Capítulo 31

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Meu coração parecia querer sair pela minha boca. Ela abriu e fechou a boca várias vezes. Não sei se buscando uma resposta, ou se estava surpresa, ou se ela não sabia o que dizer até que o pager dela disparou.

Nat: Meu paciente está em parada. – saiu correndo. Continuei sentada ali pensando em tudo aquilo e sem reação. Começamos rápido demais e eu acho que a assustei. Ela estava insegura. E por que não estaria? Eu também estou. Não tenho dúvidas do que eu estou sentindo por ela, porque eu sinto cada vez mais, mas acho que a rapidez com que tudo aconteceu a deixou insegura. Logo voltei para dentro do hospital fui me preparar para a cirurgia da criança que eu tinha marcado a alguns dias. Depois de 7 horas meus ombros pesavam, eu estava um pouco cansada aquele dia.

Eu: Alguém traz um banquinho pra mim, eu preciso aliviar o peso do meu corpo. – logo colocaram um banco pra mim e eu me sentei. Me deram um pouco de água também. O tumor da criança era igual ao tumor da Emilly e no mesmo lugar, a diferença era a idade e o tamanho do ser humano. Depois de mais 3 horas eu consegui retirá-lo. – Consegui. Margens limpas. Checa as pupilas e os reflexos por favor... – checaram.

XX: Pupilas reativas, e reflexos ok.

Eu: Ótimo... Vamos fechar. – eu o fechei e sai... Entre começar e terminar foram 11 horas de cirurgia. Agradeci a todos e fui falar com os pais.

XX: E então, como nossa filha está?

Eu: Ela está bem. A cirurgia foi ótima, ela está com reflexos, as pupilas estão reativas. Ela foi para a UTI agora, vai ficar em coma induzido por 72 horas, foram 11 horas de cirurgia, ela precisa descansar. Daqui a pouco uma enfermeira vem buscar vocês dois para vê-la. Só os dois poderão vê-la e bem rápido ok? Só teremos a dimensão de tudo daqui alguns dias quando ela acordar, mas o tumor foi totalmente retirado, com boas margens.

XXX: Obrigada... Obrigada... – a mãe me abraçou forte.

Eu: Por nada – sorri. A família toda veio me cumprimentar. Eu dei mais uma passada na UTI antes de ir embora, para ver o exame pós operatório dela. Chamei os pais que estavam lá e mostrei a eles. Ela ficaria bem.

XX: Doutora, porque não desistiu dela? Desculpa perguntar, mas é que eu como mãe já estava perdendo as esperanças porque ninguém queria operá-la, estavam com medo de mata-la. – sentei com os dois.

Eu: Minha ex mulher, tem um tumor igual a esse, exatamente do mesmo tamanho e no mesmo local que a filha de vocês. As únicas pessoas no Rio de Janeiro que poderiam tirar esse tumor dela seria eu, ou a doutora Diorio. Eu quis pegar o caso, porque eu sou mãe, eu tenho uma filha com essa mulher e ela pode não sair viva dessa cirurgia e eu não posso operá-la pelo nosso grau de intimidade, então a ética médica não me permite, até porque as emoções não deixariam. E minha filha vai sofrer muito se ela perder a mãe. Minha ex mulher é minha melhor amiga, e eu vou sofrer muito se eu perde-la também. Mas ela tem três opções, ou ela opera, ou ela morre em alguns meses, ou ela morre na cirurgia. Ela arriscou a vida dela por anos no Afeganistão e no Iraque no Exercito Americano e eu também. Ela é médica como eu. Se existe uma chance de viver, a gente vai lutar. Sua filha tinha duas opções, pela idade e fragilidade dela, ou ela morreria em um ou dois meses pelo tumor e com muito sofrimento, ou ela morreria na mesa de cirurgia.

XXXX: Ela não tinha escolha, nossa filha morreria de todo jeito querida.

