Capítulo 49

8 1 0
                                        

Há sete anos...

Aquele poderia ser um dia comum no setor de pesquisas biológicas no gigantesco complexo da Organização Ômega. A intensa movimentação de cientistas, magistrados, virologistas e bioquímicos era rotineira. O trabalho nunca cessava nas dependências de uma das maiores redes farmacêuticas do planeta. À medida que as bactérias e enfermidades evoluíam, novos projetos eram idealizados e novas soluções eram implantadas. O complexo funcionava vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana. Não havia pausa para o progresso.

No entanto, especificamente no quinto andar, na sala 225, um projeto incomum estava sendo desenvolvido. Tratava-se de uma pesquisa paralela e um tanto obscura. A respeitada virologista, doutora Kassandra Winslet passava horas a fio em uma pesquisa envolvendo células-tronco. Fugia totalmente dos padrões estipulados pela Ômega, mas ela não se importava. A pesquisa era secreta e de vital e pessoal importância. Seu filho Matthew, de nove anos, foi diagnosticado com um tipo raríssimo de paralisia que, na época, não pôde ser diagnosticado pelos médicos de um renomado hospital em Massachusetts. E mesmo Kassandra sendo virologista durante anos, também não conseguiu identificar o que de fato causava a paralisia em Matthew e, o mais importante, como revertê-la. Contudo, há alguns meses, após assistir a um documentário em uma emissora voltada à Biologia na tevê, uma ideia lhe ocorreu. O documentário falava sobre uma bactéria raríssima que tinha a capacidade de pairar pelo ar. Tal bactéria costumava infectar principalmente plantas e sua principal propriedade era interromper a fotossíntese, causando desidratação, bem como a paralisia do organismo hospedeiro.

Kassandra se lembrou que, no período gestacional, ela frequentava o jardim botânico de Westfield. O contato com as plantas lhe fazia muito bem, pois além do aroma agradabilíssimo, Matthew se mexia muito mais em seu ventre, liberando automaticamente dopamina no cérebro de sua mãe. Em outras palavras, mãe e filho se encantavam com as maravilhas das flores e não queriam sair daquele ambiente. Ali, Kassandra conseguia se esquecer do ambiente clínico, das salas absurdamente iluminadas, dos telescópios, dos diagramas e, principalmente, da tirania do doutor Brandon Davis. Kassandra então associou esse fato à hipótese da bactéria tê-la infectado em sua gestação. O problema era que, em todos os exames que realizara, a bactéria não foi identificada.

Somente anos depois, quando Kassandra decidiu realizar mais um exame em seu próprio sangue, ela finalmente constatou o que suspeitava. Ela estava certa. A bactéria a havia infectado, porém o seu diagnóstico era tardio. Isso porque se tratava de uma bactéria inteligente, que tinha a capacidade de se camuflar entre as células. Uma esperança nasceu no coração de Kassandra e de Rodrick Winslet, seu esposo. A cura era possível, e Kassandra tinha o conhecimento e os recursos necessários para desenvolvê-la. Entretanto, havia um grande problema na administração da solução e não havia outra forma de fazê-la. O antígeno agiria direto na corrente sanguínea e, assim que a bactéria detectasse o corpo estranho, ela se misturaria aos glóbulos brancos, agindo como uma espécie de infiltrado. Uma grande atividade celular se desencaderia a partir daí, e uma dor intensa seria sentida pelo paciente. O risco de morte da pessoa era enorme. Assim que Rodrick soube do procedimento, tentou argumentar com Kassandra.

— Meu amor, isso é loucura! Não podemos submeter Matthew a um sofrimento como esse. Um homem adulto não suportaria esse procedimento, quanto mais um garoto de nove anos...

— Eu sei, mas é nossa única chance, querido! Se isso der certo, como eu sei que dará, Matthew se levantará da cadeira de rodas e correrá para os nossos braços.

— Mas também existe a hipótese de dar errado, Kassie. O antígeno é ótimo, não tenho a menor dúvida disso, mas também é extremamente poderoso. Matthew ainda é uma criança, seu corpo não se desenvolveu corretamente. Caso o procedimento não dê certo, eu não sei como poderei...

