O clima estava pesado demais. Eu podia sentir cada ponta daquela história que Jacks me contou, flutuando no ar e nos olhos de cada um dos três irmãos dele, como se eles se perguntassem como Jacks ainda está vivo. Pela reação de Maximus, eu gostaria de saber que história os três contaram à vila quando voltaram sem o irmão mais novo.
—Ficamos imensamente felizes por estar de volta, vivo. —Um dos irmãos disse. Ele tinha os olhos prateados mais intensos e as pontas dos chifres pareciam ter sido pintadas de vermelho, entre os fios de cabelo escuro.
—Claro que estão. —Jacks murmurou, rindo ao se virar pra mim. —Estes são meus irmãos. Aiden. —Ele apontou para o irmão que havia acabado de falar. Dos três, era o menor, mas não parecia menos fraco. —Evan o mais velho. —Ele apontou para o mais alto, que havia o cumprimentado antes. Suas asas pareciam as mais longa dos três, assim como os cifres maiores sobre a cabeça. —E este é o Jace.
Olhei para o últimos deles. Era o único com o sorriso na cara. Mas era um claro sorriso dissimulado, de alguém pronto para entrar em uma brincadeira muito divertida. Isso me fez encara-lo com as sobrancelhas erguidas.
—É um prazer conhecer o famoso círculo dos impostoras. —Evan falou, dando uma boa olhada no grupo de homens atrás de Stella. —Tão pouco tempo de existência e tão cheio de histórias.
—E Jacks, pelo que parece, preferiu vocês a nós. —Aiden completou, soltando uma risadinha.
—Pois é, parece que vocês não seguiram direito os princípios de ser uma família. —Stella retrucou, lançando um olhar tranquilo a eles. —Eu gostaria de saber se irão nos receber ou não. Temos homens com fome e cansados que gostariam muito de uma cama quentinha e uma boa comida.
—É claro. —Maximus estalou os dedos, fazendo duas novas mesas surgirem, bem naquele corredor por onde havíamos passado. —Vocês são mais do que bem-vindos. Sentem-se e aproveitei o banquete. Teremos tempo para conversar mais tarde.
E como num passe de mágica, as duas mesas ficaram lotadas de pilhas de comida. Mesmo um pouco nervosa, senti a fome dar as caras quando os homens começaram a se sentar nos bancos e encher os pratos e os copos de bebida.
—Quer se juntar a nós, Jacks? —Jace indagou, assim que eu segui Stella e Tallys até a mesa. —Temos um lugar especial pra você.
—Não, obrigada. —Ele virou as costas, vindo atrás de nós e deixando os irmãos pra trás.
Me sentei ao lado de Stella, trocando um sorriso com ela ao ver tanta comida. Jacks e Tallys se sentaram a nossa frente, mas enquanto Jacks parecia tão cheio de fome como nos, Tallys fez apenas uma careta ao ver a comida. Olhei de relance para a mesa principal, vendo que o peregrino já havia se sentado e agora estava nos observando com muita atenção.
Os irmãos de Jacks não voltaram para suas mesas, eles se sentaram em uma logo atrás de mim, onde podiam observar o irmão mais novo. Isso me fez ficar um pouco tensa, porque eu podia ver os movimentos duros de Jacks ao saborear a comida. Seria uma longa noite.
[...]
Soltei meu cálice de vinho, enquanto observava Jacks encher o de Tallys e dos outros vampiros que estavam conosco com sangue humano. A maioria já havia parado de comer, mas estavam ali conversando e aproveitando a música que vinha de algum lugar. Não duvidava que fosse feita de magia também.
—Quantos anos ele tem? —Stella sussurrou, se inclinando para perto de mim, enquanto fingia beber da sua próxima taça.
—Quem? —Indaguei, confusa.
—Tallys. —Ela me olhou, um pouco constrangida.
—20. —Olhei de relance pra ele, que estava gargalhando de alguma coisa que os rapazes falavam. —Quantos anos você tem?
