CINQUENTA E UM - DÁRIO

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Desligo o telefone, mas o som da voz dela ainda ressoa na minha mente. Uma mistura de culpa e satisfação me invade, cada batida do coração mais pesada que a anterior. É surreal pensar em como as coisas chegaram a esse ponto. Quem diria que aquela garota, que um dia me olhava com puro ódio, agora me desejaria tanto? Sou um filho da puta sortudo, e disso não tenho dúvidas.

Lembro-me de cada lágrima que ela derramou, cada súplica desesperada. O que deveria me encher de orgulho, de uma sensação de poder absoluto, acaba me corroendo por dentro. O coração dói de saudade, mas também de algo mais profundo, algo que não consigo decifrar. Chiara entrou na minha vida como uma tempestade, e agora, estou preso nesse furacão que ela se tornou.

O mais louco de tudo isso é que ela me ama. Mesmo depois de tudo o que fiz, depois de cada vez que a empurrei para os limites do que qualquer ser humano poderia suportar, ela ainda me deseja. Como é possível? Talvez eu realmente seja o filho da puta mais sortudo que existe, ou talvez, a vida só tenha um humor cruel que gosta de brincar comigo.

Repasso na minha cabeça todos os momentos que tivemos juntos, as noites de prazer, as manhãs em que a vi acordar ao meu lado, ainda com aquele olhar de quem lutava contra o que sentia. É estranho, mas ao mesmo tempo, é a coisa mais real que já experimentei. E agora, cada segundo longe dela parece um castigo, uma eternidade em que tudo o que eu desejo é voltar e sentir sua pele contra a minha novamente.

Os homens da organização me observam com respeito, talvez até com um pouco de medo, mas nenhum deles entende o que está acontecendo aqui dentro. Nenhum deles sabe que o Don, o implacável Dário Fiore, está completamente fodido por uma garota que deveria ser apenas mais uma peça no jogo. Mas ela não é, e isso me apavora tanto quanto me excita.

Dou uma última tragada no charuto, o sabor amargo misturando-se com os pensamentos confusos que me atormentam. Eu quero voltar, mas ao mesmo tempo, sei que preciso terminar o que vim fazer aqui. Chiara terá que esperar um pouco mais, e essa espera só torna tudo mais intenso, mais desesperador.

Sou um filho da puta sortudo, mas também sou um homem preso em suas próprias escolhas. E a maior delas, aquela que pode muito bem ser a minha ruína, é o amor que sinto por ela. Não importa o que aconteça, não importa o quão fodido tudo esteja, vou voltar para ela. Porque, no final das contas, é a única coisa que realmente importa.

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Reúno-me novamente com os homens da organização, o ambiente carregado de tensão e expectativas. O ar na Sicília sempre tem um peso diferente, mais denso, como se a própria terra estivesse impregnada com o sangue e o suor daqueles que vieram antes de nós. As conversas sussurradas se intensificam à medida que nos sentamos ao redor da mesa, todos conscientes de que esta reunião não é apenas mais uma. O alvo foi escolhido, e não há espaço para erro.

— Chegou a hora de dar uma lição àqueles que ousaram nos desafiar — digo, minha voz firme ecoando pelo salão. O olhar dos presentes se fixa em mim, todos aguardando o próximo movimento.

Os últimos eventos exigem uma resposta que marque o território, que mostre aos Caputo que a ousadia tem um preço alto. E, para isso, nada melhor do que focar na peça mais vulnerável, o elo que acreditam ser mais seguro.

— O caçula... — continua alguém, um murmúrio que corre pela mesa, mas todos já sabem onde estou indo com isso.

Um leve sorriso cruel se forma em meu rosto enquanto observo as reações ao meu redor. Não há dúvidas, apenas uma aceitação silenciosa da inevitabilidade. O plano é direto, mas a execução precisa ser impecável. E, para isso, o alvo não poderia ser outro. O mais jovem, aquele que ainda não se manchou tanto, aquele que ainda acredita em alguma forma de redenção dentro desse mundo corrompido.

Resgatada pelo mafioso - Livro UmOnde histórias criam vida. Descubra agora