O Terrível Taxidermista

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Depoimento do subalterno do conde da taxidermia ( pseudônimo dado ao assassino)

23 de novembro de 1876

“Cheguei naquela mansão em uma segunda feira bem cedo. De fato, aquilo estava mais para um palácio e eu teria que cuidar de tudo aquilo sozinho, pois o conde não contrataria mais ninguém além de mim. Afirmou-me que me pagaria muito bem, bastaria eu fazer o meu serviço bem feito e não me meter nos negócios dele que tudo ficaria bem.

Ignoro o modo de sobrevivência do conde. Ele passava horas na sua sala que ficava no ultimo andar da casa. Era-me proibido entrar ali. Ele mesmo se dispunha a limpar o lugar.

Todas as tardes, prestes a escurecer, eu ouvia um som alto de musica vindo da sala do meu patrão. O que me intrigava era que sempre tocava a mesma música: a segunda sinfonia de Beethoven.

Eu estava ciente dos assassinatos, mas nunca poderia imaginar que era o meu patrão.

A cidade passava por um pânico nunca visto por lá. Os lobos estavam furiosos e famintos, e já se começava a dizer que um homem, idêntico a um lobo, rodeava a cidade toda a procura de  vítimas. Todos diziam ser um lobisomem. E algumas pessoas diziam ser o meu patrão.

Ele adorava se fantasiar de filantropo. Realizava os maiores bailes da cidade. Frequentava teatros e grandes óperas. Era sempre visto usando uma longa capa vermelha e uma cartola preta.

No dia seguinte ao baile, ele perguntava a mim se eu havia reparado no casaco de pele de fulano, ciclano e beltrano. Eu o olhava confuso e dizia não. Ele respondia tudo bem, e voltava para a sua sala secreta. Muito me intrigava aquelas perguntas do meu patrão. Parece que aquelas pessoas, com roupas luxuosas,  incomodavam o meu patrão. Ele os olhava com uma ira que jamais poderei decifrar a vocês.

Várias pessoas desaparecidas. Começava a crescer o número.

  Os caçadores, que foram contratados para matar os lobos, sumiram, assim como as duas filhas do barão Visconde que adoravam um casaco de pele e um empalhador de animais, pessoa com a qual o meu patrão tinha muita afinidade.

Num funesto dia, em que ele abriu a sua casa para realizar um grande baile, ele sentou-se no banco do piano e começou a tocar uma música de Beethoven, a sonata ao luar. Ele tocava piano magistralmente. De repente, quando a música exigia umas batidas mais fortes em suas teclas, meu patrão começou a se contorcer todo. Seu pescoço se entortou e suas veias pareciam que iam se dilatar. Seus olhos ficaram vermelhos como a de um lobo. As pessoas diziam: vejam! Ele está se transformando. Todos se afastaram com muito medo. Quando a música acabou, meu patrão estalou seus dedos e disse: “Muito obrigado”. Os presentes sorriram e bateram muita palma a ele.

Um dia, durante um grande baile a máscaras que ele realizaria em sua mansão, ele me deu oito horas de folga para passear um pouco em qualquer lugar que eu quisesse. Eu fui visitar meus filhos, pois fazia meses que eu não os via.

Quando voltei, havia cinco objetos pendurados na parede sobre um pano preto. Os convidados foram chegando. Várias pessoas se aglomeraram assustadas no salão. O conde, o anfitrião da festa havia sumido. 

A segunda sinfonia de Beethoven tocava como música de fundo.

De repente os panos foram descobertos e uma voz, que ninguém sabia dizer de onde vinha, e que estava mais para um poema, disse o seguinte: Vejam essas vidas em jogo. Esses meros mortais. O mundo de vocês não poupa nem a paz. Vejo a beleza deles no corpo de alguém, de alguém sem escrúpulos que não ama ninguém. O nosso verde caindo. Nativos no chão. Minguando um lar e entrando em extinção.

Todos se olharam com muito medo e chocados com o que viram, pois as cabeças dos dois caçadores, as duas filhas do conde Visconde, que realmente adoravam um casaco de pele, e o empalhador de animais, foram todos cruelmente vítimas da taxidermia humana.


O conde havia realmente sumido”. 

Conto extraído da novela "O Homem que empalhava" disponível aqui mesmo no meu perfil.

Conto extraído da novela "O Homem que empalhava" disponível aqui mesmo no meu perfil

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