Os dois primeiros dias são os piores, meu corpo sentiu o gosto do álcool e ele quer de novo. Na segunda e na terça, Will cobre o meu turno porque sabe o meu estado. Já na quarta sou arrancado da cama pela minha mãe, que pelo visto só vai embora quando tiver certeza da minha recuperação.
— Devia dormir com uma roupa. – Ela murmura jogando o cobertor em cima do meu corpo outra vez.
— E você devia voltar para sua casa. – Resmungo sonolento enquanto ela recolhe a roupa do chão.
Nunca fui um adepto ao pijama de dormir, e depois que comecei a ficar com a Katy aboli de vez a ideia de me deitar vestido, porque facilitava as coisas quando acordávamos no meio da madrugada ansiosos um pelo outro. Agora com a minha mãe bancando a general terei que voltar a usar pelo menos uma cueca.
Só me levanto quando ela finalmente sai batendo a porta e me dá um pouco de privacidade, tomo meu banho e visto a farda, checo meu celular como ando fazendo com uma maior frequência e não há nada da Katy para mim. Sei que ela está se comunicando com a minha mãe, ontem acordei depois de tirar um cochilo a tarde e vi a velha sussurrando ao telefone escondida no jardim da cobertura.
Quando chego na cozinha há comida para mais de duas pessoas sobre a bancada, pego um muffin de nozes e me sento em um dos bancos para comê-lo.
— Vai acabar perdendo esse tanto de comida. – Digo ao ver que ela começa a bater ovos numa tigela, com uma velocidade que deixaria a mais veloz das batedeiras com inveja.
— Você sabe muito bem que disparo a cozinhar quando estou nervosa. – Ela continua o trabalho e a tigela de porcelana range em protesto. — E o que sobra estou doando para a igreja.
— Aposto que os mendigos de Chicago estão adorando comer crepe suzette na fila do sopão da igreja batista. – Rolo os olhos ao ver um decorado prato de porcelana com quatro perfeitos crepes dobrados e enfeitados com geleia de laranja.
— Fiz esses porque vou tomar café da manhã com uma amiga. Aliás, você podia ir logo para o distrito porque ela já deve estar para chegar.
Arqueio as sobrancelhas para a sua audácia em convidar estranhos para a minha casa.
— Que amiga é essa? – Pergunto e ela me ignora indo em direção a geladeira.
— Fiz sanduíches de atum para você almoçar. – Minha mãe tira dois sacos de papel pardo da geladeira. — Também preparei uns para o William, sem azeitona porque sei que ele não gosta.
— Fresco. – Comento rindo ao me lembrar de todas as vezes que ela fazia lanches para nós e tinha que fazer o especial do Will, que não come azeitona, cebola ou picles.
— Ele é um bom amigo para você. – Diz ela me entregando os sacos como quando eu ia para escola.
— Sei disso. – Concordo um pouco melancólico. — Vou indo, tenha um bom café da manhã com sua amiga misteriosa. – Digo em tom de deboche e uma pequena luz se acende sobre minha cabeça.
Imagino quem seja a amiga dela.
Coloco o quepe na cabeça, pego os dois sacos e me despeço da minha mãe com um beijo no ar.
Vou para a escada ao sair do apartamento, afim de recepcionar a visita antes da minha mãe. Me sento em um dos degraus e deixo meus sanduíches de lado enquanto espero por quase dez minutos, então escuto o bater dos saltos vindo do andar debaixo.
Ela vira o último lance da escada e se apoia na parede, arfando.
De um jeito estranho meu coração acelera, me assemelhando a um adolescente bobo.
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Anjo Negro [CONCLUÍDO]
RomanceEm um quarto de motel barato, sobre um corpo nu, Katy empunhou a arma, registrando em sua mente a expressão de medo nos olhos da vítima. Enquanto o clímax se espalhava pelo seu corpo, ela disparou, tirando a vida de mais um que segundo o seu julgame...