― Per! ― o ruivo grita.
Per!
Per!
Per!
Aqueles chamados são bem familiares para Per Yngve Ohlin. E até mesmo correndo há mais de cinco minutos ele é capaz de lembrar-se.
― Droga, Pelle! – disse o garoto atrás dele ― Já está muito velho para agir dessa maneira.
Ele quer continuar a correr, mas há um vilão para impedi-lo: seu condicionamento físico. A respiração fraca, os pulmões queimando e as pernas doloridas. Não é muito recomendado correr tanto sem preparo, principalmente se não passa dos 53 quilos.
Per pára inclinado, com as mãos nos joelhos. Respirando fundo e devagar, assim como seu pai ensinou.
Havia uma deusa. Bom, talvez ainda há.
Chamavam-na de Despina. Ela é considerada a deusa do Inverno.
Sua história é um pouco amarga. Na verdade, muito. A deusa do Inverno poderia ser fria e calculista, mas não passa de um ser orgulhoso e mesquinho.
Ela é filha de Deméter, a deusa da Agricultura; logo, irmã de Perséfone, a deusa da Primavera. Já dá para perceber que Despina é como a ovelha negra da família.
Não a culpe. Na verdade, ela é tão amargurada pelo abandono da sua própria mãe, tão invejosa por sua irmã.
De alguma forma, ela queria ser superior. Queria provar a si mesma e aos outros deuses que sempre desprezara a família. Assim, ela passou a destruir todos os feitos que sua mãe e irmã faziam.
Ela destrói as cores vibrantes da primavera, o calor do verão, as boas colheitas, a beleza e inocência dessas estações. E assim, nasce uma estação fria e cruel.
Per não pensa nessa história, de fato. Ele apenas contempla os feitos de Despina: a grama destruída, o frio que atinge sua pele descoberta, as árvores quase sem vida, a escuridão, o silêncio. A água fria que presenteia a terra é uma exceção, diga-se de passagem.
Cruel outono.
O rapaz louro só consegue ver as lápides por conta das luzes fracas dos pequenos postes ao redor do cemitério.
Ele ri.
A chuva encharca seu cabelo longo, suas roupas escuras e, claro, o chão em que ele está sentado.
Como deve ser estar debaixo da terra? Ele se pergunta. Sentem a água?
Ele estende a mão e toca na lápide de um defunto qualquer. Fica lá por algum tempo, até seu cansaço cessar.
O seu amigo provavelmente está bem longe àquela altura, pois nem os chamados Per pôde ouvir.
Ele olha a lápide mais de perto e nela está escrito "Steffan Coppola".
Ótimo, um italiano, pensou. Ele suspira e deita-se sobre o chão do cemitério.
Per não queria estar ali, mas, ao mesmo tempo, ele sente que o deve.
Do pó viemos, para o pó retornaremos.
Ele não gosta e nem se identifica com religiões, muito menos com o cristianismo, mas adora a frase. É como se reconhecesse a insignificância da humanidade, a trivialidade, a liquidez da vida, ao fato de que o humano é uma coisa tão pequena quanto um grão de terra.
O garoto se sente pequeno ali, sob a imensidão daquele céu cinzento. Se sente pequeno. Tão pequeno quanto ele realmente é.
Per fecha os olhos assim que a chuva aumenta. Pensamentos desconexos passam por sua cabeça e o medo preenchendo o seu coração. Ele tem medo, é sim.
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O Violinista no Jardim
Romansa"É preciso ter caos dentro de si para dar à luz uma estrela dançante." Nietzsche. Per Yngve Ohlin tem alguns fascínios. Desde que foi considerado morto por 5 minutos e voltou à vida, ele é obcecado pela morte e todo aquele cenário gótico. Imerso na...