Viver o hoje como se não houvesse amanhã, era pra alguém que acreditasse que um dia iria morrer, não para alguém que acreditasse já estar morto. Sendo assim, ela ficou na cama na casa de Ailin, por dias e noites sem conta.
Xstrauss, ela soube por Ailin, estava sob a terra para reestabelecer o estrago que os seus irmãos fizeram nele. Que fosse feliz em seu sono, ou que tivesse uma puta indigestão com seu sangue, chegou a pairar em sua mente. Dërhon e Zarcon até tentaram visitá-la, mas Ailin coibiu às suas presenças na sua casa ao seu pedido e somente Ores permanecia ali... Incansável, como uma estátua de pedra na penumbra do quarto.
Aguardando, aguardando...
— Sei que está aqui. — ela perdeu a paciência e disse por fim.
— Senhora. — ele respondeu sem inflexão no tom de voz e Kassia se virou de costas sentindo-se de verdade como criança mimada e malcriada.
— Vá embora, Ores — ela ordena, mas sabia que ele permaneceria lá.
Tal como uma sombra silenciosa, pairando num canto do quarto, e por mais maluco que fosse, isso era estranhamente confortável...
— O que há de errado comigo? — ela deixou escapulir e sua garganta a traiu com um soluço ressentido. Será que ela queria mesmo saber?
— Sei que não sou bonita, mesmo no meu mundo eu...
Ah que ótimo! Além de estar morrendo de pena de si mesma, agora até falava como eles! Seu mundo, mundo deles! Que diferença faria?
Kassia bufou e tampou a cabeça com o travesseiro, como se pudesse com isso calar a voz da segunda personalidade que acreditava estar desenvolvendo. Ores tirou com gentileza o travesseiro que a encobria e sentou no chão com ele no colo a fitar um ponto invisível na parede à sua frente.
— A senhora me disse algo sobre paternidade, é como me sinto com a maioria dos que vivem aqui.
Ores sorriu cônscio de que havia conquistado sua atenção.
—Sei... — soou ela com desdém.
— Só não entendo como já não está de cabelos brancos...
E ela não se excluía do pacote de supostos 'filhos' com capacidade de 'deixá-lo' de cabelos brancos!
— Eu pinto. — ele disse e sorriu de novo em sentir o olhar de escrutínio dela sobre seus cabelos.
— Está brincando... Você tem senso de humor? Ores, você tem senso de humor! Isso é inacreditável!
Agora ele ri de verdade e balança a cabeça em negação desmentindo o que disse antes, mas continuou com o olhar fixo na parede.
— Não, você 'não pinta', ou não, você 'não tem' senso de humor?
— Eu não pinto, mas estou descobrindo que sou capaz de me superar na arte de servir bem. — ele explicou com evidente orgulho no tom de voz.
Kassia estendeu o braço e bagunçou o cabelo dele, se sentia bem perto de Ores e de Ailin, não podia negar isso.
— Quer se casar comigo?
Ores virou a cabeça a encará-la e sorriu;
— Ah, não senhora, seria pedofilia, e não cairia nada bem pra nenhum de nós.
Kassia moveu os ombros com desdém e fitou os arabescos no teto;
— Já estamos condenados mesmo. Que mal faria um pecadinho a mais?
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Vale dos Aehmons
Paranormal®Todos os direitos reservados. Liberado por período indeterminado. (design de capa Debby Scar). Kassia é uma jovem comum, que sempre batalhou para ter seu espaço e sua liberdade no mundo. Não sabia ela que sua vida tomaria rumos sem volta quando...