—Aqui é o centro do meu comando. —Stella afirmou, enquanto entrávamos na construção antiga de três andares. —Sou mais do que a capitã de um navio. Aqui no mercado negro, a economia gira em torno de vários grupos de contrabandistas. Eu sou a líder de um deles.
Passamos pela porta, onde alguns homens estavam de guarda e acenaram para Stella. O lugar se abriu em um bar, cheio de pessoas bebendo e jogando, enquanto fadas de cabelo rosa serviam bebidas e uma música alta tocava. A maioria acenava para Stella com respeito quando ela passava e nós a seguíamos. Em uma das paredes laterais, eu podia ver o mesmo desenho de uma cabeça de furão, com as estrelas ao redor.
—Aquele é o seu símbolo? —Indaguei, me aproximando mais dela, já que a música estava alta demais. —Um furão por causa do Lori? —Ela se virou e sorriu pra mim, assentindo. Fiz uma careta e toquei minha camiseta por dentro da jaqueta, sentindo a silhueta do objeto que Cal havia me dado. —Cal é líder de um grupo de contrabandistas?
—É, isso aí. —Ela sorriu mais ainda. —As raposas do deserto, Alita. Não sei o que pensa sobre isso, mas se eu fosse irmão desse cara, teria muito orgulho dele.
Apertei o objeto preso na minha camisa, lembrando do símbolo da raposa com as armas atrás. Stella nos guiou pela lateral do balcão do bar, até uma escada. Dois andares depois, estávamos em um corredor cheio de portas.
—Escolham seus quartos a vontade. O meu é o último no final do corredor a direita, junto com meu escritório. —Stella gesticulou na direção certa. —Como meus convidados, vocês não precisam pagar pelas bebidas e nem pelas fadas do sexo. —Ela ergueu uma das sobrancelhas, com um sorriso pequeno nos lábios. —Fiquem a vontade, tenho que resolver algumas coisas para poder colocar vocês dentro do palácio de Montear.
Ela se virou e desapareceu no corredor. Abri a primeira porta ao meu lado, vendo Lila e Tallys fazerem o mesmo. Olhei para Jacks, vendo que ele ainda estava parado no corredor, olhando para o nada.
—O que foi? —Indaguei, fazendo ele erguer os olhos pra mim. Jacks curvou os lábios em pura reprovação e eu tinha quase certeza que ele estava pensando em formas diferentes de me matar, já que o brilho nos olhos prateados era de pura indiferença.
—Vou dar uma volta. Tem magia demais nesse lugar. —Ele passou por mim, quase me derrubando no caminho por conta das asas. Mordi a língua para não xingá-lo por isso e o observei ir até as escadas. —Se precisar de mim, é só gritar.
—Aposto que você iria adorar me ver gritando de dor. —Afirmei, podendo jurar que vi a sombra de um sorriso no rosto dele, quando o mesmo me olhou por cima do ombro.
—Eu iria gostar se fosse eu a fazê-la gritar. —Jacks desapareceu, com as palavras deixando o ar carregado de promessas.
[...]
Observei o furão de olhos imensos se ajeitar no colo de Stella, tendo os pelos brancos sendo acariciados por ela. Ele aparecia com a mesma velocidade que ia embora, sempre voltando com alguma coisa entre os dentes para entregar a Stella.
—A ideia é essa. Amanhã a noite saímos do mercado negro e voltamos para Montear. Temos que tomar cuidado na cidade, tanto em terra quanto em água. —Stella encarou o mapa da cidade principal de Montear. —Meus homens vão nos colocar dentro do palácio. O problema é sair depois, caso alguma merda aconteça.
—Qual o problema com a água? —Tallys indagou, se curvando na mesa para encarar o mapa.
—Sereias. —Respondi no lugar de Stella. —Acredito que os lobos também são um problema. Podem nos farejar com facilidade.
—Posso cuidar deles quando a isso. —Tallys olhou pra mim e deu de ombros. —Mantenho-os distraídos, enquanto vocês falam com Sallow. Ou... —Ele hesitou, mas olhou para Stella, parecendo conter a respiração. —Você precisa que eu faça outra coisa? O plano de entrar lá é seu então...
—Pode fazer como quiser. —Stella o cortou, de uma forma um pouco grosseira. Tive quase certeza que vi Tallys se encolher ao meu lado, antes de seus ombros ficarem eretos e rígidos.
