A Reunião

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A música estava mais alta agora, e podiam ver a fogueira em volta da qual os nômades se reuniram em toda a sua glória ardente. O alto pilar de chamas vermelhas e douradas cuspia brasas e fumaça cinza no céu da noite, iluminando as tendas extravagantes e multicoloridas de forma que as lantejoulas que ornavam os tecidos desbotados cintilavam como pedaços de ouro. As batidas de tambor eram pontuadas por gritos entusiasmados e Eren podia ver homens bêbados com seus lungis pendurados em suas cinturas dançando em estranhos pulinhos de um pé só em volta da fogueira em meio às risadas de seus espectadores. Seu guia fez um som irritado para impulsioná-los a ir mais rápido pelo caminho quando diminuíram o passo para assistir ao espetáculo.

— Isso me lembra os velhos tempos. — relembrou Mikasa, com tristeza. A atmosfera estava martelando com energia e vivacidade, mas para ele era muito nostálgico. Lembrava-o do tipo de felicidade da infância que ele nunca sentiria de novo.

A tenda de Hannes era a maior do lote, localizada no centro do acampamento Paāvaena. Uma miríade de tecidos misturados e forrados de forma tão ostensiva que até se destacava das outras.

Seu guia grunhiu e sacudiu a cabeça na direção da tenda.

— Ele está lá dentro? Eṅkaḷ mama? — Outro grunhido afirmativo, agora um pouco impaciente. Os olhos escuros de seu guia viajaram entre Eren e sua irmã cautelosamente, vasculhando-os mais uma vez, machete balançando casualmente em sua mão. Eren sorriu embaraçosamente. — Tudo bem, então. Nandri!

Eles foram cumprimentados pelo cheiro inebriante de ganja e álcool assim que colocaram os pés dentro da tenda. Mikasa e ele compartilharam uma careta. Típico de Hannes; aonde quer que fosse, o fedor de seus vícios o seguiam. A tenda estava quente e um pouco sufocante; os panos suspensos não permitiam muita ventilação e o chão estava coberto de esteiras, tapetes e peles de animais encaixados atropeladamente. Encontraram seu tio mergulhado em um baú, metade do conteúdo espalhado à sua volta.

— Eu estava esperando por vocês! — Hannes emergiu da arca quando os ouviu. Estendeu seus braços em boas vindas, gesticulando para as almofadas próximas. — Venham, venham, sentem-se. — Mikasa o abraçou e deixou-o pegar Armin cuidadosamente nos braços antes de se estabelecer ao lado de Eren. Hannes embalou o bebê adormecido como se fosse feito de vidro e sua expressão amoleceu.

— Você era só uma coisinha pequena na última vez em que estive aqui. Pequenino e rosa e choroso. — Hannes não sabia sobre o parentesco de Armin. Mikasa e Eren decidiram há muito tempo não revelar certas coisas a seu tio sobre sua situação após a morte dos pais; foram forçados pelas circunstâncias e falta de opção, mas Hannes certamente se culparia por não estar lá para ajudá-los. Até onde o mais velho sabia, o pai de Armin morrera no mar e Mikasa era uma dançarina profissional. Era uma péssima mentira, porém a mais plausível que puderam pensar na época. — Carla teria amado você.

O sorriso de Eren desmoronou, e uma olhada rápida para Mikasa mostrou que sua expressão ficou turva também. Pensavam nisso constantemente; como sua mãe teria ensinado a Armin todas as canções populares que ensinara a Eren, ou em como seu pai sentaria a criança no colo enquanto explorava os livros espalhados sobre sua mesa abastada da cozinha. Sempre começava engraçado, mas isso nunca durava.

— Para onde você foi dessa vez, tio? — perguntou Eren, desesperado para evitar aqueles pensamentos. Hannes saiu de seu devaneio e olhou para cima.

— Oh, você nem imagina. — Seus olhos brilharam quando ele sorriu, os lábios se esticando largamente para revelar seus dentes destruídos pela folha de bétele. — Nós cruzamos o deserto Asfar e viajamos pela costa por oito meses até chegarmos à Ponte de Adyama.

Street Brat (tradução pt/br)Onde histórias criam vida. Descubra agora