Saulo
Depois do que havia acontecido entre mim e Vitória, eu me sentia fraco e desanimado. Eu sabia que havia feito o certo ao contar para o obreiro Henrique o que havia acontecido, e mesmo ele né orientando a pedir perdão para Deus, eu não sentia que tinha sido perdoado.
Toda vez que eu começava a orar, aquilo voltava a minha mente, eu implorava pelo perdão de Deus, mas era como se a minha oração batesse no teto e voltasse vazia para mim.
Vinha sempre o pensamento de que eu havia escolhido aquilo, mesmo sabendo que desagradava a Deus, quem me garantiria que eu não faria aquilo novamente?
Como eu ia mudar?
Então comecei a ir para a igreja arrastado, eu ia porque sabia que se já tava difícil com Deus, imagina sem Ele! Eu precisava continuar, mas eu sentia vergonha, não conseguia nem falar com o obreiro Henrique direito, eu sentia medo de ficar perto de Vitória ou de qualquer outra menina.
Eu me sentia o pior dos pecadores.
E para piorar a sensação de derrota, as coisas dentro de casa começaram a piorar. Eu passava até três dias sem ter o que comer, minha mãe se virava da melhor forma possível, quando tinha um pão era uma vitória, mesmo ele sendo seco e duro, o resto que sobrava na padaria.
Até que chegou uma quarta-feira, eu estava com muita fome e minha mãe sequer havia chegado, deu o horário de ir assistir a reunião, mas acabei não indo, além do meu físico, eu estava cansado por conta da culpa que eu estava carregando, eu não tinha forças para falar com Deus.
Naquele dia eu deveria ter ido, mas aquela escolha acabou mudando muita coisa. Eu estava deitado no sofá de casa encarando o teto quando escutei várias batidas na porta, me levantei e quando abri vi Yago sorridente para mim.
-E aí, meu querido! -Ele me abraçou. -Como tu tá, irmão?
Dei de ombros sem vontade de responder, Yago apenas entrou e se sentou no sofá.
-Tu quer uma água? -Ofereci. -Só tenho isso mesmo pra te oferecer.
-Deixa essa água aí, o que eu tenho pra te oferecer vai te ajudar bem mais. Vem, senta aqui do meu ladinho! -Ele apontou para o lugar ao seu lado e eu me sentei receoso, ouvindo ele falar o que eu já esperava.
Ele e seus amigos estavam planejando um roubo grande e precisavam de pessoas de confiança, no caso, eu era uma dessas opções.
Olhei para Yago e comecei a negar bom a cabeça:
-Não, cara. Tu sabe que eu não quero mais fazer isso, eu tô indo para a igreja, quero fazer as coisas certas.
-É, sei que tu tá indo pra igreja, mas me diz aí, do que tá adiantando? -Eu abri a boca para responder, mas eu não tinha o que responder. Parecia que após ter aceitado Jesus, as coisas pareciam ter piorado. -É, acho que nada. -Ele respondeu por mim.
-Não, cara. Tem sido bom... Só tá meio difícil as coisas.
-Eu sei, por isso tô fazendo essa proposta pra ti, apenas para melhorar as coisas, depois tu para!
Eu não sabia mais o que falar, eu precisava de ajuda. Concordei com a cabeça, no fundo eu já queria aceitar aquela proposta, seria algo simples e só uma vez, quando tudo se ajeitasse, eu pararia.
Durante alguns dias, eles ajeitaram tudo para que o assalto ocorresse tudo bem. Era em uma lotérica, no final do expediente, antes que o carro forte passasse, nós iríamos lá e limpariamos tudo.
Mas antes do grande assalto, todos os dias, Yago me obrigou a fazer pequenos furtos e andar com ele para cima e para baixo, dizia ele que era para que eu aprendesse como deveríamos agir e pegar a prática. De tanto que começamos a andar juntos, Yago até aceitou ir a igreja comigo, gostou, mas afirmou que aquele ambiente não era para ele, e aos poucos eu começava a achar que não era para mim.
Finalmente chegou o dia, eu estava tão nervoso que Yago com os outros rapazes concordou que eu deveria ficar no carro, mas eu não aceitei, eu tinha que mostrar para eles que eu estava pronto.
Pior escolha que eu fiz.
Nós rendemos os funcionários e ainda alguns clientes que estavam ali, eu estava com uma arma em uma das minhas mãos e na outra uma mochila para colocar o dinheiro.
A viatura da polícia estava fazendo uma ronda naquele momento e percebeu a movimentação estranha vinda da lotérica, tinha uma porta dos fundos, mas para isso precisaríamos pular o muro. Fui o último a sair do estabelecimento, mas quando cheguei perto do lugar era muito alto, quando peguei impulso para pular, acabei torcendo o pé e cai.
-Yagoooo! -Gritei, meu primo olhou para mim assustado.
-O que foi menor?
-Acho que quebrei o tornozelo. -Minha cara era de dor.
-Tu consegue andar?
Tentei ficar de pé, mas a dor era alucinante.
-Ali estão eles! -Os policiais apareceram na rua abaixo da que estávamos.
-Desculpa, aí menor. -Yago pegou a mochila que eu estava carregando, entrou no carro e me deixou ali.
Gritei mais algumas vezes e comecei a xingar, mas nada adiantou. Os policiais apareceram e me levaram detido.
Por eu estar armado e ter sido pego em flagrante, minha pena seria de quatro até dez anos.
Enquanto eles faziam o interrogatório, suspirei sentindo uma tristeza enorme em meu peito.
Olhei para a janela e vi o céu se estendendo infinitamente.
Será que eu ainda tinha jeito? Será que era possível Deus me perdoar ainda?
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O CAMINHO
SpiritualA vida de Henrique virou de cabeça para baixo, quando sua mãe contraiu diversas dívidas para tentar tirar seu irmão, Heitor do mundo do crime e das drogas. Agora ele se depara em morar em uma comunidade do outro lado da Ponte do Silêncio em um barra...