—Ótimo, então. —Ele olhou pra mim e sorriu. —Vou tentar dar tempo a você. Mas se precisar...
—Você vem correndo me salvar. —Completei, arrancando uma risada dele.
Tallys deixou um beijo no topo da minha cabeça e saiu da sala, falando algo sobre procurar Jacks e precisar de sangue. Não sei ao certo como os dois estão se entendendo, mas Jacks pareceu se tornar o novo deposito de sangue de Tallys,
—Você foi um pouco... grosseira com ele. —Comentei, escutando uma risada de Stella. —Ele só estava querendo ajudar.
—Ele pode ajudar. Eu disse, ele pode fazer como quiser. Só preciso colocá-la lá dentro. —Stella deu de ombros. —Estou ajudando você por causa de Cal, Alita. Não estou aqui para ser gentil e amável.
—O que Cal fez para você ser tão agradecida a ele? —Indaguei, vendo os dedos dela pararem de acariciar o furão, quando seus olhos se ergueram na minha direção e me fitaram sem qualquer humor.
—Isso não é da sua conta. —Afirmou, voltando a atenção para Lori, como se eu não fosse nada.
—Você conhecia um Yatori?
—Isso não é da sua conta. —Repetiu, ficando de pé. Lori saltou para cima da mesa na hora, esbarrando em algumas e derrubando papeis no chão. Ergui as sobrancelhas quando Stella me encarou nem um pouco feliz. —Vou te ajudar, sua única obrigação é não fazer perguntas sobre minha vida. Não somos amigas, Alita. E nunca vamos ser.
Ela parou de falar, olhando por cima do ombro para a janela aberta, por onde Jacks acabará de passar, com meu lenço deslizando pelas asas negras quando elas se fecharam atrás dele. Seus olhos viajaram de mim para Stella, como se soubesse que não estávamos nos entendendo.
—O seu cão de guardas apareceu. —Stella zombou. —Fez um acordo com ele? —Quando não respondi, ela riu. —Não sei se você é esperta ou burra.
—Ele veio aqui quando você resolveu ser uma babaca, não é? Então eu me considero esperta por ter conseguido a lealdade dele. —Dei de ombros, vendo os olhos dela se fecharem por alguns segundos, como se estivesse absorvendo minhas palavras. Mas então ela simplesmente virou as costas e cainhou em direção a porta adjacente, onde ficava seu quarto. Observei ela abrir a porta e me lançar um olhar infeliz e irritado.
—Fingir que ele não existe, não vai fazê-lo ser menos real. —Olhei para Jacks, vendo que as palavras dele eram direcionadas a Stella. Os lábios dela tremeram quando ela hesitou em fechar a porta.
—Não sei do que está falando. —Retrucou, quase como um rosnado.
—Sou um ser ligado a magia. Eu sei que ele existe e você também sabe. —Ele parou ao lado da cadeira onde eu estava sentada. —Não pode fugir para sempre, sabia?
Stella encarou Jacks por alguns segundos e então bateu a porta com força, deixando uma tensão horrível no ar. Olhei para o peregrino com as sobrancelhas erguidas, esperando que ele me explicasse o que tinha acabado de acontecer ali.
—Não me obrigue a contar, Alita. —Ele me puxou pelos ombros, me obrigando a ficar de pé. —Você precisa dormir e eu também, então por hoje já deu.
—Eu não sou criança. —Rebati, afastando as mãos dele de mim. —Tenho certeza que sou mais velha que você, inclusive.
Jacks revirou os olhos.
—Não é uma criança, mas é tão irritante quanto uma. —Ele apontou para a porta. —Vai dormir, ou eu mesmo levo você e a amarro na cama, com a boca amordaçada.
—Gostaria de vê-lo tentar. —Chiei, marchando em direção a porta furiosa, com a risada dele me seguindo. —Odeio você!
—Tenho certeza disso. —Cantarolou, me fazendo xingá-lo ainda mais.
Continua...
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Os Domínios do Deserto
FantasyNas terras do continente Esmeralda, muito se fala sobre os deuses capazes de ditar os dias e as noites, controlando o sol, a lua e as estrelas. Mas outros seres caminham por aquelas terras, reverenciando-os e convivendo com os deuses inferiores, que...