CAPÍTULO FINAL

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LUCAS

A rotina em um hospital é intensa e cheia de surpresas. Há sempre alguém apressando o passo, ás vezes até correndo. Há sempre um profissional cansado, sentado em uma cadeira qualquer, e que logo é chamado para um atendimento e precisa esquecer todo o seu esgotamento e desempenhar a sua função. Há também o choro, que nem sempre é de tristeza. Você consegue notar de longe, quando o choro é a pura emoção de uma nova vida. Às vezes, é uma vida que está iniciando, ás vezes é uma vida que ganha uma nova chance.

No meio dessa agitação, há uma parte do hospital que existe uma calmaria. Essa pequena sala, que geralmente contém diversas cadeiras, é o exemplo perfeito do local de crença e esperança. A sala da família, geralmente tem um café quente, uma água gelada, algumas revistas que ninguém lê (apenas fica folheando em uma tentativa de controlar a ansiedade). Uma televisão ligada em um jornal local, onde ninguém está assistindo. E há também uma recepcionista, que possui um olhar sereno, foi contratada para estar na frente de pessoas que estão passando pelo pior momento das suas vidas, então a sua maior qualidade deve ser a empatia.

Você anota o nome do seu familiar, com a mão trêmula, fazendo uma letra quadrada, e depois recebe um adesivo que precisa ser colado na sua camisa, bem no peito, em um local visível, onde está escrito 'visitante'. Depois daquele momento, você senta em uma dessas cadeiras e espera pacientemente a sua vez.

A sala da família possuí uma peculiaridade, não importa o quanto o paciente esteja à beira da morte, os familiares de outros pacientes vão sempre te falar para ter fé que Deus vai restituir a vida. Aquele núcleo de mulheres com mais idade, que esperam notícias dos seus maridos ou de algum filho que acidentou de moto, quer sempre anotar o nome do seu familiar e enviar por mensagem para o pastor colocar no altar da oração da quinta-feira de noite. Não importa a sua religião, você sempre vai passar o nome completo do seu parente e agradecer a gentileza de um desconhecido se importar com a vida de alguém que você ama.

Nesse lugar temos a figura central da pessoa que está mais tempo ali. Por vezes é uma mulher forte, determinada, com olhar fixo na porta do acolhimento, onde o médico chama o familiar para conversar, e sempre têm consigo um crochê ou bordado na bolsa. Essa mulher é parente de alguém que está na UTI, entubado, por tanto tempo que chega a ser improvável que ele consiga escapar da morte. Essa mulher mexe freneticamente as mãos, fazendo o seu artesanato, enquanto conta histórias de superação que ouviu naquela mesma sala, fazendo os familiares, novos na sala, ter esperança que tudo acabará bem.

A porta da sala do acolhimento se abre e um médico chama o nome completo do seu familiar. Não há uma lista a ser seguida, mesmo que você anotou o nome primeiro para pegar o adesivo de visitante, o médico chama conforme a sua própria planilha. Você se levanta e vai em direção à porta aberta. Naquele momento, os demais familiares na sala já conseguem notar se a notícia é boa ou ruim, apenas pelo modo que o parente caminha até o médico. Se você andar com a cabeça levantada, olhos brilhantes e o peito subindo e descendo em uma respiração calma, significa que no dia anterior você teve uma boa notícia sobre o seu familiar e você espera que hoje também tenha. Mas se você levanta com os olhos fixos em um ponto qualquer, os ombros caídos e os olhos marejados, a boca entreaberta em um sinal de pânico, possivelmente as noticias do dia anterior foram ruins e você já espera mais notícias delicadas.

Você quer acreditar que a pessoa que você ama está se recuperando, você quer tanto ouvir que os exames estão melhorando, que ela está mais forte, que em poucos dias pode até sair do respirador. Mas há um ponto nos seus pensamentos que sempre te traem, é quando você lembra o motivo dela ter parado ali. Uma gravidez de risco, onde não havia a certeza que chegaria ao fim. Somado com um período de abstinência de drogas, regado de tentativas de cessar a própria vida. Por fim... um parto difícil, onde a mãe perdeu tanto sangue, que foi necessário diversas bolsas de doação para repor.

1. Curando Feridas ✔️Onde histórias criam vida. Descubra agora