Capítulo 1: Depósito de Sangue.

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O deserto de Solaris era extenso, cheio de vilas perdidas entre a areia dourada. Nunca em 267 anos, o tempo que eu lidero tudo isso, fomos atingidos por uma tempestade de areia tão violenta.

Mas andando pelas ruas de Solaris, vendo as casas repletas de areia e pessoas procurando por familiares desaparecidos, me fazia ter certeza que algo estava muito errado por ali. Além disso, tivemos a primeira noite sem estrelas no céu. E eu não fazia ideia do que isso significava.

—Srta. Aziz? —Breno chamou, me fazendo encolher os ombros. Continuei andando, desviando das pessoas pelo caminho, tentando chegar o mais longe possível dele, para que o mesmo não me alcançasse. —Srta. Aziz?

—Perdão, senhora! —Desviei de uma senhora humana, que me olhou de cara feia quando pisei nos seus pés. Meus passos ficaram um pouco mais rápidos e eu tentei disfarçar, ajeitando o lenço nos meus cabelos negros.

—Srta. Aziz? —Breno chamou de novo, parecendo prestes a ter um ataque de nervos, enquanto ainda me seguia. —Sei que está me ouvindo! —Acusou, me fazendo fechar os olhos com força. —Pare já aí!

—Eu estou com pressa, Breno. Não sei se percebeu, fomos atingidos por uma tempestade de areia e existem muitos problemas a serem resolvidos em Solaris. —Afirmei, olhando por cima do ombro, vendo que ele já estava me alcançando. Isso me fez engolir em seco e parar de andar, já que não teria como fugir dele.

—É exatamente sobre isso que quero perguntar. O que diabos aconteceu ontem a noite? Nunca em séculos fomos atingidos por uma tempestade de areia. Alguma coisa de errado você fez! —Resmungou, me fazendo morder o interior da bochecha, para não falar nada ofensivo.

—Bem, estou tentando descobrir o que aconteceu. E ficar parada conversando com você, não vai ajudar em nada, sabia? —Afirmei, vendo ele curvar os lábios em desaprovação.
Seu cabelo loiro estava arrumadinho para trás, enquanto os olhos esverdeados estavam curvados de forma acusatória na minha direção.

Breno era um mestiço, filho de uma bruxa com um humano. Nasceu aqui em Solaris e é um maldito fofoqueiro, assim como adora ser ranzinza e desagradável com qualquer um que passa pelo seu caminho.

—Sempre soube que você faria alguma merda algum dia. Uma fêmea liderando o círculo do deserto? —Ele soltou uma risadinha. —Estava na cara que não daria certo.

—Vou ignorar o machismo no seu comentário, Breno, pra nos poupar de mais uma discussão. Agora, se me der licença. —Abri um sorriso simpático pra ele. —Tenho problemas para resolver e uma cidade para administrar.

—Argh! —Ele saiu pisando duro, falando com as pessoas que passavam ao seu redor. —Por isso eu odeio deuses inferiores. Sempre tentando ser mais do que são!

Encolhi meus ombros, sabendo que parte das bruxas e dos vampiros ali pensava o mesmo. Humanos não se importavam de ter deuses inferiores administrando suas terras. Mas bruxas e vampiros odiavam com todo seu coração. Ou melhor dizendo, elas me odiavam.

—Problemas com Breno de novo?

Tombei a cabeça de lado, abrindo um sorriso e me virando para meu irmão, vendo ele se aproximar, com uma expressão cansada, de quem não havia dormindo nada na última noite.

—Ele só estava destilando seu veneno de novo. —Dei de ombros, vendo Cal fazer uma careta. —Já estou acostumada com isso.

—Ah, mesmo assim, é um saco ter que aguentá-lo. —Cal se aproximou, tocando meu cotovelo e me puxando para andar. —Já te disse que deveríamos prendê-lo.

—Sabe que eu não posso fazer isso. —Afirmei, vendo ele rir. —Ele não quebrou nenhuma regra importante. É apenas um fofoqueiro desagradável. —Estendi a mão, vendo ele encolher os ombros. —O que tem pra mim.

