Uma nova Cinderela (parte 60)

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Larissa veio correndo até nós e se pendurou na saia do meu vestido.
- Mamãe! Mamãe! Papai está aqui! - ela apontava para a porta de entrada. Marcus vinha caminhando e discutindo com a sua mulher. Os dois sem fantasia.
Eu acenei para ele de longe. Eros estava no banheiro. Eles caminharam até mim.
- Como você está, Tatiana? - ele continuava olhando com nojo para tudo. Antigamente eu o achava o máximo. Hoje tenho pena dele. - Pensei que as fantasias eram só para crianças. Está parecendo o circo aqui. Essa pocilga continua a mesma.
Marcus pegou a filha no colo e logo em seguida a colocou no chão dizendo que estava muito pesada.
- Algumas garotas viraram umas belezinhas. Mas tem umas aí que deveriam estar em Bagdá. Uns canhões. Você viu as professoras. Tem umas aí que só restam rezar para ter uma boa morte. - ele deu dinheiro para a mulher ir comprar cerveja. - Foi mal esses dias não poder ter ido buscar a Larissa no aniversário dela. Eu dei 20 reais para ela comprar alguma coisa. E eu queria trocar o final de semana que vou ficar com ela. Os rapazes querem ir pescar.
- Você sabe que ela sente saudades de você.
- Eu sei. Mas eu prometo que vou compensar.
E fícamos em silêncio escutando a música. Ao olhar agora para ele eu só sentia repulsa por ter algum dia gostado dele. Ele sempre foi tão insensível.
- E você que anda fazendo da vida? - ele ainda era péssimo em tentar conversar. Tentanva não passar interesse nas pessoas, como se ele estivesse fazendo uma caridade ao conversar com elas. - A Larissa disse que você tem um namorado. É verdade? Eu só quero dizer que não quero que ela tenha contato com os teus machinhos. Ela é a minha filha e deve ser criada com respeito.
Eu senti o fogo do ódio inflamar por dentro de mim. Eu praticamente criei sozinha minha filha. Ele pagava uma pensão de 250 reais por mês porque nunca teve carteira assinada. Embora ganhasse muito mais. E falava em machinhos. Como se eu fosse irresponsável.
- Marcus. Você pode ter certeza de que eu jamais colocaria minha filha em contato com machinhos. Eu já fiz a cagada de me envolver com um homem escroto e nunca mais pretendo repetir.
Ele demorou alguns segundos para entender que o homem escroto de que eu falava era ele. Quando a ficha caiu eu vi seu rosto ficar vermelho de ódio. Parecia que eu revivia o nosso relacionamento. Quando ele começava a gritar comigo por não achar suas cuecas na gaveta. Ou quando a comida não estava boa o suficiente. Ou quando eu queria assistir algum filme e ele chamava de porcaria. Ou quando eu respondia e ele gritava mais alto ainda batendo as portas. Quebrando os móveis.
Eu senti uma mão pegar no meu braço por trás. Me dando um leve susto. Era Eros. Ele envolveu seus braços ao redor da minha cintura e me deu um beijão.
A garota do Marcus voltou e lhe deu a cerveja. Ele jogou o copo plástico no chão e bebeu do gargalo da garrafa.
- Prazer, Eros. - Eros estendeu seu bração musculoso para cumprimentar Marcus. Marcus parecia uma minhoca ao lado de Eros.
- E aí? - Marcus ruminou as palavras e apertou a mão firme dele.
- Larissa, você quer vir com a mamãe dar uma volta na escola? - eu queria fugir dali. - Ver onde a mamãe estudava?
- Quero.
Então Eros, eu e a Larissa saímos do salão.
Ao lado a escola estava aberta. Ao entrar no pátio iluminado de noite e sentar num dos bancos de concreto eu me senti grata por ter estudado nela.
Larissa pulava amarelinha no pátio da escola. Seus pés batiam com força na calçada fazendo o barulho ecoar pelo grande teto de zinco.
- Seu ex parece ser horrível. - Eros queria saber mais sobre mim. Diferente de Marcus, para ele eu era interessante demais. Cada coisa que eu pensava ele queria saber. Ele me queria por inteiro.
- Eu sei. Na verdade ele é uma pessoa boa. Eu sei que parece que estou defendendo o indefensável. Mas ele é assim porque aprendeu a ser assim. Sofreu muito na vida. Só queria ficar rico e famoso. Queria se livrar de tudo isso. Quando a gente nasce pobre já vem incutido a meta de ficar rico do dia para noite e isso deixa a gente doido.
- Ele devia tratar melhor a filha dele.
- Devia mesmo. Mas ele nunca teve carinho e os pais dele praticamente o espancavam. Foi criado no meio da violência. Eu sei que isso não explica. E que ele poderia tentar ser diferente do que os pais deles eram.
- Deveria mesmo.
- Mas é melhor ignorá-lo.
- Eu achei ele um nojo de pessoa. Você teve sorte de se livrar dele. E temho pena da Larissa por ter um pai assim.
Era a primeira vez que Eros falava de alguém nesse tom. E eu não gostei. Por mais que fosse verdade. Aquilo me ofendeu lá no fundo.
- Ele é pai dela. E eu acho que para o bem do nosso relacionamento é melhor pararmos de falar sobre isto. - eu impus um climão no ar. Fícamos em silêncio olhando a Larissa pular os quadrados e jogar a pedrinha.
- Estamos tendo uma discussão de relacionamento? - Eros queria continuar. Eu sentia que ele estava incomodado com o que eu falava. Eu fingi que não ouvi a pergunta. - Eu só pensei que deveríamos ser sinceros um com o outro. Não era esse o nosso acordo? Ser sinceros. Falar o que sentíamos e penssávamos?
- Eu sei. Mas é complicado. Vamos voltar para a festa. Não quero brigar com você. Eu te amo. - beijei os seus lábios quebrando a discussão. - Depois quem sabe eu posso te mostrar um lugar secreto onde íamos dar uns pegas atrás do parquinho.
Eros acabou cedendo. E sorriu. Eu chamei a Larissa e voltamos para a festa.
Marcus estava um pouco alto da bebida. Quem passava perto o olhava num tom de reprovação. Eros fez questão de me levar ao meio do salão para dançar juntinhos.

ErosOnde histórias criam vida. Descubra agora