CODINOME: DELTA

Capítulo 60

Por alguns instantes, o tempo pareceu paralisar-se por completo. Após meses de um intenso pandemônio sem fim, todos os sobreviventes envolvidos no presente conflito se olhavam entre si, avaliando o impacto da revelação que acabara de sair dos lábios de Solomon Locke. O temível doutor Brandon Davis, virologista chefe da Organização Ômega e principal responsável pela criação do vírus Orpheu era, na verdade, Arthur Locke, o filho que Solomon vinha procurando há muito tempo. A figura do pai, não abrindo mão de sua autoridade e, quem sabe, de sua misericórdia, enfureceu Arthur, que rapidamente abriu a porta do carro, se projetou para fora e rolou ao chão, sacando novamente a pistola e atirando na direção de Alex e Solomon. Alex puxou o companheiro para atrás de uma coluna grossa de concreto para que pudessem se proteger do disparo.

— Solomon... por que não nos contou? — perguntou Alex, nitidamente indignado com a sequência de acontecimentos.

— Não faria diferença, Alex! — a voz de Solomon soou extremamente triste — Arthur morreu junto com este mundo. Não há mais sentimento algum ou algo que possa impedir a sua ganância. E eu sou o culpado. Não consegui enxergar o monstro no qual ele estava se transformando. Para mim, Arthur era um jovem rebelde com uma ambição fora do comum e somente isso. Se eu soubesse a tragédia que ele seria capaz de causar...

O lamento de Solomon foi interrompido por mais um disparo da pistola do doutor Delta. Alex conferiu o pente da Magnum. Três balas e o rifle de precisão de Solomon contra um revólver de mão de um homem fora de controle.

— A culpa não é sua, Solomon! — declarou Alex — Nunca foi! Todos fazemos nossas escolhas e sabemos as consequências de cada uma! Me perdoe pela minha frieza, mas nesse momento, seu filho é capaz de te matar sem pensar duas vezes! Precisamos reagir, temos pessoas lá dentro para proteger!

Outro disparo foi ouvido ao longe, próximo ao bosque. Mia Zhang atirava na direção do doutor Delta, que conseguiu se esquivar, correndo para dentro do estacionamento do hospital. O virologista recarregou sua arma e atirava contra Mia por detrás do muro do estacionamento. Uma horda cada vez maior de Carnívoros se aproximava do local, atraída pelo som dos disparos. O conflito despertou centenas de mortos-vivos, que caminhavam de forma lenta e sinistra, como se soubessem que suas presas não tinham para onde fugir. Seus rosnados quase formavam um coral macabro e podia ser ouvido de dentro do hospital, o que fez com que Beatrice e os outros saíssem rapidamente do prédio. Imediatamente, Alex emitiu a ordem.

— Ei, vocês! Voltem pra dentro!

Beatrice pareceu não ter ouvido a advertência de Alex. Boquiaberta, ela olhava com espanto a multidão de criaturas que se aproximavam do hospital. Era um grupo tão grande que poderia derrubar o prédio se assim quisessem. Porém, um pensamento surgiu na mente de Beatrice, que se aproximou sem medo algum de Alex e Solomon, ainda escondidos atrás da pilastra.

— Alex... preciso ver se realmente a amostra do Orpheu está funcionando!

— Do que está falando, Beatrice? Vá lá pra dentro e ajude a proteger o prédio! Brandon está há poucos metros de nós e está armado!

— Confie em mim... Sei que é absurdo, mas essa é a chance de ver se o que o doutor Hurley está dizendo é verdade. Se eu for de fato imune ao Orpheu, teremos uma grande vantagem a partir de agora.

— De jeito nenhum, Beatrice! Eu não posso arriscar perder você. Olhe para aquela multidão! Eles vão devorar você em segundos! Eu não posso...

— Confie nela, Alex! — interveio Solomon — Beatrice é uma de nós e sabe como lutar contra os monstros! Eu mesmo já a vi em combate. Se o pior acontecer, entraremos em ação imediatamente!

— Solomon, o doutor Davis está a menos de cinquenta metros de distância de nós e está armado! Isso... é loucura!

— Arthur é o menor de nossos problemas... pelo menos por enquanto! — Solomon mantinha a calma característica em sua voz, olhando nos olhos de Alex, tentando convencê-lo da relevância de sua estratégia — Se descobrirmos que Beatrice possui a imunidade ao vírus, seremos capazes de avançar sem maiores problemas. Temos que usar esse possível trunfo ao nosso favor.

Aparentemente convencido, Alex voltou à sua posição de defesa e conferiu o pente da Magnum.

— Está certo! Pode ir, Beatrice! Ao menor sinal de perigo, emita um sinal com a mão e estaremos prontos para agir! Tome cuidado!

— Vocês também! — ela assentiu com a cabeça e correu pelo outro portão do estacionamento em direção à horda que vinha do fundo do bosque. Brandon Davis continuava escondido atrás dos muros do estacionamento e disparava contra Mia Zhang, que se aproximava tentando atingí-lo. Annchi se aproximava sorrateiramente e atirava com a Ruger. Um disparo por muito pouco não atingiu a cabeça do doutor Delta que, vendo que estava cercado, correu em direção à Dodge Ram. Ele seguia agachado, atirando contra mãe e filha, que se desvencilhavam habilidosamente, mantendo a artilharia. Bruce e Frank atiravam pelo lado oposto. Uma bala explodiu no retrovisor direito do veículo, enquanto outro disparo destruiu o vidro da janela do lado esquerdo.

— Filhos da puta! — gritou o doutor Davis — Não pensem que poderão acabar comigo tão facilmente! Eu sou o novo supremo governante desse mundo, aceitem isso!

Annchi e Mia se aproximavam, mantendo suas armas em punho. Enquanto Brandon atirava contra Bruce e Frank, elas procuraram encurralá-lo, se separando e deixando o homem sem opções de fuga. Alucinado, o doutor Delta recarregou sua pistola e voltou a atirar contra Bruce e Frank.

— Seus desgraçados! Eu confiei em vocês! Dizem ser militares respeitados, mas não conseguem capturar uma vagabunda destruidora de sociedades!

Uma bala atingiu o chassi do veículo e Brandon se arrastou pelo chão, tentando acertar os dois soldados. Foi quando ele viu, pelo retrovisor direito da Dodge Ram, Annchi se aproximar com a Ruger em punho. Ele sorriu e disse, consigo mesmo.

— Não vai ser dessa vez, doutora Zhang!

Em um rompante de adrenalina, Brandon conseguiu abrir a porta do passageiro, correr para a direção do veículo, dar a partida e engatar a marcha a ré, acelerando de maneira feroz na direção de Mia, que vinha logo atrás. Annchi correu e saltou sobre o corpo da mãe, o que fez com que as duas caíssem e rolassem pelo chão. Bruce Anderson correu e deu a ordem a Frank Mccallister.

— Os pneus! Atire na porra dos pneus!

Os dois soldados soltaram uma rajada de disparos em direção à Dodge Ram, porém, como o veículo estava em altíssima velocidade e acelerava em curvas absurdamente fechadas, o máximo que conseguiram foi acertar o para-choque dianteiro e a porta do lado direito. A Dodge Ram girou nos próprios pneus, derrapando em circunferência e partindo em seguida, deixando a megahorda a uma distância perigosíssima do hospital.