John Watson dirigia com menos zelo do que o habitual enquanto voltava com Sherlock Holmes para a Rua Baker em seu carro. O teatro feito pelo casal De Santi ainda lhe causava náuseas deixando evidente que o único sentimento que nutriam pela filha era o de posse. Isso esclarecia por que não havia sido problema para os pais vendê-la. Eles viam a filha como um investimento.
— John, se a gente não chegar vivo, Audrey nunca vai saber o que descobrimos — falou Sherlock em um tom de voz calmo enquanto o amigo fazia mais uma ultrapassagem em alta velocidade. — A raiva está te dominando e nós dois sabemos como isso termina — acrescentou ele.
— Sherlock, você não entende...
— Claro que eu entendo, John! — declarou ele sério. — E estou igualmente pasmo com a forma como eles dissimuladamente fizeram o papel de pais incrivelmente arrasados com a perda da filha. Além de constatar o quanto a vigiaram a vida inteira.
— Medo de dormir sozinha... — John ainda não digerira a informação. — Tenho certeza que a avó ficava ali para vigiar ela.
— E não era a única vigilante naquele quarto. — O detetive balançou a cabeça. — O urso panda de pelúcia na estante tinha uma câmera por trás dos olhos. Infelizmente, pelo que chequei através de uma abertura na costura do brinquedo, só restaram as lentes. Os dois devem ter retirado o dispositivo de dentro dele antes que alguém tivesse a chance de verificar. E certamente estariam prontos para negar sua existência.
— Como fizeram ao declarar que não havia câmeras nos quartos e banheiros — John havia diminuído um pouco a velocidade com que conduzia o veículo.
— Exatamente — declarou Sherlock. — Qualquer desvio de comportamento por parte da Audrey seria perfeitamente compreensível com essa vigilância toda. É como se ela tivesse sido condenada à prisão perpétua em um presídio de segurança máxima sem ter cometido crime algum.
— É um preço bem alto só por ter um teto sobre a cabeça e comida na mesa — avaliou John. — Nós vamos contar tudo isso para ela? — perguntou ele lambendo os lábios.
— Por hora não. Vamos só mostrar as fotos do quarto e deixar que ela tenha a chance de lembrar alguma coisa. Sei que a memória dela só precisa de um pequeno incentivo para se revelar. Você reparou na quantidade de roupas cor de rosa, ou com algum detalhe nessa cor, que a Audrey usa?
John desviou a atenção da estrada por alguns segundos e olhou para Sherlock constatando como de costume que a habilidade de observação do amigo sempre seria mais bem apurada do que a sua.
(...)
Ansiosa enquanto esperava o retorno dos amigos com as fotos, Audrey Morgan tentava se distrair observando Rosie brincar. Nos finais de semana ela ficava aos cuidados de John, mas naquela tarde de Sábado havia um motivo para ele não poder estar com a filha.No entanto, ela não estava sozinha com a menina, pois Molly Hooper, aproveitando o dia de folga, viera fazer uma visita e acabou ficando para aguardar pelos próximos acontecimentos depois que a amiga contou o que Sherlock e John tinham ido fazer.
— De que colore aqui, Moy? — perguntou a menina sentada no colo da madrinha com a imagem de uma floresta impressa em uma folha à frente das duas sobre a mesa menor da cozinha.
— As folhas das árvores são de que cor, meu amor? — perguntou Molly.
— Depende... — respondeu Rosie levantando as palmas das mãos.
— Tem razão. Você é muito observadora! — Ela deu um beijo na bochecha da afilhada que reagiu com risadinhas. — Qual estação você acha que é na figura?
— Tem sol, tem flor, ... — Ela pensou por alguns instantes para enfim responder. — Pimavera!
— Isso! — Molly comemorou. — Então que cor?
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Memórias Anônimas
FanfictionA tarde entediante se transforma com a chegada de uma mulher ferida e sem memória implorando pela ajuda de Sherlock Holmes, mas graves acusações trazidas por Mycroft Holmes colocam em dúvida suas verdadeiras intenções. Porém, após vê-la salvar a vid...