Cap. 29 Saudade dói onde os outros não vêem (parte 2)

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O senhor que me acompanhava ficou um tempo em silêncio, me observava, tentava decifrar. Parecia ter um certo receio de falar.

- O senhor conheceu a família?

- Faz muito tempo que não os vejo. - pelo menos eu não estava mentindo - Nunca mais tive notícias.

- A menina faz tempo que não vem, os pais eu nunca mais vi. Ela era uma boa menina, doce, parecia um anjo. Eu conversava bastante com ela quando 'aparicia ai, a bichinha era fechada, quase não falava no começo, mas depois que pegou confiança falava ate de mais. Danadinha, era esperta que só. Ela devia gostar muito daquele irmão viu, uma vez perguntei se ela não tinha medo de dormir ai, ela disse que estava mais segura aqui com o irmão do que em casa.

Eu ia perguntar mais alguma coisa quando ele apontou dizendo que havíamos chegado. Eu agradeci e o senhor foi embora, fiquei com tantas perguntas sem respostas. Pensei se eu devia ir direto falar com a Érin, mas assim que me aproximei ouvi sua voz, tremula e chorosa, mas ao mesmo tempo tão doce e tão carinhosa, carinhosa de um jeito que nem quando criança eu tinha visto.

- Eu sinto tanto a sua falta, queria tanto ser melhor do que isso. Sei que não me tornei nem a metade da mulher que você gostaria que eu fosse. Todos os anos eu tento ser melhor, tentei esse ano também e fico me perguntando se você realmente vê tudo o que faço. Acho que nunca vou conseguir chegar aqui sem sofrimentos, sem dor. Veja só eu estou casada e esperei tanto por isso, eu sempre achei que quando o Erick voltasse eu ia ser feliz, que eu ia chegar aqui e te dizer que eu consegui. Mas e ai? Eu to casada e dai? Eu nunca vou ser feliz com o Erick, nunca. O ódio que eu sinto por ele nunca vai me deixar amá-lo outra vez.

As palavras da Érin partem o meu coração em mil pedaços. Dez anos de uma vida pra ouvir a mulher que você ama dizer que nunca vai poder te amar, que a distância que quase te enlouqueceu só deu a ela sentimentos ruins.

Érin

Sinto o coração apertado, falar do Erick dói, lembrar tudo o que passei nos últimos dez anos, saber que eu estive sozinha todo o tempo, que ele estava feliz com outra enquanto eu chorava sozinha a ausência de um amor que não ia voltar. Quantas vezes eu chorei em silêncio junto ao túmulo do meu irmão a ausência de um amor, quantas vezes eu passei a tarde sozinha nesse cemitério pedindo colo a alguém que mesmo que quisesse nunca voltaria, quantas vezes chorei até com o seu Juca, o coveiro do cemitério, o amor que perdi. Tantos anos de sofrimento pra que? Pro Erick voltar e me obrigar a casar, pra ele voltar e medir forças com meu pai? Não era por mim, nada daquilo era por mim. Fico me perguntando se o Erick realmente queria ser feliz ao meu lado ou se tudo o que vivemos até hoje faz parte do plano de destruir o meu pai.

- Eu queria ter ido no seu lugar, a vida é tão injusta - as lágrimas voltam a cair pelo meu rosto - De que adianta continuar aqui se eu não sei viver sem você? Por que Deus foi tão injusto com a gente? Você era feliz, tão cheio de vida e eu que sempre fui só um corpo sem alma é quem continuo vivendo? Onde esta a justiça de Deus nisso? Por que Deus deixou que eu me apaixonasse logo pelo filho do homem que todos dizem ter tirado a sua vida? Por que o Erick não podia ser só mais um garoto? Não é justo! Não é justo ter amado tanto uma pessoa pra terminar assim, presa num casamento que nunca vai trazer felicidade! - o choro se tornou compulsivo, cobri o rosto com as mãos e deixei que as lagrimas expulsassem o meu sofrimento - Não é justo eu ter que continuar vivendo sem você! Eu não aguento mais ficar sozinha, não é bom ficar sozinha, eu odeio estar aqui, olha pra mim e me diz Alex no que eu me tornei? Uma droga de garota solitária que não tem amigos e que passou a maior parte da vida dentro de um cemitério conversando com um irmão morto? Ouvindo todo mundo dizer que eu era maluca, era isso que você queria pra mim? Por que eu não consigo ser como você queria que eu fosse? Por que? Por que? Por que? - as lagrimas doem, mas os motivos que as fazem cair doem mais - Eu não aguento mais, eu não aguento mais ser tão sozinha, não é justo! Eu devia ter morrido naquele hospital, eu não devia ter acordado daquele maldito coma! Eu odeio ter acordado, eu odeio o papai, odeio o Erick e quer saber eu odeio você também!!!! Eu não aguento mais! - não pude mais conter o choro, a voz já não sai mais e nem sei se ainda tenho consciência das minhas palavras. - Desculpa Alex, eu amo você. - a voz já é só um sussurro, uma voz cansada de quem botou pra fora mais do aguentava - Desculpa é só que eu não aguento mais ser tão sozinha.

Entre o amor e a vingançaOnde histórias criam vida. Descubra agora