—Quer mesmo saber? —Indagou, coçando a nuca, enquanto eu balançava a cabeça afirmativamente. —396.
—Uau! —Soltei uma risada, vendo ela rir e dar de ombros. —É bastante tempo. Quase 4 séculos.
—Ele é bem novo pra um vampiro. —Comentou, encarando o prato de comida vazio. —A maioria dos vampiros que trabalha comigo tem mais de 2 séculos.
—Tallys tem muita coisa pra viver. —Afirmei, olhando pra ela. —E você também tem, Stella. Sabe disso. Talvez... até mesmo juntos.
Ela não respondeu, mas vi que ergueu os olhos para fita-lo do outro lado da mesa. Afastei minha taça, observando as conversas paralelas de todos na mesa e das pessoas ao redor. Evitei olhar para a mesa principal e principalmente para os irmãos de Jacks atrás de mim.
—Então, de onde vocês peregrinos veem, Jacks? —Stella indagou, entrando no meio da conversa. —Ouvi muita coisa sobre vocês através dos anos. Nunca sei o que é verdade ou não.
—O que quer saber? —Ele escorou os braços na mesa, olhando pra ela com atenção.
—É verdade que vocês tem descendência bruxa? —Alguém da mesa perguntou, fazendo Jacks erguer as sobrancelhas.
—Sim, é verdade. Nossa raça tem mais de milênios de existência. Mas nossa descendência mágica é bem mais profunda que isso. —Explicou, enquanto todos ali ficavam em silêncio para ouvi-lo, apesar de ao redor as conversas continuarem. —Nossos antepassados são de origem bruxa e estelar.
—Estelar? —Tallys olhou pra ele com uma careta. —Estrelas?
—Não as estrelas daqui. O que vocês conhecem é apenas a ponta do iceberg. Um resquício de uma da magia mais pura que vem das estrelas. Estrelas reais de carne e osso, moradoras de um mundo bem distante do nosso. —Ele estendeu a mão pra frente, fazendo pequenos pontos de luz surgirem ali, ganhando a forma de um ser alado. —Asas brancas, olhos de diamantes, com o poder de realizar os desejos mais profundos da mente. As histórias contam que essas estrelas saiam do seu reino para caminhar entre os humanos e as bruxas, sendo irrevogavelmente proibidas de se envolverem com qualquer raça. Mas com o passar dos séculos, isso foi se tornando inevitável. —A magia na mão dele se moveu, criando outra forma junto com aquele ser alado. Era um bruxo, com uma aura mais pesada e sombria. —As estrelas se envolveram com os humanos e com as bruxas. Enquanto sua prole com os humanos era nada além de um ser mortal sem magia, com as bruxas foi completamente diferente. Eram seres de asas negras, olhos prateados que com a união da magia das bruxas e das estrelas, se tornava um ser nascido da magia. Dotado dela até no seu sangue e ossos. Imortal e poderoso.
—Vocês. —Falei, vendo a magia desaparecer da mão dele, enquanto seus olhos se voltavam para os meus e ele balançava a cabeça afirmativamente. —Vocês são descentes de bruxas e estrelas.
—O relacionamento entre eles criou uma espécie nova. Não sei o que aconteceu depois que seres como eu começaram a nascer naquelas terras. Só sei que estamos aqui agora, nesse mundo. —Ele deu de ombros, pegando seu cálice de vinho. —Isso foi a muito tempo. A maioria pensa que essas histórias são lendas.
—Lendas... —Eu me endireitei no lugar, erguendo os olhos para Maximus quando ele surgiu ao lado da mesa. —Não são nada mais que histórias contadas com base em alguma verdade e um toque de mentira.
Ele sorriu para nós e eu percebi que toda aquela sala estava silenciosa de novo.
Continua...
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Os Domínios do Deserto
FantasyNas terras do continente Esmeralda, muito se fala sobre os deuses capazes de ditar os dias e as noites, controlando o sol, a lua e as estrelas. Mas outros seres caminham por aquelas terras, reverenciando-os e convivendo com os deuses inferiores, que...