Capítulo 39

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Eu me sentia mal, sentia um vazio enorme dentro de mim. A Pri não falava nada, não comia, ela só brincava com a comida. Todos conversavam sobre coisas triviais como se nada estivesse acontecendo, e os olhares de pena me matavam. A Manu deu um grito jogando purê de batata com molho de carne moída pra todos os lados que chamou a atenção de todo mundo a Priscilla levou um susto.

Pri: Meu Deus filha, você ainda vai me matar do coração – a Manu gargalhou e todo mundo começou a rir e eu ri também por um instante. – Você é muito sapeca minha filha. – A Manu deixava o clima muito mais leve por incrível que pareça. – Tá cheia de purê de batata e massa de tomate no cabelo. E eu também... Vamos nos limpar vem... – a pegou e subiu com ela.

Mãe: Ela não está sabendo lidar.

Patrícia: Não.

Leandro: Não é fácil perder um filho.

Eu: Não é fácil perder um filho. Disse a pessoa que nunca perdeu um. Não é fácil viver com esse olhar de piedade em cima da gente também. Porque parece que eu fui uma péssima mãe para o meu filho. – sai da mesa irritada. Eu me sentia culpada.

Leandro: Natalie... Filha...

Deborah: Natalie... – eu subi. Eu queria que esses dias passassem logo e que todos fossem embora. Priscilla cuidou da Manu e ela passou o dia assim. Cuidando da Manu brincando com ela. Ela criou uma bolha que só ela vivia ali. Ela estava tão no automático para lidar com tudo que eu não sabia se isso era bom ou ruim. No dia seguinte todos estavam em casa. Após o almoço a moça do cerimonial ligou lá em casa, a Priscilla atendeu.

Pri: Alô? Sim é ela. Oi Senhora Farrel... Ok... – suspirou. – Muito obrigada. – falou com a voz embargada e desligou.

Eu: O que foi?

Pri: Amanhã as 7 da manhã, na capela do Cemitério Holy Hood é a 10 minutos daqui. O enterro será após a missa, as 15 horas.

Eu: Tá...

Pri: Vou lá embaixo avisar todo mundo. – ela saiu do quarto e logo voltou entrando no closet. Eu fui atrás. – Preciso de um sobretudo quente, vai nevar amanhã. – ela olhava a parte de sobretudos dela e tirou um preto bem quente, deixou pendurado na arara, pegou um par de botas pretas de salto, uma boina preta, uma calça legging térmica e uma camisa térmica para colocar por baixo, deixou tudo separado. Eu peguei um sobretudo preto também, deixei tudo separado. Não falamos nada. Não existiam palavras. Aquela noite nós não dormimos. Esses dois dias sem duvida foram os mais longos das nossas vidas. Priscilla estava se fechando ainda mais, estava bem deprimida, chorando muito, calada, quase não comia e isso me preocupava. Meu cunhado ia dirigir o carro da Pri, e nele iria eu, ela, o Felipe e a Leticia. Dividimos os carros para caber todo mundo e logo chegamos lá. Eu me senti jogada no chão quando vi meu filhinho. Ele parecia um anjinho, como se tivesse dormindo. Eu o beijei e me sentei ao seu lado. O livrinho do cerimonial ficou lindo as pessoas do hospital começaram a chegar, eram amigos da Pri, algumas pessoas do abrigo que ela ajuda também chegaram e nos cumprimentaram. Ela abraçou uma garota e chorou muito, ela deveria ter uns 12 ou 13 anos, ela era a Jasmine a menina que ela cuidou por um tempo, a mãe da menina também estava lá. Foi uma manhã muito longa e um inicio de tarde também. Priscilla não parecia estar ali, ela estava se segurando não sei como. Logo a tarde começou e com ela a missa que foi linda. Um padre super carinhoso, com palavras lindas para o nosso filho e para nós duas. As 15 horas os sinos tocaram, era a hora do adeus. Meu coração foi esmagado aquela hora. Tinha sol aquela hora, tinha nevado a manhã toda e na hora do almoço o sol apareceu e deixou o dia bonito, mas não dentro de nós. Nosso filho foi enterrado ao som de Amazing Grace e as lágrimas da Priscilla caiam dolorosas, silenciosas e fomos pra casa, ainda tinha a recepção e quando chegamos tinha lanchinhos, bebidas em casa. Os costumes americanos prolongando o sofrimento. Depois de 2 horas todos foram embora finalmente. Priscilla e eu tomamos um banho e deitamos, precisávamos dormir. Tomamos um remédio e apagamos. Acordei já era noite, a casa estava silenciosa, a Manu estava dormindo, abrimos a geladeira tinha comida do jantar, a Pri desceu também, eu esquentei para nós duas e comemos.

Pri: Eu não quero mais... Eu não consigo – começou a chorar. – Eu quero meu filho – soluçava.

Eu: Amor, precisa se alimentar.

Pri: Não dá, não desce... – eu insisti e ela foi comendo aos poucos. – Eu não consigo viver sem ele, eu não vou conseguir – soluçava. Seu choro era tão pesado, tão doloroso. Era o choro que ela segurou nos últimos três dias. Eu sentia uma culpa absurda dentro de mim. Eu tirei dela a convivência com ele. Eu poderia ter dado mais tempo a ela. Logo terminamos escovamos os dentes e deitamos de novo e dormimos exaustas. A missa de sétimo dia aconteceu depois de 4 dias do enterro, a Liz já tinha ido embora, ela tinha que trabalhar. No dia seguinte da missa, todos foram embora. Uma parte foi de manhã, outra após o almoço e outra a noite. Nossa casa enfim estava vazia.

Eu: Agora somos só nós três... – Falei me sentando no sofá com a Manu mamando no peito.

Pri: Sim, somos nós três... – suspirou...

NATIESE EM: ENTRE O AMOR E O ORGULHO - RECOMEÇOS.Onde histórias criam vida. Descubra agora