Capítulo 12

3 1 3
                                    

Não havia luz alguma naquele lugar. As trevas pairavam a cento e cinquenta metros do solo. O cenário era composto de um ambiente cavernoso. O teto continha estalactites que pingavam água que advinha da irrigação natural da superfície. Havia também pouco oxigênio e as condições de sobrevivência eram quase escassas, exceto para as únicas três pessoas que ali estavam. Para eles, não importava se o lugar possuía salubridade ou se havia a possibilidade de morrerem asfixiados com o tempo. Em meio àquele ambiente tenebroso, um plano muito maior era colocado em prática. A única luz que preenchia o lugar vinha das telas de três microcomputadores utilizados pelos cientistas Mark Denver, a renomada virologia Kassandra Winslet e pelo homem responsável pelo início do projeto Orpheu, o experiente biomédico chefe da Organização Ômega, o doutor Brandon Davis.

A caverna no subsolo foi escolhida, mesmo às pressas, como o esconderijo perfeito para que eles pudessem discutir e replanejar e definir a estratégia mais rápida e rentável para a captação de clientes e comercialização do mais recente carro-chefe da Ômega. O vírus Orpheu.

- Achei que tinha desistido do projeto, doutor Davis! - comentou o doutor Mark Denver - Levou dias para que nós recebêssemos o seu comunicado!

Mark Denver era especialista em desenvolvimento e coordenador da filial da Ômega localizada em Londres, na Inglaterra. Era conhecido por ser um chefe prepotente e totalmente inflexível. Tinha cinquenta e oito anos de idade, os poucos cabelos grisalhos que possuía eram rigorosamente penteados para trás e era metódico em seu modo de vestir. Ao invés do tradicional jaleco, usado por todos os biomédicos, Denver preferia usar um terno branco, tão limpo e bem passado que fazia um perfeito contraste com a caverna suja e úmida que tomou como quartel general. Um acidente com um experimento há cerca de doze anos arrancou o seu olho direito, deixando um horripilante espaço vazio em seu lugar, o que dava ao homem uma expressão ainda mais sombria. Poucos subordinados tinham a ousadia de encarar o doutor Denver frente a frente, preferindo em muitas ocasiões falar o que lhe era necessário, olhando para o chão, evitando o contato direito com os olhos. Na verdade, os cientistas da unidade de Londres faziam o possível para evitar qualquer tipo de contato com o chefe. O doutor Denver encarava Brendon Davis com ar de puro desprezo, sem fazer o menor esforço para disfarçar o seu olhar para o braço esquerdo do homem, que tivera o membro arrancado há alguns dias atrás, na explosão do prédio da Ômega da unidade de Westfield e em seu lugar inseriu um braço mecânico movido por inteligência artificial, desenvolvido pelo próprio doutor Denver.

- Como eu já disse muitas vezes,tive um pequeno contratempo! - justificou -se o doutor Davis, levantando o braço mecânico e o olhando com ar de repugnância.

Em um canto oposto da gruta, em uma mesa improvisada, composta por um microcomputador apoiado em uma rocha, a doutora Kassandra Winslet também olhava para o doutor Davis e quase não conseguiu segurar uma gargalhada.

- Pode nos contar de novo, Brandon? Aquela pirralha te deu uma dor de cabeça daquelas, héin?

- Ela me pegou distraido, foi o que aconteceu! Um puro golpe de sorte! E como eu iria adivinhar que aqueles insetos de Westfield teriam a capacidade de pegar um helicóptero e jogá-lo contra o prédio feito um míssil?

- Só entendo isso como uma total falha de planejamento de sua parte, doutor Davis - comentou o doutor Denver - Pelos cálculos amadores que fiz, a reconstrução daquele prédio custará quase um bilhão de dólares. O que tem a dizer em sua defesa?

- Essa é a defesa que lhes apresento - disse o doutor Davis, erguendo uma amostra do vírus como se fosse um troféu - Em poucos meses a lucratividade do Orpheu vai compensar aquele pequeno... incidente!

- Tudo é tão trivial no final das contas - comentou Kassandra - Mas creio que, felizmente, a pequenina Annchi Zhang não cruzará mais o nosso caminho. Não é verdade, Brendon?

- Bem...

Os dois cientistas olharam fixamente para o doutor Delta, esticando os pescoços, como se esperassem dele uma confirmação do que eles mesmos acabaram de afirmar.

- Brendon? - insistiu o doutor Denver.

O doutor Delta relaxou então sua expressão e abriu um sorriso de satisfação.

- Doutores... Não estou reconhecendo vocês! Estão se preocupando demais com alguém que, mesmo se por um milagre tiver sobrevivido àquele desastre, não poderá mudar em nada o rumo de nosso sucesso!

- Então você acha que a nossa formiguinha ainda está viva e andando por aí! - questionou a doutora Kassandra com um sorriso sinistro em seus lábios preenchidos com batom Bordeaux.

- Ora, e quem pode saber? - rebateu o doutor Delta, abrindo os braços - Mas saibam... Que mesmo para esse tipo de... imprevisto eu já tinha um trunfo escondido!

- Tenho minhas dúvidas, Brendon! - provocou o doutor Denver - Essa sua jovem subordinada parece estar te dando mais trabalho do que uma filha adolescente! E espero do fundo do meu coração que ela não venha dar esse mesmo trabalho a nós... E ao Orpheu!

Repentinamente, Brendon Davis adotou uma expressão sombria, com seus olhos fixos no único olho do seu provocador.

- Mais uma vez está me subestimando, Mark! É melhor abrir o seu... olho! Pois se eu digo aos senhores que tenho tudo sob o mais absoluto controle, é porque é exatamente isso o que eu tenho!

Com uma leve gargalhada, a doutora Kassandra interveio:

- Desculpe-nos, Brendon! É só que... Fica difícil para nós acreditarmos que temos controle sobre a formiguinha se não sabemos nem mesmo se está viva e nem onde ela está!

- Mas nós não precisamos saber onde ela está!

- E o que exatamente você quer dizer com isso? - perguntou incrédulo o doutor Denver.

- Como eu disse, senhores... Temos tudo sob controle!

CODINOME: DELTAOnde histórias criam vida. Descubra agora