Capítulo 38 - Laura

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Laura

Então Pedro, aproximando-se dele, disse: Senhor, até quantas vezes pecará meu irmão contra mim, e eu lhe perdoarei? Até sete?

Jesus lhe disse: Não te digo que até sete; mas, até setenta vezes sete.

Por isso o reino dos céus pode comparar-se a um certo rei que quis fazer contas com os seus servos;

E, começando a fazer contas, foi-lhe apresentado um que lhe devia dez mil talentos;

E, não tendo ele com que pagar, o seu senhor mandou que ele, e sua mulher e seus filhos fossem vendidos, com tudo quanto tinha, para que a dívida se lhe pagasse.

Então aquele servo, prostrando-se, o reverenciava, dizendo: Senhor, sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.

Então o Senhor daquele servo, movido de íntima compaixão, soltou-o e perdoou-lhe a dívida.

Saindo, porém, aquele servo, encontrou um dos seus conservos, que lhe devia cem dinheiros, e, lançando mão dele, sufocava-o, dizendo: Paga-me o que me deves.

Então o seu companheiro, prostrando-se a seus pés, rogava-lhe, dizendo: Sê generoso para comigo, e tudo te pagarei.

Ele, porém, não quis, antes foi encerrá-lo na prisão, até que pagasse a dívida.

Vendo, pois, os seus conservos o que acontecia, contristaram-se muito, e foram declarar ao seu senhor tudo o que se passara.

Então o seu senhor, chamando-o à sua presença, disse-lhe: Servo malvado, perdoei-te toda aquela dívida, porque me suplicaste.

Não devias tu, igualmente, ter compaixão do teu companheiro, como eu também tive misericórdia de ti?

E, indignado, o seu senhor o entregou aos atormentadores, até que pagasse tudo o que lhe devia.

Assim vos fará, também, meu Pai celestial, se do coração não perdoardes, cada um a seu irmão, as suas ofensas.

Mateus 18:21-35

Respirei fundo e fechei a pequena Bíblia que o obreiro havia me presenteado. Deslizei os dedos sobre a capa mal feita que eu havia feito para que a Bíblia se parecesse com um livro comum de estudo igual os que eu tinha, para que não chamasse atenção dos meus pais. Certamente, eles não iriam gostar nem um pouco de descobrir o que eu andava lendo.

Fiquei pensando no que havia acabado de ler, eu queria tanto que Deus me perdoasse, que me aceitasse, porque eu mesma não tinha conhecido nada e ninguém que me conhecesse de fato e de verdade e mesmo assim me aceitasse daquela forma, mas como Ele iria me aceitar se eu não perdoava quem tanto havia me feito mal?

Senti meus olhos lacrimejarem, doía tanto! Como eu poderia perdoar, sendo que eu tinha razão? Eu tinha todos os motivos cabíveis para não perdoar...

E era aí que estava, Deus também tinha todos os motivos cabíveis para não me perdoar também, Ele tão perfeito, sem nenhum pecado ou defeito, não tinha nenhuma obrigação de me perdoar, eu que já havia nascido em meio ao pecado...

Mas se Ele conseguia me perdoar, então eu também conseguiria perdoar.

Coloquei a Bíblia em cima da mesinha, e fui até a janela do meu quarto. Olhei para o céu cheio de estrelas:

-Senhor, eu não consigo, mas eu quero tanto perdoa-lo, por favor, me ensine, o Senhor é o Único capaz de fazer isso, nosso entendimento e capacidade humanidade não conseguem fazer isso, apenas o tão grande amor e infinita misericórdia podem fazer, por favor... -Solucei. -Me ajuda.

-Laura? -Meu pai entrou no meu quarto e rapidamente sequei as lagrimas. -Vim aqui te dar boa noite e ver o que você estava fazendo.

-Eu estava me preparando para dormir, e estava lendo, pai. -Me virei para olha-lo e senti meu coração batendo mais acelerado quando meu pai se aproximou da minha escrivaninha e começou a folhear a Bíblia encapada.

-O que é isso? -Meu pai pegou a Bíblia nas mãos e continuou folheando, certificando-se de que realmente era o que ele estava pensando. -Onde você conseguiu isso?

-Pai... -Falei calmamente, não queria que ele ficasse alterado. -Eu ganhei do rapaz da igreja.

-Está me dizendo que continuou indo naquela igreja que eu e sua mãe dizemos para não ir? -Sua voz começou a se elevar.

-O que está acontecendo aqui? -Minha mãe apareceu na porta do meu quarto ao ouvir a voz alterada do meu pai.

-Aika! Você não sabe onde a nossa filha está indo! -Ele gritou, já estava vermelho. -Ela está indo naquela igreja! E eu aqui achando que a minha filha estava saindo com amigos para estudar!

-Isso é verdade, Laura? -Ela me olhou receosa.

-Sim, mas mãe, eu posso explicar. Eu sei que vocês não gostam dessa igreja, mas...

-Não gostamos? -Meu pai me cortou. -Laura, minha filha, você sabe que essas igrejas só querem tirar o nosso dinheiro, fazer uma lavagem cerebral e te tornar mais um robô deles!

-... Ela tem me ajudado.

Ambos ficaram em silêncio e me olharam.

-Como assim, te ajudado? -Minha mãe perguntou.

-Eu estou melhor, mãe. -Eu precisava convence-los, mostrar que por mais que não fosse uma melhora enorme, eu estava progredindo. Afinal, para quem desejava morrer até então, não ter mais aqueles pensamentos dentro de si já era uma grande vitória. -Eu... -Pensei em falar aquilo, mas ainda não tinha coragem de admitir para os meus pais.

-Te ajudado? -Meu pai passou as mãos pelo rosto. -Laura, o que te ajuda é a ciência, são os remédios! Eu sou médico, estudei por tantos anos para ouvir a minha própria filha dizer que está melhorando porque tem ido em uma igreja? Chega! Já ouvi demais por uma noite! -Ele se virou para ir embora segurando a minha Bíblia em suas mãos.

-Pai... A minha Bíblia, por favor. -Pedi, mas ele me olhou com ainda mais desprezo e saiu sem me dar o pequeno livro.

Sentei na cama e por mais que eu quisesse chorar, apenas respirei fundo e fechei os olhos. Senti a cama afundando ao meu lado e minha mãe pegando em minhas mãos. Abri os olhos e a encarei.

-Isso tem te ajudado mesmo, minha querida?

-Mãe, você não faz ideia... Eu sinto como se finalmente tivesse encontrado um Caminho no meio dessa escuridão para sair de tudo isso.

-Tudo bem, eu vou te ajudar. -Ela concordou. -Quero que você continue indo a essa igreja.

-Mas mãe, achei que você odiasse a igreja...

-Qualquer coisa que te faça ficar melhor, me faz ficar melhor também, meu amor.

Minha mãe me abraçou e eu me senti aliviada, por mais que ainda não tivesse a aprovação do meu pai, saber que tinha uma pessoa lutando junto comigo me dava mais forças. Era difícil caminhar sozinha.

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