Capítulo 2 - Chá com lembranças

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John veio da cozinha carregando uma caneca com chá que havia oferecido para a mulher minutos antes.

— Você não lembra nada? Seu nome, de onde veio... — Ele aproximou a alça do utensílio da mão direita dela.

— Nada John... quer dizer, tem um ano... 1980... — Ela passou a caneca para a mão esquerda. — Mas não tenho ideia do que possa significar. E lembro alguém me falando para procurar o senhor Holmes, que era o único que poderia me ajudar.

— Sherlock, por favor — corrigiu o detetive. — Consegue lembrar exatamente o que te disseram?

A mulher fechou os olhos por alguns instantes e repetiu o nome do detetive em silêncio até que conseguiu despertar a frase completa.

— Procure por Sherlock Holmes. Ele é o único que pode acabar com isso — anunciou.

Os dois homens olharam um para o outro percebendo que haviam chegado à mesma conclusão quanto à próxima pergunta.

— Alguma ideia do que seja essa coisa que ele é o único capaz de combater? — perguntou John.

Ela apenas acenou em negativo com a cabeça enquanto bebia o chá.

— Você lembra como chegou até aqui? — quis saber o detetive.

— Só alguns flashes das ruas por onde passei...

— Pela sujeira nas suas calças você veio de algum lugar com terra e grama e provavelmente se arrastou no chão e deve ter sido assim que conseguiu esses arranhões nas mãos — descreveu Sherlock.

A mulher olhou para as pequenas escoriações.

— Seus cabelos e roupas estão úmidos, o que significa que você passou algum tempo dentro d'água já que não chove há pelo menos dois dias, mas já saiu a tempo suficiente para conseguir secá-los bastante. Eu diria que está fora da água desde hoje de manhã.

— Como ela conseguiu chegar até aqui nesse estado sem ninguém oferecer ajuda? — perguntou John visivelmente incomodado.

— As pessoas preferem ignorar algo que vá interromper seus afazeres e apesar de estar sangrando, o cabelo escuro camuflou a ferida aparentando estar apenas molhado. Se ela não tivesse tentado estancar o sangramento com a mão fazendo o sangue escorrer através dos dedos quando chegou aqui, provavelmente você não teria notado da janela.

Sherlock apontou o indicador direito para o amigo.

— Até então era só uma mulher toda vestida de preto com cabelos compridos aparentando estar sujos assim como suas roupas, andando pelas ruas de Londres. Conheço muita gente em iguais condições que é sistematicamente ignorada.

— Foi um mendigo quem me disse onde te encontrar. — Ela interrompeu o detetive.

— Como? — Sherlock, que até então olhava para John, a encarou.

— Eu me lembro de um banco de parque... — Ela fechou os olhos. — Alguém com cobertores e sacolas do meu lado, não do tipo que tenham acabado de sair de uma loja. Sacolas de pano, muito gastas. Os cobertores também estavam assim. Ele me ofereceu ajuda, — a mulher olhou para o detetive e depois para John. — Eu falei que ele poderia me ajudar se soubesse onde encontrar Sherlock Holmes, então o homem me disse como chegar aqui.

— E qual era o caminho que você precisava seguir?

Com algum esforço, a mulher se lembrou das coordenadas ditadas pelo mendigo e contou para o detetive que imediatamente levantou, alcançou o cachecol azul sobre a mesa e depois caminhou na direção da porta onde seu sobretudo estava pendurado.

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