CAPÍTULO 16

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LUCAS

Poucos metros de distância da sede, na trilha ao norte, ficava aquele local de tanto valor à minha família. A terra batida era um pouco mais elevada, dando a inclinação perfeita para a vista de parte da fazenda. Sendo velados sob o céu estrelado, haviam duas cadeiras antigas, com uma cor de cobre e os assentos florais, forjados na época dos meus avós. Com cuidado, coloquei Rebecca na cadeira ao lado, ajudando ela a se cobrir. A noite trazia uma brisa suave e quase invernal.

Aquele lugar era marcado por grandes decisões na minha família. Gerações de Varez que decidiram o seu futuro ali, quase como um campo sagrado. Mas na nossa situação, o silêncio reinava. Eu me contentei em ter conseguido retirar a Rebecca daquele quarto escuro que ela se encontrava nas últimas semanas. Sentei ao seu lado, próximo para intervir a qualquer menção de alguma fraqueza ou tontura.

Rebecca olhava o céu, deixando transparecer alguma emoção que a tempos estava escondida no fundo daqueles olhos negros e opacos. Sua respiração foi ficando cada vez mais acelerada e eu vi as lágrimas escorrendo no seu rosto. Ela sentia dor, mas não parecia uma dor física, era como uma dor na alma. A minha primeira reação, quase como um instinto, foi segurar a sua mão e entrelaçar os seus dedos nos meus.

Passei um longo tempo ali, tentando transmitir naquele singelo toque a empatia necessária. Ela não retirou a mão, não se afastou de mim. Pelo contrário, apertou a minha mão com firmeza, como se aquilo fosse necessário a ela tanto quanto era para mim. Sua mão pequena e fina estava machucada com os medicamentos que ela havia tomado nos últimos dias. Soro vitaminado em uma vã tentativa de recuperação.

Não havia nenhum motivo para conversa. O clima estava tranquilo o suficiente para ficarmos ali durante mais alguns minutos, apenas admirando a beleza que Deus nos proporcionou. Porém, eu precisei iniciar uma conversa casual quando ela deitou o rosto no meu ombro. Não foi nenhuma maldade ou atitude egoísta, eu não me afastei. Recolhi bem o seu corpo próximo ao meu. Mas a necessidade de deixar aquela situação normal fez eu dizer qualquer coisa que veio na minha mente. Nesse caso, foi falar sobre o seu psicólogo.

- Acho que devemos mudar de psicólogo. - Disse a com a voz rouca, tentando ser firme no meu posicionamento.

- O que? - Ela pareceu não entender o que eu dizia.

Planejava explicar os motivos que eu não queria que ela continuasse aquele tipo de tratamento, mas ponderei em explicar apenas que haviam outras abordagens de profissionais ainda mais capacitados.

- Sua mãe disse que ele é especialista em pessoas... - Ela parou a frase no mesmo instante.

- Sim. Mas eu noto que depois de uma sessão você fica esgotada emocionalmente. - Comecei a argumentar, ignorando o fato que ela havia se distanciado e retirado a sua mão da minha. - No dia que o psicólogo mostrou como era essa terapia, que eu fiquei na porta, sendo obrigado a permanecer em silêncio enquanto assistia você chorar, percebi que não é esse tipo de abordagem a mais correta para o seu caso.

- Você entende de abordagem na psicologia? Eu não sabia que você tinha esse tipo de estudo. - Ela rebateu.

- Não tenho, mas eu só acho que... - Gaguejei, faltando argumentos. Suspirei pesado e entendi que aquela pequena batalha estava perdida.

- Fale, Lucas. Eu quero realmente saber o que você pensa sobre terapia.

- Não é sobre terapia e sim sobre o método empregado. Vocês só conversam sobre o passado? Sobre o Luan? Acha isso saudável? - Comecei a questionar.

- Está me fazendo bem e isso já deveria bastar. Acredito que o Marcos tenha razão, você também precisa falar sobre o Luan.

Rebecca tocou naquele ponto da ferida que eu não estava disposto a dialogar.

1. Curando Feridas ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora