Desviei do corpo de Breno, passando por Lila e indo até onde Tallys estava. Observei sei peito subir e descer, enquanto ele respirava fundo. Parei na sua frente, cruzando os braços na frente do corpo, enquanto aguardava uma explicação.
—Eu juro por tudo que é mais sagrado que eu não sabia que ele estava fazendo isso! —Afirmou, apontando para o sangue que manchava o chão, enquanto e fechava meus olhos com força. —Juro pra você, Alita, eu não sabia! Ele me pediu o sangue e como eu estava desesperado demais pela ajuda dele, aceitei.
—Isso não pode estar acontecendo! —Gemi, esfregando as mãos no rosto. —Tallys, isso...
—Alita, é sério, eu não sabia! —Exclamou, parecendo mais atordoado do que eu. —Eu te falei, eu estava procurando a minha parceira. Sim, ele não ia me ajudar de graça, mas quando pediu o sangue disse que era pra umas poções... eu não podia imaginar que ele usaria isso pra criar monstros! —Afirmou, agarrando meus ombros com um pouco mais de foça do que necessário. —Você me conhece. Você sabe que eu jamais faria algo assim!
Me afastei dele, olhando toda aquela cena terrível na minha frente. Tallys roubou o sangue para Breno e ele estava usando aquilo para criar aquelas criaturas. Mas agora ele está morto, com o pescoço cortado, enquanto deixa um caos para trás.
—Alita... —Ele tocou meu braço e eu me afastei involuntariamente, sentindo minha cabeça fervendo. —Qual é, confia em mim! Se eu sequer desconfiasse, teria corrido para contar a você!
—Você roubou o sangue, Tallys! Mais de uma vez. —Afirmei, me voltando para ele. —Eu questionei você sobre isso. Eu pedi para que me contasse o que estava acontecendo. Por que diabos você não me contou?
Ele ficou em silencio, com a respiração entrecortada escapando dos seus lábios. Pressionei os meus, sentindo a frustração tomar conta de mim. Foi apenas segundos até os ombros dele ficarem eretor e sua expressão se tornasse dura, quando a raiva cintilou em seus olhos.
—E o que teria adiantado, Alita? Você iria permitir que eu saísse de Solaris para procurá-la? —Ele riu, em puro tom de desdém. —É obvio que não. Você faria um daqueles seus muitos discursos sobre a importância de manter a ordem. De respeitar as leis dos deuses e todo esse blá blá blá irritante deles. Então por que eu deveria contar a você? —Ele balançou a cabeça negativamente. —Você, ou qualquer deus inferior, bruxa ou humano desse maldito deserto não entenderia.
—Eu só faço o meu trabalho, Tallys. Se eu pensasse em deixar você sair, acabaria preso. Aqui ou em outro território. —Afirmei, engolindo em seco. —Mas eu teria feito o possível para te ajudar, se tivesse me contado! Talvez, Breno não estaria morto agora!
—Ah, para! —Ele riu, descrente. —Não da pra voltar no tempo, Alita. Mas se quer me odiar por isso, vá em frente. Não é como se eu não estivesse acostumado.
—O que? —Soltei o ar com força, com uma risada nasal.
—Olha ao redor, Alita. Estamos na droga de um deserto, dependendo dos outros territórios para viver. E sabe por que? Porque somos os indesejados. Somos uma doença que eles empurraram pra cá. Os seus amados deuses não estão nem ai pra nós! —Exclamou, dando um passo na minha direção. Cambaleei para trás, assustada ao ver os olhos dele se tornarem vermelhos como sangue.
—Tallys! —Alertei, antes de sentir a presença de Jacks atrás de mim.
—Pergunta pra ele. —Tallys apontou para Jacks, posto atrás de mim. —Ele vai concordar comigo. Deuses inferiores, humanos, bruxas e vampiros... somos a ralé, Alita. Estamos presos nesse deserto porque eles sentem repulsa de nós! Porque eles não nos querem por perto!
—Você está irritado. —Murmurei, vendo ele rir.
—Sim, eu estou irritado. Porque você não está vendo o que está bem na sua frente! —Exclamou, dando mais um passo na minha direção. —Eles são deuses, Alita. Eles controlam o clima, o dia e a noite, as florestas, as águas... se eles quisessem, poderiam transformar isso aqui em uma floresta. Mas eles não fazem, porque não estão nem ai!
Fiquei em silencio, ouvindo o som do meu coração batendo acelerado, enquanto absorvia cada frase que ele soltava, como se estivesse pronto para explodir.
—Eu sou a merda de uma vampiro. Eu deveria estar em uma floresta, não na droga de um deserto, esperando alguém aparecer com um baú de sangue! —Prosseguiu, falando cada frase muito lentamente. —Nascemos para caçar e não pra ficar adorando deuses de outras raças! Eu, assim como todos os vampiros daqui, não tem absolutamente nada! Enquanto as bruxas praticam sua magia por aí, nós temos que ficar parados, seguindo regras e não podendo fazer aquilo que fomos criados para fazer! —Ele virou as costas, com o corpo inteiro tenso. —A única coisa que resta pra mim é o laço. É a vampira que está do outro lado dele. Fiz o que podia para encontrá-la e não me importo com as consequências.
Quando pisquei de novo, Tallys já não estava mais ali, deixando apenas o ar tenso e frio ao meu redor. Engoli com dificuldade, sentindo meu corpo pronto para desabar ali no chão, com a intensidade que tudo estava sendo descarregado em mim.
—O que fazemos agora? —Lila indagou, olhando para o corpo de Breno, quando me afastei de Jacks e comecei a mexer nas coisas ao redor, procurando por qualquer pista. —Porque mataram ele, se ele estava criando aqueles monstros? Quer dizer... isso não faz sentido.
—Ele ou ela pode ter se sentido ameaçado e estava tentando limpar as provas. —Jacks afirmou, pressionando os lábios em reprovação ao encarar todo aquele sangue. —Não vai atrás do seu amigo?
Parei, olhando pra ele por cima do ombro.
—E você por acaso se importa?
—Não. —Ele riu, dando de ombros. —Só fiquei curioso.
Me afastei até onde o corpo de Breno estava, engolindo com dificuldade ao sentir o cheiro metálico começar a se impregnar em mim, com minhas botas deixando pegadas vermelhas no chão. Encarei o rosto pálido e imóvel dele, pressionando meus lábios com força.
—Eu acho que sei onde temos que ir. —Declarei, percebendo que as coisas estavam começando a ficarem mais complicadas. —Vamos pegar nossas coisas e sair dessa cidade. —Me afastei dos dois, subindo as escadas para pegar algo que iniciasse fogo. —Encontramos Tallys no caminho.
—Pra onde vamos? —Lila indagou, surgindo da escuridão da passagem, logo atrás de Jacks.
—Para a terra dos solos férteis e das águas claras. —Murmurei, soltando o ar com força. —Vamos para Montear.
Continua...
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Os Domínios do Deserto
FantasyNas terras do continente Esmeralda, muito se fala sobre os deuses capazes de ditar os dias e as noites, controlando o sol, a lua e as estrelas. Mas outros seres caminham por aquelas terras, reverenciando-os e convivendo com os deuses inferiores, que...