Ele me entregou os papéis, curvando os lábios de uma forma resignada. Cal era um ano mais novo que eu. Tinha a pele morena iluminada, com os mesmos olhos dourados como ouro que eu tinha. Com um suspiro pesado, comecei a ler a lista de problemas que tínhamos.

—42 pessoas desaparecidas até agora. Um vampiro atacou um humano no meio da tempestade, agora temos um transformado sem controle e uma família irritada para lidar. —Cal afirmou, enquanto eu sentia que iria entrar no meu pior pesadelo nas próximas horas. —E... Tallys atacou o depósito de sangue de novo.

—O que? —Murchei, olhando para Cal, vendo ele balançar a cabeça afirmativamente. —É a terceira vez só essa semana!

—Eu sei. E eu já te disse, conversar com ele não resolve em nada. Você deveria tomar alguma providência. —Cal afirmou, enquanto nos aproximávamos do palácio do sol.

—Quer que eu o prenda também? —Ironizei, vendo ele me olhar com uma expressão séria. —Ei, tudo bem. Vou ver o que posso fazer, está bem?

—Claro. Ele já está na sua sala esperando. —Murmurou, me fazendo pressionar os lábios uns nos outros, tentando conter o suspiro frustado.

Passamos pelas pilastras que formavam o arco do palácio, subindo os cinco degraus até entrarmos no grande salão dourado. Meri já estava me aguardando, com seu longo vestido vermelho e dourado circulando as curvas do corpo esguio e o lenço da mesma cor escondendo os cabelos castanhos. Ela era, assim como eu e Cal, uma deusa inferior.

—Me diga, por favor, que ainda não estão aqui. —Pedi, vendo ela morder o lábio e negar com a cabeça, coisa que me fez soltar o ar com força de alívio e arrancar uma risada da mesma.

—Não, mas a família do humano transformado está te esperando na sala das águas. —Afirmou, fazendo o sorriso que estava no meu rosto morrer. —E eles estão muito irritados.

—Tudo bem. Vou tentar resolver o máximo de problemas possíveis antes da reunião do círculo do deserto. —Me virei para Cal, abrindo um sorriso pidão. —Pode resolver a questão da família, enquanto eu converso com o Tallys?

Cal revirou os olhos, erguendo a mão e apertando minha bochecha, antes de se dirigir a sala das águas. Olhei de novo para Meri, vendo ela arquear as sobrancelhas. Balancei a cabeça negativamente e me dirigi as escadas, até atravessar os corredores e chegar a minha sala.

Fiz um aceno com a cabeça para os dois guardas humanos que estavam postos nas amplas portas de madeira, antes de abri-las e entrar na minha sala. Era uma sala repleta de portas de vidro que davam para uma varanda, com uma visão perfeita da cidade e do deserto no horizonte. As cortinas eram num tom azul claro, como as águas claras que encontrávamos no território de Montear. O tapete no chão, dourado e vermelho como o sol.

E ainda havia minha mesa, colocada no centro de tudo, onde um vampiro irritante estava sentado atrás dela, na minha cadeira, no meu lugar. Parei no meio do caminho, arqueando as sobrancelhas para o mesmo.

—Tallys Kildert! —Murmurei, vendo ele abrir um sorriso muito, muito grande.

—Olá, amor. —Ele colocou o cotovelo na mesa e escorou o rosto na mão fechada. —Juro por tudo que é mais sagrado que não fiz nada do que estão me acusando.

Revirei meus olhos e acenei com a cabeça para que ele saísse do meu lugar. Tallys soltou uma risadinha e fez o que eu mandei, ficando de pé e puxando a cadeira para que eu me sentasse.

—Só estava guardado o lugar pra você. —Afirmou, deixando um beijo na minha bochecha quando me sentei, antes de girar na mesa e puxar a cadeira do outro lado e se sentar. —E então, quais as novidades?

—Cal quer que eu mande prender você. —Comentei, vendo o sorriso no rosto dele morrer, enquanto seus ombros se encolhiam. Isso fez um sorriso surgiu nos meus lábios.



Continua...

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