Dias Sem Fim

1.1K 136 8
                                    

P.O.V Katy

Uma quantidade generosa de pessoas ocupa as cadeiras organizadas no ginásio da maior escola do condado. Há pessoas também nas arquibancadas, e outras nos corredores, de pé, mas escutando atentamente ao que o Pedro fala.

As eleições para Xerife já deveriam ter acontecido no mês passado, mas pela ausência de candidatos foi protelada, o que deu ao Pedro uma oportunidade de se candidatar. Mesmo ele sendo o único concorrente, alguns trâmites são necessários para isso, como a votação, que se ele não vencer por margem de 50% mais 1 voto, a capital do estado delega alguém da escolha deles.

Assisto da primeira fila, entre a Alexia e o diretor da escola, um senhor muito gentil que já nos visitou duas vezes junto a esposa. Todas as pessoas aqui são assim, prosaicas e adoráveis, vivem em um ritmo próprio, bem diferente da bagunça enérgica e caótica de Chicago.

Roberta tem rido da minha cara, nas vezes que nos juntamos para os preparativos do meu casamento, segundo ela irei me transformar numa caipirona com cinco filhos, usando vestido xadrez e botas de montaria. Admito que vejo isso com bastante frequência ao andar pelas ruas do centro do condado, mas tenho conseguido extrair o melhor, mantendo meu escritório e interesses profissionais em Chicago, e usando a casa do lago como meu recanto particular intocável. Dessa forma não me canso, tenho a agitação e a calmaria na medida certa, o que tem deixado o Pedro bastante empolgado, fazendo planos a longo prazo para muitas e muitas candidaturas a xerife.

Ele discursa sobre a infraestrutura da cidade, pretendendo trazer mais recursos, mas de uma forma que ela não perca essa característica familiar, e as pessoas aprovam. Vejo que muitos adorariam ter um comércio mais lucrativo, entretanto, de uma forma que a cidade não se tornasse um quintal de Chicago, onde turistas visitam e fazem o inferno, destruindo o arranjo local. Sua função administrativa permite muitas coisas, muito além do que eu imaginava, o que o faz usar toda a criatividade mal aproveitada como um policial de ação.

Pelos comentários que ouço ele tem grandes chances de ganhar, os homens o respeitam muito, mesmo sendo um recém-chegado, e as mulheres como sempre parecem querer lamber o chão que ele anda. Não as julgo, se não fosse o fato dele amar a minha postura durona e autossuficiente, eu também lamberia, com um sorriso no rosto.

Quando a reunião acaba as pessoas o aplaudem, Alexia tem lágrimas de orgulho nos olhos e eu seguro sua mão, lhe dando forças.

— O Victor adoraria ver o Pedro fazendo algo tão especial assim. – Ela sussurra para mim, com a voz embargada.

— Ele vai ver, assim que voltar. – Digo, sendo positiva.

Ninguém descobriu nada até agora, a Jesy se foi levando com ela a resposta para essa pergunta, e o que podemos fazer é esperar a investigação da polícia. Gosto de reforçar sempre que ele está por aí, talvez apenas perdido, e que uma hora irá voltar, o Pedro quer conclusões oficiais, já ela parece aceitar que acabou. Acho que de nós três, a Alexia é a única correta, afinal eles se amavam, e quando se perde alguém, mesmo sem provas disso, a gente sente.

Experimento do cachorro-quente preparado pela comissão de senhoras da igreja, da qual a Alexia já está fazendo parte, e num instante estou cercada por mulheres me perguntando sobre casamento e filhos. Respondo de forma amigável, jamais teria coragem de ser dura com elas, e isso me surpreende, há um tempo atrás eu não pensava duas vezes antes de mandar um curioso tomar conta da própria vida.

Por um instante os olhos do Pedro cruzam com os meus e ele me dá uma piscadela confiante, ele está no território que domina, o de lidar com as pessoas com simpatia e liderança. Gosto dessa versão, a que está sempre feliz, sem o perigo nos rondando ou a possibilidade de recair no vicio outra vez.

Anjo Negro [CONCLUÍDO]Onde histórias criam vida. Descubra agora