Eu: Sim. Mas ela tinha um fio de esperança nessa cirurgia, e ela quer viver. A minha parte eu fiz da melhor maneira possível com todo o meu conhecimento e com o conhecimento dos meus colegas de trabalho, e de toda a equipe por trás de mim, cada auxiliar, cada instrumentador, cada técnica de enfermagem, cada pessoa que fez essa cirurgia ser possível. A minha parte eu fiz, a dela, com certeza ela está fazendo que é lutar por essa chance, e a de Deus, Ele também está fazendo. Ela tem reflexos, ela está responsiva, e como viram não tem mais tumor, o que vier depois disso se ela sobreviver que é o que esperamos porque ela está estável, é só lucro. Por que ela não viveria mais um mês com aquele tumor do jeito que estava a maltratando. Eu não posso com as minhas mãos salvar a mãe da minha filha, mas eu podia salvar a filha de vocês e eu acho que consegui e isso é gratificante demais pra mim.

XXX: Obrigada doutora... Obrigada por tudo... – me abraçou.

Eu: Por nada... Vamos ser positivos, vamos torcer, vamos pedir a Deus. Médicos costumam ser céticos, mas eu acredito no Médico dos médicos. Eu vou pra casa, qualquer coisa a doutora Diorio estará aqui. Vão pra casa, se alimentem, descansem, ela está em boas mãos.

XXXX: Obrigado. Vamos torcer pela sua ex esposa.

Eu: Obrigada. Muito obrigada, eu a Emilly e a nossa filha Bella agradecemos. – os abracei e passei na sala da Diorio.

Diorio: Oi... Já está indo?

Eu: Sim.

Diorio: A cirurgia foi brilhante.

Eu: Eu fiquei com medo, mas deu tudo certo, ela está bem.

Diorio: Estou vendo os exames dela pos operatórios, ela tá perfeita.

Eu: Graças a Deus. Fica de olho nela qualquer coisa me liga.

Diorio: Pode deixar. Gravou a cirurgia?

Eu: Sim.

Diorio: Eu vou assistir, afinal, sou eu quem vou operar a Emilly. – sorriu nervosa.

Eu: Vai dar certo. – pisquei pra ela e fui embora. Cheguei em casa e ouvi uma discussão. Eram 4 vozes. – O que é isso? - Fui na sala de vídeo e tinham 4 unicórnios batendo boca. Apertei os olhos e pensei "acho que o laser da cirurgia me deixou meio chapada". Natalie, Betina, Emilly e Bella brigando.

Bella: Vamos assistir Greys Anatomy.

Emy: Mas você já viu todas as temporadas. Eu quero ver A Maldição da Residência Hill.

Nat: E eu quero ver A Maldição da Mansão Bly.

Betina: E eu quero ver Arraste-me para o inferno.

Eu: Tá amarrado – fiz o sinal da cruz. – O que está acontecendo aqui, e porque estão todas vestidas de unicórnio?

Nat: As meninas vão matar aula amanhã, e a gente vai ver filme se a gente conseguir decidir qual vamos ver.

Eu: A quanto tempo estão discutindo isso?

Emy: 3 horas e meia mais ou menos.

Eu: Vocês não vão chegar a lugar nenhum, vocês sabem né? Eu vou tomar banho eu fiquei 11 horas em cirurgia eu estou morta.

Nat: VOCÊ NÃO VAI DORMIR HOJE NÃO. – gritou um tanto desesperada. Eu tenho certeza que eu fiquei um tomate de vermelha.

Bella: Gente do céu – riu.

Emy: Minha filha tem 15 anos tá amiga, pega leve – segurou a risada.

Betina: Nossa mãe, que desespero. - riu.

Nat: Cala a boca Betina. – falou entredentes – Isso saiu, mais alto e com mais intensidade que eu esperava. A gente precisa conversar, eu te deixei falando sozinha mais cedo e quando eu sai da cirurgia você estava operando, fiquei duas horas na sua galeria mas tive que ir embora.

Eu: Tá bom. Vamos subir.

Betina: Isso é pra você... – jogou um roupa de unicórnio.

Eu: Não... Eu não vou vestir isso não...

Bella: Vai...

Emy: Eu estou morrendo...

Eu: Você não tá morrendo... – apontei pra Emilly.

Emy: Vou pedir pizzas pra gente, não demora, transem mais tarde vamos ver o filme primeiro.

Eu: Cala a boca Emilly... – subi e a Natalie subiu comigo. Tirei a minha roupa e entrei no chuveiro e ela entrou no banheiro se sentando na beira da banheira e ficou uns 10 minutos me observando no chuveiro sem dizer nada.

NATIESE EM: AMOR A PRIMEIRA VISTAOnde histórias criam vida. Descubra agora