Capítulo 24: Irmãos.

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—O círculo do deserto está reunido agora no palácio. Estão discutindo as medidas que vão tomar em relação a você e Tallys. E também, estão tentando descobrir o que aconteceu na casa de Breno, antes dela ser incendiada. —Meri olhou pra mim, erguendo uma das sobrancelhas. Não disse a ela que foi eu, mas tenho certeza que ela já ligou os pontos. —De qualquer forma, isso me deu o tempo de pegar tudo que você solicitou.

Ela empurrou a bolsa de couro preto na minha direção, enquanto eu ouvia a voz de Lila no outro cômodo, falando sem parar enquanto Jacks apenas a ouvia, murmurando alguns ''hmm'' e ''aham'' as vezes, deixando claro que estava ouvido, apesar de evitar proferir frases longas.

—E Tallys? —Indaguei, vendo Meri pressionar os lábios em negação.

—Foi visto na parte da cidade dos vampiros. Mas não conseguiram o pegar, fique tranquila. —Ela passou a mão no lenço rosa que cobria seus cabelos, parecendo nervosa. —Cal quer encontra-la antes de você ir. Eu falei pra ele a sua ideia e ele disse que sabe um meio de sair rapidamente de Solaris, sem precisar se preocupar com os guardas. —Fiz uma careta e ela deu de ombros. —Não faço ideia do que seja, apenas esteja nesse local a meia noite de hoje.

Ela me estendeu o papel parcialmente rasgado, que continha um endereço que eu conhecia muito bem. Meri se despediu de mim e foi embora, antes mesmo de eu conseguir me despedir, afirmando que já estava atrasada. Não reclamei, ela estava me ajudando muito. E agora eu estava ansiosa para ver meu irmão. Bravo e com certeza super protetor.

—Quem era aquela? —Dei um pulo, sentindo meu coração parar por alguns segundos, me voltei para Jacks, com o efeito do susto deixando minha respiração desregular.

—Meri, trabalhava pra mim quando eu era líder do círculo do deserto. Agora trabalha pro meu irmão. —Afirmei, vendo os olhos prateados de Jacks se cerrarem. —É uma boa amiga.

—Como Tallys?

Bom, Jacks conseguiu me dar um tapa na cara sem nem ao menos usar a mão pra isso.

—Tallys teve seus motivos. Cada um faz o que pode pra sobreviver. Eu fiz meu trabalho e ele só estava tentando encontrar a parceira. —Afirmei, não deixando que ele percebesse que eu estava magoada com Tallys. Mas não era pelo sangue, mas sim pelo que ele afirmou com tanta veemência. —E Meri não é uma cópia de Tallys.

Puxei a bolsa de cima da mesa, subindo as escadas para coloca-la no quarto. Por cima do ombro, pude ver que Jacks me seguia.

—E o que sabe sobre ela?

—Está interessado? —Indaguei, ouvindo uma risada descrente.

—Tenho gostos mais sofisticados do que uma mera deusa inferior. —Afirmou, com puro desdém. —O que sabe sobre ela?

Revirei meus olhos ao entrar no quarto, soltando a bolsa em cima da cama. A primeira coisa que vi quando a abri foi um dos meus muitos lenços, que Meri provavelmente pegou no meu quarto.

—Ela é três anos mais nova que eu. Estudamos e treinamos juntas. Ela é filha de uma das famílias mais ricas e tradicionais de Solaris. Seus avós lutaram na guerra contra os peregrinos. Foram os primeiros a darem seus poderes em prol do bem maior. —Comentei, sentindo ele me observar, enquanto eu passava o lenço ao redor do meu cabelo, com os pelos da minha nuca se arrepiando sobre os olhos prateados avaliadores dele. —O pai dela era líder do círculo do deserto antes de mim. Quando ele saiu, eu fui a escolhida para entrar no lugar dele e Meri foi designada para trabalhar pra mim. O que foi bom. Eu já a conhecia e nós duas sempre nos demos bem.

—E porque ela não foi colocada no lugar do pai? —Olhei pra Jacks, sentindo o tom de voz dele ficar ainda mais curioso.

—Porque não foi considerada boa para o cargo. Meri é... calma demais. Ela nem ao menos gosta de atirar. E eles precisavam de alguém que soubesse bater o pé e não abaixar a cabeça na frente de um problema.

—E essa era você. —Ele abriu um sorriso cheiro de veneno. —Faz sentido. Você não hesitou em puxar o gatilho quando mitou na minha asa.

Engoli em seco e meus olhos param para suas asas, encolhidas atrás dos ombros largos. Meu lenço ainda estava ali, amarado e com o tecido deslizando pelas penas negras.

—Ela não ficou chateada por não ter sido escolhida? —Indagou, chamando minha atenção de novo. Ergui os olhos para os dele, vendo aquela imensidão prateada me encarando com sentimentos muito confusos.

—Não. Quer dizer... eu não sei. Nunca falamos sobre isso. Mas ela ficou feliz por mim e sempre esteve do meu lado. —Dei de ombros. —De qualquer forma, se tivesse ficado chateada, a culpa não era minha. Fui escolhida pelos deuses com base no meu desempenho de trabalho e treinamento.

—Claro. —A voz soou um pouco indiferente, me fazendo bufar. Virei as costas pra ele e olhei as outras coisas que estavam na bolsa, encontrando as caixas de bala que estavam na minha casa, assim como meu conjunto de adagas e algumas roupas.

—Se ja terminou o interrogatório, temos coisas a fazer. —Afirmei, lançando um olhar resignado a ele, por cima do ombro. —Preciso que vá atrás de Tallys. Eu vou encontrar com o meu irmão.

—E é seguro?

—Ele é meu irmão. —Rebati, tentando não soar ofendida pela desconfiança. Não me importava que desconfiasse de Tallys, Meri, Lila ou qualquer outra pessoa. Mas Cal não. Ele era meu irmão e eu o conhecia perfeitamente. Eu o criei e confiava nele de olhos fechados.

—Como se isso fosse garantia pra alguma coisa. —Ele riu, desdenhoso. Me voltei para ele e fechei a cara.

—E você por acaso tem irmãos?

—Bem, sim. Eu tenho. Tinha... não sei mais. —Ele pressionou os lábios, me lançando um olhar de puro rancor. —Acho que não posso afirmar mais nada depois de mais de 90 anos.

—Quantos irmãos você tinha? —Indaguei, ignorando a acusação que soava no tom da frase.

—Três. —Sibilou, me fulminando com os olhos. —Mas não precisa sentir o mínimo remorço por ter me prendido. Eles não tinham a menor importância pra mim.

—Por que? —Indaguei, vendo ele revirar os olhos e se afastar em direção a porta. —Eu estou fazendo uma pergunta a você, Jacks. Porque seus irmãos não são importantes? O que eles fizeram pra você?

Ele parou, com o corpo ficando tenso e a mandíbula dura. Seu corpo girou na minha direção a contragosto. Ele não podia virar as costas. Não podia mentir pra mim. Precisava me responder.

—Me apunhalaram pelas costas. Então, talvez, você devesse abrir os olhos para o seu irmão também, vossa graça. —Ele riu, me olhando de cima a baixo. —Eles não tendem a ser muito confiáveis.



Continua...

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