Capítulo 37: Atlantis.

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Olhei para Stella por um longo tempo, tentando decidir se estaria pisando em uma área perigosa ao perguntar do que ele a salvou. No fundo, tinha medo de saber o que era. Alguma coisa na expressão dela deixava claro que não era bom. Não era uma história feliz.

Antes que eu decidisse, nossa atenção foi para o céu, acima da copa das árvores. A sombra de algo passando sobre nós. Não demorei a reconhecer as longas asas negras de Jacks. Olhei para Stella, ficando de pé ao mesmo tempo que ela. Como tínhamos certeza que Jacks não nos viu ali, corremos na direção que ele voava, provavelmente oposta ao do mercado negro.

A floresta virou um borrão ao nosso redor enquanto tentávamos desviar das árvores, galhos e arbustos no chão, correndo tanto que minha garganta começou a se fechar e meus olhos lacrimejaram. Vi o momento que Jacks desceu para o chão, para o meio da floresta em algum ponto a nossa frente. Olhei para trás apenas para ter certeza de que Stella ainda estava me seguindo.

Deslizei na grama e quase desabei no chão quando surgimos aonde eles estavam, com Lila erguendo a arma e apontando pra mim. Ela abaixou no mesmo segundo, parecendo se encolher de alívio. Tallys estava sentado no chão, olhando para um ponto atrás de mim, para Stella, enquanto Jacks olhava diretamente pra mim.

—Vocês estão bem? —Indaguei, engolindo em seco. Lila balançou a cabeça afirmativamente, desabando no chão.

—Como saíram de lá? —Jacks indagou, sem desviar os olhos de mim.

—Túneis subterrâneos. —Stella passou as mãos pelos cabelos, tentando arruma-los, enquanto se escorava em uma árvore. —Mas ainda tivemos um encontro interessante.

—Tallys, lembra do que aquele cara disse na prisão? —Ele olhou pra mim, erguendo as sobrancelhas. —As criaturas atacam tudo aquilo que se move. Não entendi o que ele queria dizer aquela vez. Mas entendo agora. —Respirei fundo, ajustando o lenço ao redor do meu pescoço. —Elas não são cegas, mas também não enxergam direito. Usam o movimento para caçar. Eu e Stella encontramos um deles. A criatura passou na nossa frente, a centímetros de nós. Mas estávamos tão imóveis que ela não nos viu.

—Puta merda, puta merda, puta merda! —Tallys ficou de pé, esfregando as mãos no rosto. —E eu correndo igual um condenado achando que isso iria me salvar, sendo que eu só precisava ficar parado igual uma estátua.

—Agora pelo menos a gente sabe. —Lila se remexeu. —Isso explica porque ele não me atacou lá em casa, antes de você chegar. Eu fiquei congelada e encolhida em um canto.

—Temos uma certa vantagem agora. —Afirmei, esfregando minha mão nas minhas roupas, tentando espantar o cansaço. —O que aconteceu com o mercado negro? Acha que podemos voltar pra lá?

—Não os senti mais quando estava vindo pra cá. Eles não estavam atacando todo mundo. Pareciam estar de fato caçando algo específico. —Jacks ergueu as sobrancelhas. —Acho que você arranjou um bom número de inimigos, vossa graça.

—Claro... —Soltei uma risada baixa. —Eu estou tentando descobrir quem é a pessoa por trás do sumiço da magia e dessas coisas. É de se esperar que ele ou ela tente se livrar de mim.

—Então agora estamos sendo caçados por aquelas coisas? —Tallys fez um barulho de indignação com a boca, antes de apontar pra mim. —Sua sorte, amor, é que eu gosto muito de você, se não já tinha ido embora.

—Foi você quem quis ser meu amigo. —Dei de ombros, tentando sorrir. —Agora aguente.

[...]

Tallys puxou uma cadeira que estava virada, assim como quase todas as coisas no bar de Stella, e empurrou para que eu me sentasse. Fiz no mesmo instante, sentindo que minhas pernas já não iam suportar o peso do meu corpo por muito tempo. Tallys se sentou ao meu lado, enquanto Lila puxava uma cadeira para si e Jacks observava o bar, onde os homens de Stella tentavam organizar tudo.

—O mercado negro todo está assim? —Indaguei, gesticulando com as mãos para mostrar o bar.

—Não. As ruas principais e aqui, apenas. Como eu disse, eles estavam atrás de um alvo em específico. —Jacks afirmou, me fazendo encolher na cadeira.

Bom, estava adorando ser caçada por aquelas coisas.

—Ei, preciso de você aqui. —Stella desceu as escadas, desviando das mesas e cadeiras caídas. —Quanto de poção de cura você tem?

Lila se encolheu. Eu e Tallys trocamos olhares. Havíamos aprendido muito com a criatura na casa de Lila. E os homens, fadas e qualquer pessoa ferida por aquelas coisas, não teriam outro fim a não ser se transformar naquilo.

—Não tem como curá-los. —Lila murmurou baixinho, parecendo sem graça com o espanto de Stella. —Poção de cura não funciona.

—Como assim não funciona? Está me dizendo que parte dos meus homens vão morrer? —Stella erguer as sobrancelhas.

—São como vampiros. —Me virei para Stella, tocando o ombro de Tallys. —Precisa decidir o que quer pra eles. Matá-los ou levá-los para bem longe daqui, porque em algumas horas eles vão ter virado aquelas criaturas.

—Isso só pode ser uma piada! —Stella exclamou, esfregando as mãos no rosto. —Vou perder todos eles? Todos?

—Sinto muito. —Me encolhi também, porque a culpa era toda minha. Eu tinha ido até ali. Tinha enfiado Stella no meio disso. —Vamos embora daqui.

—Pra onde? —Tallys indagou, soltando uma risada nervosa. —Estamos sendo caçados em todos os lugares.

—Atlantis. —Olhei para Jacks, vendo as sobrancelhas dele se erguerem, enquanto seus lábios quase se curvaram em um sorriso. Quase. —É seguro?

—Tem minha palavra que é. —Afirmou, fazendo minha boca ficar seca com a forma que proferiu as palavras.

—O que vai fazer com eles? —Lila indagou, e nós olhamos para Stella, que estava olhando para Tallys. Ela desviou na mesma hora, fechando a cara e dando de ombros.

—Não tenho muitas opções, não é? —Ela esfregou a nuca. —Se matar a pessoa por trás disso, eles voltam ao normal?

—Não sabemos. Não ouvimos nada sobre isso. —Afirmei, me virando para olhar para Lila, que pareceu ficar pensativa.

—Vou tentar descobrir mais sobre isso. —Lila ficou de pé, arrastando a cadeira de volta para o lugar. —Se não vai matá-los, então cuide para que não firam mais ninguém. —Ela olhou pra nós. —Vou arrumar minhas coisas.

Tallys se colocou de pé, dando uma boa olhada em Stella, antes de desviar dela e subir as escadas para arrumar as próprias coisas também. Olhei para ela por cima do ombro, vendo seus cabelos roxos ficando um pouco apagados por conta da luz das chamas.

—O que está acontecendo entre você e o Tallys? —Indaguei, vendo ela piscar e piscar, pressionando os lábios em negação antes de dar de ombros e virar as costas pra sair dali. —Tudo bem então. —Olhei para Jacks, vendo a atenção dele em mim, enquanto ele parecia sorrir de leve. —Tem alguma coisa que eu precisar saber sobre suas terras?

—Nada com que deva se preocupar. —Ele riu, inclinando a cabeça na minha direção. —Apenas peregrinos para todos lados.



Continua...

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