Meu irmão hoje não fala, e eu me lembro muito bem do dia em que ele simplesmente se calou. Para sempre.
Fomos passar uns dias na casa da tia Rita, como sempre íamos quando o papai viajava para outro estado. Nossa mãe nos deixava lá e ia trabalhar. A mesma trabalhava como doméstica.
A tia Rita era uma viúva de cinquenta e poucos anos de idade. Morava sozinha e adorava quando íamos passar o dia na sua casa.
A tia Rita sentia ainda muitas saudades do seu marido, o tio Inácio que morreu no quarto dos fundos, quando adquiriu um vírus mortal. Tio Inácio padeceu na cama, as órbitas dos seus olhos se afundaram no rosto, a pele deitava nos seus ossos. Foi horrível a sua morte.
Desde então, o quarto dos fundos, onde o titio morreu, ficou desativado. A tia Rita evitava entrar lá, acho que por saudades, mas logo vou explicar que não era bem por isso. No quarto tinha apenas um colchão velho e algumas tralhas inutilizadas.
Então, certo dia eu, meu irmão Rafael e meu sobrinho Roberto, que era, como dizia antigamente, atentado, estávamos brincando no quintal quando o meu primo Roberto sugeriu uma aposta: Quem perdesse na brincadeira de Finca, iria entrar no quarto onde o titio morreu, e que a tia Rita não permitia a entrada, e ficasse por lá um minuto. Como o meu irmão Rafael era pequeno, ele tinha apenas seis anos de idade, claro que foi o coitado quem perdeu.
— Ah não, mano, não quero entrar lá não! — ele disse quase chorando.
— Não, Rafael! Você vai entrar lá sim. Você quis brincar agora vai ter que cumprir a aposta. — disse meu primo Roberto.
— Mas eu tô com medo.
— É só um minuto, Rafael. Vai lá, bora!
— Vai, Rafael! Vou estar aqui na porta esperando você. — eu disse.
— Mas, mano... — disse o coitado.
— Para de ser medroso e entra logo lá. — disse meu primo.
Depois de muito relutar, Rafael entrou no quarto escuro, abafado e com cheiro de mofo, então eu e Roberto trancamos a porta.
Me tira daqui, mano, eu tô com muito medo, ele dizia.
— Tem que completar um minuto, mano. Aguenta aí.
Mas tá estranho aqui. Eu sinto que tem alguém me olhando. Ai me tira daqui, mano, por favor.
— Espera, Rafael. Já tem 30 segundos.
Tem alguém aqui, mano! Primo! Ele vai me pegar, abra a porta, deixa eu sair. Mãaae, paaaai, me tirem daqui! Ele vai me pegar, ele vai me pegar...Já sinto suas mãos!
— Temos que abrir! — eu disse a Roberto.
— Só depois que completar um minuto. Ele tá tirando com a nossa cara.
— Não está não. Eu conheço ele.
— Se você abrir, eu não brinco mais com você! — disse o maldoso Roberto.
Abram a porta, por favor... , dizia o meu irmão chorando. Tive tanta pena dele.
Ele está me agarrando, ai, ai, me ajudem! Manoooo!
Foi a última vez que eu ouvi a voz do meu irmão. Ainda ouço ela: "mano".
Quando abrimos a porta, vi meu irmãozinho deitado no chão, suando frio, a respiração ofegante, pálido.
— Rafael, você está bem? — eu perguntei. Mas ele não respondia e destinava olhares aleatórios pelo quarto, ainda em transe. — O que foi que você viu? — Então ele chorou mais uma vez me abraçando, a cabeça na minha barriga.
Depois daquele episódio, meu irmão nunca mais falou nada, nem mesmo uma palavra.
Fim
Autoria: Jim Patrik
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ESPECTROFOBIA (Contos de Terror)
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