— Eu não aguento mais, Rodrick! — exclamou Kassandra, segurando as mangas do jaleco do esposo — Será que não percebe? Não suporto mais ter que olhar para a expressão desolada de Matthew olhando para as crianças correndo quando vamos ao Clinton Park. Eu não sou mais capaz de sempre repetir que ele é uma criança muito especial e que Deus, ou seja lá o que for, o enviou a nós com uma missão que nenhuma outra criança seria capaz de cumprir. Eu sei, isso é muito arriscado e as chances de dar certo são poucas, mas nós temos uma oportunidade, Rodrick! Depois de nove anos, temos a chance de dar ao Matthew uma nova vida, uma nova forma de aproveitar o mundo, sentir as coisas.

— Antes de concordar com tudo isso, quero saber o que Matthew pensa sobre tudo isso.

— O que disse? — indagou Kassandra, surpresa.

— Matthew é quem mais sofrerá com todo o procedimento. Quero saber o que ele pensa a respeito de tudo isso e se de fato ele concordará em se submeter à atividade do antígeno.

— Rodrick... Matt é uma criança, não pode responder por si mesmo. Somos os pais dele, isso já está decidido. Tudo isso será para o seu bem, é óbvio que ele concorda.

— Isso pode estar decidido por você, mas não por mim e muito menos por ele. Quero ouvir o que ele tem a nos dizer, o que pensa sobre tudo isso e, principalmente, se ele realmente concorda em participar dessa... insanidade!

Kassandra virou-se para a janela, como se esperasse que a resposta viesse de algum lugar lá de fora. Após alguns instantes em silêncio, ela suspirou, exasperada, e respondeu:

— Tudo bem... falaremos com Matthew! Mas tem que ser agora. Não vou conseguir dormir sem tomar uma decisão definitiva!

Matthew Winslet estava dormindo profundamente, no auge das duas e onze da manhã. Ele sentiu uma mão leve acariciando seus cabelos loiros e outra mão sacudindo levemente seu ombro.

— Matt... acorde, querido! Posso falar com você por uns instantes?

— Ma-mamãe? — Matthew acordou, mal conseguindo abrir os olhos — O que aconteceu?

— Você se lembra quando a mamãe falou com você sobre um remédio que ela inventou, e que pode fazer com que você consiga andar?

— Sim, eu me lembro... você me falou que ele é um pouco dolorido, mas que só precisava ser aplicado uma vez e que eu poderia mover minhas pernas em poucos dias.

— Isso mesmo! — Kassandra olhou para a porta do quarto e viu que Rodrick ainda estava parado em pé, aparentemente sem coragem para entrar no ambiente que logo se transformaria. O olhar dela foi muito claro e então ele finalmente entrou no quarto e se sentou no outro lado da cama. Ela voltou a olhar para Matthew e continuou — Querido, temos tudo pronto para aplicar esse remédio em você. O que seu pai e eu gostaríamos de saber é se você aceita participar do procedimento junto com a gente. Em uma questão de dez ou quinze dias, você já não vai mais precisar usar essa cadeira de rodas.

— Bem, eu... sempre usei a cadeira. Não sei como seria uma vida sem ela. Não sei como é andar... Pode ser que o remédio funcione, mas se eu continuar assim, acho que também está tudo bem.

Rodrick interveio:

— Matt... não tem curiosidade em saber como é andar e correr como as outras crianças e adultos? Não tem vontade de brincar com as crianças do Clinton Park?

— Eu tenho, papai, é só que... A verdade é que estou com um pouco de medo. E se não funcionar? E se eu contrair alguma outra doença?

— Não precisa ter medo, querido! — exclamou Kassandra — Todos nós estaremos juntos com você no momento da aplicação. O papai, eu, a tia Annchi...

Matthew se levantou subitamente e se encostou na cabeceira da cama.

— A tia Annchi vai estar lá?

CODINOME: DELTAOnde histórias criam vida. Descubra agora