou na bola muito feio da última vez.
-Eu sei disso, mas quero uma chance para mostrar que eu mudei.
-Nao sei, não.
-Por favor, obreiro! É algo que eu gosto de fazer e quero poder ajudar!
O obreiro me encarou, tirou seus óculos e me analisou, seus olhos estavam escuros e seu maxilar sério.
-Vou te dar uma última oportunidade. Você não está só fazendo algo que goste, está fazendo algo para que seja uma forma de atrair jovens novos para o Senhor Jesus, e não para si!
-Eu entendo, agora entendo o que Deus realmente quer que eu faça!
-Vai poder ajudar, mas por enquanto não pode apresentar, vai ficar apenas auxiliando nas danças.
-Sim, senhor! -Meu peito se encheu de felicidade. -Farei o meu melhor para multiplicar o talento que Deus me deu.

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