Capítulo 63: Nos leve para casa.

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Senti os olhos de todos ao redor me observando, enquanto eu absorvia aquela afirmação dela. Todas as minhas conversas com Meri se repetiram na minha cabeça. Todas as lembrança e as vezes que ela me ajudou.

—Decepcionada, Alita? —Lila indagou, soltando uma risadinha.

—Ela está com a magia? —Olhei pra ela de novo, sentindo meu coração martelando no peito.

—Uma pergunta difícil. As magias passaram por muitos lugares. Vai ter que perguntar diretamente pra ela. —Lila deu de ombros.

Puxei a pistola da minha cintura e apontei para a cabeça dela, puxando a trava, enquanto seus olhos se arregalavam de espanto.

—Você disse que iria me deixar ir! —Afirmou, com os lábios tremendo e o rosto pálido.

—Eu menti. —Puxei o gatilho, ouvindo o som do tiro viajar pela floresta. Ela caiu no meio de nós, com os cabelos brancos se misturando com a poça de sangue que se formava na neve. Guardei a arma de volta, comprimindo meus lábios.

—E agora? —Tallys indagou.

—Vamos continuar até o litoral e achar um navio. —Me afastei deles, querendo um tempo para respirar. —E vamos voltar pra Solaris e terminar isso de uma vez por todas.

Olhei para o céu nublado e branco, desejando poder ver as estrelas ali. Nos leve para casa, pensei. Nos mostre o caminho.

[...]

Nossa caminhada até o litoral nos levou a mais um acampamento durante a noite, em que nos reunimos ao redor das fogueiras e esperamos o dia amanhecer. Logo cedo estávamos de pé, caminhando até as docas de uma vila pequena e praticamente vazia. Stella e Cal desembolsaram um bom número de moedas de ouro para conseguir passagem pra todos nós. Só precisávamos chegar até o navio de Stella e então tudo estaria em segurança de novo, até voltarmos a terra firme.

—Eu vi coisas, ou Jacks estava tocando você intimamente ontem? —Cal indagou, se aproximando de mim, que estava escorada no parapeito do navio olhando a água bater contra o casco.

—Você não viu coisas. Ele estava mesmo. —Cal ergueu as sobrancelhas e eu dei de ombros. Jacks dormiu no mesmo saco de dormir que eu na última noite na floresta, como das outras vezes. —Não dizem que ódio e amor são dois lados da mesma moeda?

—Você o odiava?

—Você sabe que não. Eu prendi ele naquela época porque era meu trabalho. Quando tudo isso acabar, óbvio que não farei nada disso de novo. —Afirmei, soltando uma respiração pesada. —Mas ele me odiava. Espero que isso já tenha acabado. —Olhei pra ele, umedecendo os lábios com a língua. —Stella me contou sua história com ela.

—Sério? Ela nunca tocou no assunto do passado dela comigo ou com ninguém. Era proibido. —Ele se escorou no parapeito do meu lado, me empurrando de leve. —Mas olha só, eu fico alguns dias morto e quando volto descubro que ela virou parceira do Tallys.

—Ela é, só falta aceitar. —Afirmei, vendo ele erguer as sobrancelhas. —Não quero me meter, mas você podia, sei lá, falar com ela sobre isso. Tenho certeza que ela dá muito valor a sua opinião.

—Duvido muito. Existe um mundo inteiro na cabeça de Stella e ninguém entra lá sem permissão. Se ela contou a história a você, com certeza você tem algo que ela da muito valor. —Ele sorriu pra mim, enquanto eu observava suas feições de vampiro.

—Não acredito que você foi transformado em vampiro. —Murmurei, fazendo uma careta. —Não acredito que você era um contrabandista e não me contou.

—Ah, pois é. —Ele soltou uma risada nervosa. —Acho que é uma boa hora pra uma explicação, não é?

—Com certeza é.

—Tudo bem. Só quero que saiba que eu nunca quis atrapalhar você como líder do círculo do deserto. Isso começou por acaso, Alita. Sabe que eu a seguia pra qualquer lugar, não é? Você me criou e eu devo tudo a você. —Ele segurou minha mão, mas não olhou nos meus olhos. —Eu estava acostumado a seguir você pelo deserto e seguir todas as suas ordens. E eu teria continuado a fazer isso o resto da minha eternidade. Mas em algum momento, aquilo se tornou um pouco cansativo pra mim. Não seguir você, mas... não ser nada além de invisível o tempo todo. Resolvendo as questões dos outros e evitando problemas. Eu queria resolver minhas próprias questões. Queria ser alguém como você era. Não como líder de um círculo como você, mas em algum lugar que eu me encaixasse.

"Isso começou quando você me enviou para uma das cidades perdidas no meio do deserto para encontrar um grupo de ladrões. Eu os segui e fiz o que mandou, prendi o grupo e confisquei todas as suas coisas. Descobri alguns artefatos mágicos e raros entre elas e que não pertenciam a Solaris. Entre eles tinha um mapa que ajudava a chegar ao mercado negro.

Eu fui até lá com a intenção de descobrir se havia uma forma de acabar com aquele lugar. Tinha certeza que você ficaria mais do que orgulhosa por mim se eu fizesse isso. Mas então... meus bolsos estavam cheios de artefatos mágicos e haviam pessoas e criaturas por toda volta. Quando vi já tinha vendido algumas delas. Depois outras. Então todas. Não consegui mais parar depois da primeira vez. Voltei lá e arrumei mais coisas pra vender. Comecei a fazer trabalhos por fora e então criei meu próprio grupo de contrabandistas."

—As raposas do deserto. —Puxei o amuleto e mostrei a ele, observando seu sorriso.

—Comprei isso quando juntei dinheiro o suficiente. No mercado negro o que mais tinham eram magias ruins e perigosas. Queria me proteger. —Ele fechou minha mão ao redor do amuleto. —Quero que fique com você agora. Posso arrumar outro pra mim. Além do mais, você faz parte da equipe.

—Obrigada, Cal. —Olhei pra ele, sentindo meu coração acelerar. —Obrigada por estar comigo sempre e por não ter me deixado.

—Sempre estarei aqui. —Prometeu, segurando a minha mão. —Quando isso acabar, você vai voltar ao seu posto e eu pro meu.

—Ah, não. —Sorri pra ele, inclinando a cabeça para o lado e observando as pessoas no navio. —Não quero voltar para o círculo do deserto. Já tenho meu próprio círculo agora. —Me virei pra ele, erguendo as sobrancelhas. —Estou pensando em coisas que não envolvem ficar dentro da lei.



Continua...

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