My Talisman

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A noite era véspera da semifinal. A ansiedade de Anne estava à flor da pele; um único jogo poderia mudar o rumo de sua equipe e de sua carreira. Apesar de ter passado o dia ao lado de Carol, que sempre encontrava maneiras de distraí-la, agora, sozinha no quarto, os pensamentos voltaram a correr livres. Deitada na cama, com o olhar perdido no teto, ela lutava para lidar com a pressão. Seus devaneios foram interrompidos pelo toque do celular. Ao ver o nome da mãe na tela, soltou um longo suspiro, sabendo o que viria.

Levantou-se, saindo do alojamento em silêncio, e foi até o pátio da vila olímpica enquanto atendia a ligação.

— Alô? — Anne disse ao entrar no elevador, tentando manter a voz neutra.

— Quem você pensa que é? Está querendo me humilhar? — A voz de Irene explodiu pelo telefone, carregada de raiva.

Anne franziu o cenho, confusa com o ataque repentino.

— Não sei do que você está falando... E sim, estou bem, obrigada por perguntar — respondeu com ironia, tentando se manter calma.

— Não sabe? Quem é Ana Carolina? Anne Elise, você perdeu completamente o juízo? Que humilhação! — Irene continuou, cada palavra carregada de desprezo. — Aceitei muitas coisas, mas agora isso? Envolvida com uma mulher? E ainda por cima brasileira? Que vergonha!

Anne sentiu o coração apertar. Já conhecia o tom crítico da mãe, mas nunca deixava de doer. Respirou fundo, lutando contra o nó de choro que se formava em sua garganta.

— Carol é minha amiga, mãe — disse, tentando manter a voz firme. — Não conheço muita gente aqui, e ela tem sido meu apoio.

— Ajudar? De mãos dadas? — Irene retrucou, fazendo referência à foto que circulava na mídia, onde Anne e Carol apareciam caminhando juntas, de mãos dadas.

Anne fechou os olhos por um momento, sentindo o peso das expectativas de sua mãe esmagando sua confiança. Nada que fizesse parecia ser suficiente. Cada escolha pessoal, cada tentativa de viver sua vida de maneira autêntica, era tratada como uma afronta.

— Eu preciso descansar, mãe. O jogo é amanhã — cortou a conversa, a voz baixa e cansada, e desligou antes que Irene pudesse responder.

Encostada na parede fria do pátio, Anne sentiu as lágrimas finalmente escaparem. Estava exausta, não apenas pela pressão do torneio, mas pelo constante julgamento de sua mãe. Ela só queria ser aceita por quem era, sem ter que justificar sua felicidade.

(Meu Talismã - Play on)

Carol estava no quarto, organizando suas coisas para o dia seguinte, quando, ao olhar pela janela, viu Anne no pátio, encostada na parede, com o rosto parcialmente coberto pelas mãos. A postura de Anne, curvada e tensa, chamou a atenção de Carol de imediato. Algo estava errado. Ela conhecia aquele tipo de linguagem corporal, sabia reconhecer quando Anne estava escondendo suas emoções, tentando ser forte, mas, naquele momento, parecia que ela não conseguia mais conter o que sentia.

Sem pensar duas vezes, Carol largou tudo e saiu do quarto. O corredor estava silencioso, mas a mente de Carol fervilhava de preocupações. Ela desceu apressada pelo elevador e, ao chegar ao pátio, encontrou Anne ainda no mesmo lugar, aparentemente perdida em seus próprios pensamentos, lutando contra as lágrimas que escorriam pelo rosto.

— Anne? — chamou suavemente, a voz carregada de preocupação.

Anne levantou o olhar, ainda com os olhos vermelhos e cheios de lágrimas, tentando se recompor. Era tarde demais para esconder.

— O que aconteceu? — Carol perguntou, colocando a mão gentilmente no ombro de Anne.

Anne tentou falar, mas sua voz falhou. A dor era tanta que parecia impossível colocá-la em palavras.

— Ei, tá tudo bem... — Carol disse, se aproximando mais, sem invadir o espaço de Anne, mas mostrando que estava ali. — Respira comigo, vai?

Anne fechou os olhos e tentou acompanhar a respiração calma de Carol. Só de estar ao seu lado, já sentia um pouco do peso aliviado. Carol sempre soube como tranquilizá-la, sem precisar dizer muito.

— Você não está sozinha, Anne. Seja o que for, estou aqui com você. — Carol apertou o ombro dela de leve, demonstrando todo seu apoio.

As palavras de Carol eram um bálsamo, mas o peso que Anne carregava ainda era forte demais. Sentindo que não aguentaria mais, ela soltou o ar de maneira entrecortada e deixou as lágrimas correrem de novo, afundando-se nos braços de Carol.

Carol não hesitou em abraçá-la forte, envolvendo-a com carinho e proteção. Sentia o corpo de Anne tremendo levemente contra o seu, e aquilo a partiu por dentro. Ela sabia o quanto Anne lutava para ser forte, especialmente em relação à mãe.

— Shhh, tô aqui — sussurrou Carol, acariciando os cabelos de Anne. — Você não precisa passar por isso sozinha.

Elas ficaram assim por alguns minutos, em silêncio, enquanto Anne liberava a dor que havia reprimido. Quando finalmente as lágrimas começaram a cessar, Anne se afastou levemente, enxugando o rosto, um pouco constrangida.

— Desculpa por isso... — murmurou Anne, ainda com a voz embargada.

— Não peça desculpas, amor. — Carol pegou a mão de Anne com delicadeza. — Você não precisa enfrentar isso sozinha. Eu estou aqui, tá? Sempre vou estar.

Anne ergueu os olhos, encontrando o olhar sincero e afetuoso de Carol. Sabia que aquelas palavras eram verdadeiras, e, pela primeira vez em muito tempo, sentiu que poderia ser quem era, sem medo de julgamento. Carol a via de verdade, a aceitava e a amava, mesmo com todas as suas vulnerabilidades.

— Foi minha mãe... — Anne finalmente disse, a voz hesitante. — Ela descobriu sobre nós... e está furiosa. Disse que sou uma decepção.

Carol respirou fundo, contendo a raiva que sentia por ver Anne tão machucada por causa de alguém que deveria amá-la incondicionalmente.

— Você não é uma decepção, Anne. Nem de longe. — Carol apertou a mão dela. — Ela não entende, mas eu entendo. E você é incrível, do jeito que você é.

Anne, ainda com os olhos marejados, sentiu uma onda de gratidão e amor por Carol. O contraste entre o julgamento de sua mãe e o apoio inabalável de Carol era nítido. Ali, nos braços de Carol, ela sentia que, talvez, pudesse finalmente encontrar a coragem de viver sua vida da maneira que queria.

Sem dizer mais nada, Anne se inclinou e deu um selinho suave em Carol, como um gesto de agradecimento e amor, um momento silencioso de conexão e conforto. Carol sorriu contra os lábios de Anne, segurando seu rosto com carinho, antes de se afastar levemente.

— Vamos voltar para dentro? — sugeriu Carol, ainda com a mão segurando a de Anne.

Anne assentiu, sentindo-se mais leve, pronta para enfrentar o que viesse ao lado de Carol.

(Meu Talismã - play off)

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