Capítulo 87

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CAPÍTULO 87

Maria Marta merecia viver o inferno em vida. Se não aprendesse pelo amor que sentira por Marcelo, teria que ser pela dor de ser chantageada por seu irmão demoníaco. Não valia mais a pena culpar-se ou procurar carmas nas deficiências de seus filhos. Ali estava seu grande castigo. Dali, a poucos metros, se concretizaria sua triste sina. A única motivação que lhe restara era tentar ser a mãe que nunca fora e impedir que Mikhael prejudicasse seus filhos. Ele era ardiloso e poderia transformar a vida dos sobrinhos em um inferno em poucos segundos. Eles não mereciam aquilo. Todo ele deveria ser herdado por sua mãe. Acabava-se ali a proteção lhe dada pelo único homem digno de tocar o seu corpo. Enterrava-se, de vez, seu sonho de servir inteiramente a Deus.

– Dizem as boas línguas que o casamento é o dia mais feliz da vida de uma mulher. Por que estás fazendo essa cara de múmia, minha querida noiva? – Debochou Mikhael.

– Uma múmia não pode fazer cara de quem ainda vive. – Respondeu a mãe de Eden.

– Se alegre, uma porcentagem ínfima da sua família veio acompanhar nosso casamento na Santa Igreja. – Constatou o vilão.

– Eu preferia que tivessem vindo acompanhar o meu enterro.

De fato, Maria Marta preferia que aquela reunião fosse seu enterro. Seu segundo casamento de fachada de nada se comparava ao primeiro: ela amava Marcelo, de um modo carnal e emocional, e casar com ele mesmo querendo seguir a vocação religiosa não fora um castigo.

Apesar de todo sofrimento que ela receberia (como o carma de uma possível redenção) o que mais lhe doía era a expressão de descontentamento de Eden. Ele não entendera como sua mãe estava se casando com uma pessoa que sempre desprezou. E não tinha o que entender mesmo. Talvez se Maria Marta tivesse entendido Eden, Marcelo ainda estaria vivo e seu processo de redenção seria bem menos doloroso.

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Gabriel não parava um segundo sequer na igreja e isso fazia Simonetta mais cansada do que o comum. Não que o golpe que Mikhael deu em sua tia tinha que sair completamente tranquilo, mas a virginiana precisava de paz naquele dia. Já era 17 de fevereiro de 2017 e, embora fosse o aniversário da concepção da pequena Olívia, também era o aniversário de dois anos do dia mais difícil da vida de Gareth.

– O tio Gare ainda está com raiva de você? – Questionou Eden. – Não faz sentido ele te deixar vir para o mesmo ambiente do Mikhael com uma criança hiperativa e uma bebê nascida se não tivesse com raiva de você.

Gareth tivera razão de ficar com raiva da esposa. Em um conluio com Simão, Simonetta convencera Gareth entrar em um programa de mestrado proposto pelo avô. Obviamente Gareth fez uma ligeira guerra sexual quando soube da "traição" da mulher, mas já estava apaixonado demais pela pós em Relações Diplomáticas para continuar com seu protesto.

– Não, não é isso, Eden. Hoje fazem dois anos que o vovô contou aquilo lá para o Gareth e a principal ponte para isso você sabe que foi o Mikhael, né? – Revelou a mãe de Olívia. – Ele preferiu manter as mãos dele longe de confusão. De qualquer modo eu só vim por você mesmo. Tudo isso que tá acontecendo não faz sentido nenhum pra mim.

– Imagina pra mim. Além de ter que me acostumar sem a força tranquilizante do meu pai, terei que proteger os meus irmãos das influências avunculares malignas. – Confessou o adolescente. – Ainda bem que eu tenho a Alasca cuidando de mim através da sua congelante magia do amor.

– Boa sorte e coragem, primo. Você vai precisar de muita. – Concluiu.

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Algumas coisas não faziam o menor sentido para Helionora, mas a psicóloga já se acostumara a enfrentá-las pelo bem de seus pacientes. A coisa mais sem sentido que ele já vira em seus 34 anos de vida estava diante de seus olhos e se resumia ao sim dito por Marta a Mikhael diante o altar. A segunda mais sem sentido foi Maria Marta marcar uma consulta com ela para pedir-lhe exclusivamente por cinto de castidade. Se o pouco de sanidade mental de sua irmã ainda tivesse sido mantida depois da morte de Marcelo, aquele cinto seria usado para impedir Mikhael de ter qualquer relação sexual com ela. A terceira e talvez mais intrigante era os olhares safados que o melhor amigo do Gareth direcionava a ela sempre que a capricorniana aparecia para visitar o irmão caçula. Porém, existia um fato que poderia fazer muito sentido na vida de outras pessoas, mas não faria nenhum sentido na sua.

– Eu ainda tinha esperanças que Maria Marta iria deixar as crianças com você, Helionora, e partiria para o convento conosco. Elas se acabaram agora. – Confessou Silvana à sobrinha.

– Não se preocupe, tia. Eu vou com vocês em breve para a Itália, mas não para um convento. Ficarei muito feliz em começar minha pós-graduação em TEA por lá. Não posso deixar o conhecimento se concentrar apenas nas mãos dos meus irmãos. É minha meta de vida: amenizar o patriarcado pelo menos na minha família.

– Jura que você não quer conhecer o convento conosco, querida sobrinha? – Questionou Cecilia. – Sei lá, essa sua perseverança em nunca ter namorado, apenas ter se dedicado à carreira... Será que não é a vocação religiosa que chama? Uma moça manter-se virgem até os 34 anos nesse mundo de hoje...

– Tia, por favor, não faça-me rir. Já fazem 19 anos em que não sou mais virgem. Inclusive, quando minha sobrinha mais velha nasceu eu já era bem experiente.– Contou. –  E eu vou confessar uma coisa: eu era muito mais experiente que a Maria Marta, que se manteve por quatro anos sem relações com o Marcelo mesmo casada. Se não fosse aquele castiçal eu juro que ela teria arranjado outra forma de ter filhos para não perder a virgindade até hoje. Isso é bem a cara dela.

– Isso me magoou profundamente, Liô. Pensei que você soubesse que a fornicação vai contra os valores da Santa Igreja Católica...

– Tia, eu não sou a Maria Marta, felizmente. – Respondera Helionora. – Eu preciso ir ao banheiro, já volto.

Helionora fora ao banheiro de fato, mas não pelo simples fato de fazer algumas de suas necessidades biológicas. Já faziam quase duas semanas em que o coração de Helionora quase saía pela boca diariamente. Sua última visita íntima a Américo fora a cerca de um mês e transa tinham milhares de adjetivos a se aplicar, menos cuidadosa. Nunca a menstruação de Helionora atrasara duas semanas e ela simplesmente não sabia o que falaria para a sua família se o que ela desconfiasse realmente fosse verdade.

"– Américo, por favor, eu preciso me encontrar com você de novo, urgentemente." – Digitara a psicóloga para o amante. –"É algo importante mesmo e não posso dar todos detalhes por uma mensagem. Com amor, Helionora."

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Sol em VirgemOnde histórias criam vida. Descubra agora