REBECCA
A cada dia que passa, sinto que um descontrole se aproximando. Por vezes tentei ser racional, mas nem sempre isso era possível. Quando a razão fugia do meu alcance, eu transbordava naquele copo de lamentação. Deitada na cama, não tinha vontade de levantar, de agir, ou simplesmente de viver. Mas eu tinha noção disso, conseguia compreender exatamente a minha situação. Sabia até mesmo o que fazer para conseguir melhorar, mas mesmo assim eu não fazia.
Quando o dia passou arrastado e alguém se preocupou comigo, veio a tão esperada ajuda que o meu corpo e a minha mente necessitavam. Marcos chegou no fim daquela tarde, ouvi a sua voz no corredor, bem próximo do meu quarto. Virei para o outro lado, talvez fingiria dormir. Conseguia ouvir a dona Rosa conversando com ele, ela dizia algo sobre estar preocupada comigo e com a bebê.
Nesses últimos dias, dona Rosa se dividia entre os afazeres na própria casa em Cuiabá e a gerência da Fazenda Ametista até ser repassada para a esposa do senhor João Varez, o novo líder daquela família. Isso estava consumindo todo o seu tempo, então eu conseguia me desvencilhar das suas tentativas de conversas constantes.
- Rebecca, posso entrar? - O psicólogo disse sem esperar nenhuma resposta, ele simplesmente entrou, acendeu a luz e ignorou o meu protesto.
- Desliga. - Disse ríspida.
Marcos sentou na única poltrona no quarto e abriu um pequeno caderno, que ele fazia algumas anotações.
- Doutor, eu não quero ficar falando como eu estou me sentindo, não quero dizer como foi o meu dia e nem sobre qualquer coisa relacionada a minha vida. Só quero ficar mais tempo aqui deitada, tem como o senhor e a dona Rosa entender e respeitar isso?
- Eu não pretendo te perguntar nada nesse sentido. - Ele fechou o caderninho.
Retirei o travesseiro do rosto e o encarei. Aquilo aguçou a minha curiosidade. Não importa o quanto a depressão era latente, eu sempre conseguia deixá-la de lado por alguns segundos se algum foco aparecia.
- Então como vai ser essa sessão? - Tentei descobrir.
Ele retirou o óculos de leitura, apertou os olhos e olhou para a janela. A lua estava enorme naquela noite e isso chamava atenção de qualquer um, menos daquele psicólogo estranho, que preferia encarar a papelada jogada na mesinha da janela.
- O que são esses papeis? - Agora era ele que estava curioso.
- Eu tentei ir atrás de uma antiga história dessa família, mas não estou tendo sucesso. Longe disso, a minha busca está me frustrando. Parece um quebra-cabeça sem fim. Essas folhas soltas e rasgadas não parecem fazer nenhuma lógica. - Desabafei a minha frustração.
- É uma história importante para você?
Aquela pergunta me pegou desprevenida, como explicar que aquela história era o motivo da minha sanidade mental nesse atual cenário? Como dizer para aquele psicólogo que esse quebra-cabeça angustiante era uma barreira enorme para eu não procurar uma fuga rápida para todas as minhas frustrações através do vício?
- Sim. - Respondi, apenas isso. Pois eu não conseguia explicar o que era aquela história na minha vida. Mas ele pareceu entender, balançou a cabeça diversas vezes, como se a minha resposta silenciosa fosse audível.
Ele continuou olhando as folhas, levantando algumas, deixando outras para o lado.
- O Lucas quer que eu te ajude com o que você precisar.
Sentei na cama e o encarei séria. Não conseguia compreender como o Lucas, mesmo estando sei lá onde, ainda queria mandar na minha vida.
- Eu não preciso de ajuda.
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1. Curando Feridas ✔️
Random"Rebecca entrou na minha vida em uma noite de tempestade. Na primeira vez que eu a vi, eu sabia que ela me marcaria por toda a eternidade. Foi através dela que o meu irmão, o meu melhor amigo, conheceu o mundo mais sombrio e solitário que existe: as...