14. Ilusões

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Música recomendada: Eyes Without a Face, Billy Idol

Aquele odor está quase que insuportável para Jørn. Putrefação misturado com mel, espuma de barbear e tinta. Há outros odores também, mas o rapaz não soube identificar. Agora o cheiro de saliva preenche o lugar por alguns segundos, após Per espirrar.

― A garganta ainda dói? ‒ diz Jørn, entregando uma xícara de chá de gengibre para o garoto.

― Sim, mas menos que ontem. ‒ diz ele, fungando e esfregando o nariz.

Stubberud abre a janela, na intenção de que o odor deixasse o quarto. Se senta sobre a cama, com certo cuidado, e observa Per por alguns segundos, que está sentado sobre o tapete sujo do quarto. Ele lê O Homem que Ri.

― Cara, podemos conversar agora? ‒ ele diz.

O loiro o encara rapidamente, mas volta a sua atenção para o livro novamente.

― Claro. Pode falar.

Jørn revira os olhos e apoia os cotovelos sobre os joelhos.

― Digo, conversar mesmo. De homem para homem.

Per o encara novamente e fecha o livro com certa força. De homem para espantalho, ele corrige mentalmente, se arruma no chão e ergue o olhar para o amigo com atenção.

― Diga.

Stubberud coça a cabeça e respira fundo:

― É sobre... esses ‒ ele diz, fazendo de conta que tem uma faca na mão e aponta para o próprio antebraço. ― esses negócios que faz consigo mesmo.

Per observa o seu braço. Na verdade, há uma faixa cobrindo toda a pele. O garoto foi cuidadoso ao sempre usar jaqueta quando via Lúthien. Não queria ouví-la questionando-o sobre os seus ferimentos.

― Sim? ‒ Per incentiva-o a continuar.

― Não posso falar o que tem de fazer ou não, mas é apenas um conselho: você precisa parar com isso. Um dia isso pode se tornar um problema grande.

Per nada diz, então Stubberud continua:

― Imagine você acabar num hospital. ‒ notando que o amigo está indiferente aos seus avisos, o norueguês decide apelar para algo mais emocional ― Imagine sua família sabendo disso. Seus irmãos mais novos. Não pensa nisso?

Após essa fala, Ohlin se endireita em sua postura desleixada e o rosto adquire expressões preocupadas. Alarmadas.

― Não contaria para eles ‒ diz, com o olhar intenso sobre Jørn ―, não é?

O moreno suspira. Ele fica aliviado em saber que conseguiu sensibilizar o amigo, mas ao mesmo tempo sente-se mal por isso.

― Pelle, seria injusto se não contasse. Se um dia você precisar ficar internado, ou sei lá, sua família precisaria saber.

― Que seja!, eles precisariam saber, mas eu não iria querer isso. ‒ o louro quase grita.

Jørn engole o seco e fica sem resposta, até que Per resolve falar:

― Eu faria a mesma coisa por você. ‒ oh, sim. Ele faria, sim. E Stubberud tem total consciência disso. A velha e péssima fidelidade.

Per sabe muito bem que, se ocorresse alguma coisa (causada por ele mesmo), Stubberud nunca iria querer que a família soubesse.

― Certo, Pelle. Eu não contaria, mas apenas pensa no que eu te falei. Se não for por eles, pare por você mesmo. ‒ diz.

― Vou pensar. ‒ Per diz e pega seu livro de volta.

O Violinista no JardimOnde histórias criam vida. Descubra agora