Capítulo 6 - Henrique

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Henrique

Me levantei antes da minha mãe, preparei seu café e passei meu uniforme de obreiro. Eu havia conseguido um emprego temporário e eu só ia trabalhar quando a empresa me chamava e naquela quarta-feira eles não precisavam de mim.

Eu precisava de um emprego fixo o quanto antes, mas enquanto as coisas estavam complicadas eu só poderia fazer o que estava em meu alcance naquele momento.

Deixei um bilhete para minha mãe avisando que passaria o dia inteiro na igreja e sai de casa.

Chegando a porta da igreja franzi as sobrancelhas ao ver o pastor Samuel com roupas normais e tentando levantar a porta de aço que estava toda amassada. Olhei para as paredes manchadas de tinta e a palavra "HIPÓCRITAS" estava escrita de uma forma grotesca e enorme.

-Pastor? -O chamei. -O que houve?

-Ah, oi! Henrique! -O pastor Samuel abriu um sorriso e se levantou limpando as mãos na calça. -Durante a noite alguns rapazes vieram e pintaram a nossa igreja... E chutaram ou sei lá, só sei que está difícil abrir. -Ele olhou para o seu relógio de pulso. -Logo os membros vão começar a chegar, e essa parede... Meu Deus, em seis anos de obra como pastor e obreiro, acho que esses meses aqui estão sendo os mais difíceis. -Ele declarou pensativo.

Coloquei minha bolsa que estava com o meu uniforme encostada na parede e fui para o seu lado me agachando, nós dois começamos a empurrar a porta de aço com força para cima e finalmente conseguimos abrir.

-Ufa! Conseguimos abrir! -O pastor sorriu.

-Mas duvido que vamos conseguir fechar. -Lamentei.

-Bom dia, pastor! -Uma senhora o cumprimentou.

-Bom dia, dona Matilde. Pode ir entrando que a reunião logo vai começar!

A senhora sorriu e entrou no salão:

-Eu precisava começar a pintar essa parede, antes que os membros cheguem e fiquem vendo o que fizeram com a igreja...

-Deixa que eu pinto, pastor. -Me prontifiquei.

-Mas Henrique...

-O senhor vai se arrumar, precisa fazer a reunião, eu estou aqui pra ajudar o senhor! -Falei dobrando as mangas da minha camisa.

-Você já pintou algum lugar?

-Ééé... -Coloquei a mão na nuca e sorri. -Deus capacita os escolhidos, né?

Ele concordou sorrindo e confiando em minhas mãos.

***

Quando finalmente terminei de pintar a parede já passava do meio dia. O sol era forte e eu sentia meus braços arderem.

Observei a parede pintada por mim, pelo menos para uma primeira vez estava algo legal.

Entrei no salão e sorri para o pastor que terminava de conversar com um senhor.

-Terminei, pastor!

-Muito obrigado, Henrique! Você não sabe como tem me ajudado, tenho plena certeza que foi Deus que o colocou aqui nessa igreja.

Pela primeira vez, durante aquelas semanas senti felicidade por estar naquele bairro. Talvez Deus quisesse me mostrar alguma coisa que eu não conseguiria ver na minha antiga condição.

-E agora preciso conversar sério com você. -O pastor se sentou na ponta do Altar e pediu para que eu me aproximasse dele. -Eu imagino que você mesmo que não tenha andado muito por aqui, viu o quanto de jovens tem nesse bairro?

-Sim, senhor! Até estranhei que ainda não temos um grupo de jovens em nossa igreja, lá na Catedral arrebentava... Tanto que fui levantado a obreiro pelo grupo dos jovens.

-Você é obreiro a quanto tempo?

-Dois anos e meio.

-Hum, pois bem, não temos um grupo de jovens ainda porque não tinhamos um ovreiro para estar a frente desse trabalho, que desse a vida por esses jovens... -O pastor olhou bem dentro dos meus olhos. -Você tem fé pra assumir esse trabalho aqui?

Olhei para ele estático. Nunca havia me imaginado como líder de um grupo, ainda mais do grupo de jovens, onde era o futuro da igreja. Eu me sentia ainda como uma criança na Obra de Deus, todo dia aprendia algo novo, quem era eu para cuidar de várias pessoas?

-Eu... -Fiquei em silêncio por alguns instantes, pensando em toda a minha vida até aquele momento. Como tudo havia mudado, minhas condições, minha família... Deus precisava de mim ali, então eu daria tudo de mim. -Seria uma honra, pastor. -Falei engolindo todo o meu medo. -Deus pode contar comigo!

O pastor apertou minha mão e eu sabia que teria um grande trabalho pela frente.

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