O jantar na casa do William foi agradável, era bom estar cercado por pessoas que gostavam de mim e queriam o meu bem depois de tudo o que aconteceu. Passei a maior parte do tempo brincando com os gêmeos do Thomas, crianças eram criaturas simples, nunca esperavam muito de alguém, bastava lhe dar um pouco de atenção e elas ficavam felizes.
Maitê fez Paella espanhola para nós, e eu comi como se tivesse me despedindo do mundo, fazia tempo que eu não comia algo preparado na hora, meu estômago andava cheio de massa congelada e shake proteico.
Lá para o final da noite a pequena Ivy dormiu no meu colo, após contar todas suas aventuras na pré-escola com seu jeitinho infantil, era a coisa mais engraçada de se assistir. A entrego nos braços de Belinda que beija a testa da filha de maneira afetuosa.
— Ela já está tão grande, daqui uns dias não vou mais conseguir segurá-la. - Ela comentou passando a mão nos cabelos enrolados da menina.
— É só fazer mais um. - Brinquei.
— Quem sabe daqui alguns anos. - Tomas comentou abraçando a esposa de lado.
Fico surpreso, não sabia que eles pretendiam ter mais do que três diabinhos, minha mãe sempre diz que famílias que tem mais filhos do que pais acabam com todos surtados, e por isso a nossa família é assim.
— Vamos ter o nosso daqui um ano, não é amor? - Maitê perguntou para William que fingiu não escutar. — Vamos ter sim. - Ela murmurou nos fazendo rir.
— E quando veremos os pequenos Collins loirinhos correndo por aí? - Bel me perguntou.
— Duvido muito que tenha alguma doida disposta a ter filhos comigo depois que meu nome saiu na primeira página de todos os jornais de Chicago. - Falei acidamente, assim eles não tocavam mais no assunto por medo de estragar o clima.
Em casa, depois de passar algum tempo rolando no colchão tentando dormir me levanto, minha cabeça está doendo, eu já deveria ter me habituado, quase todos os dias ela dói, é o sinal de que meu corpo dependente do álcool está ficando limpo.
Abro uma das caixas que trouxe do antigo apartamento, disposto a organizar algumas coisas até pegar no sono, a maioria é quinquilharia da Jesy, objetos decorativos de péssimo gosto que ela colecionava. Ri ao ver um jogo de talheres com os cabos temáticos entalhados personagens da Disney, aquilo era lixo puro, mas me lembro como ela ficou feliz quando os encontrou num antiquário no centro. Peguei um porta joias pesado, todo de madeira e o abri, dentro havia apenas um antigo cantil de prata, era meu, ela devia ter o escondido ali.
Seguro ele com força, estava ali com minha tentação nas mãos, o balanço levemente e escuto o doce barulho do álcool que o preenche. Eu não deveria beber, isso já me causou tantos problemas... estou limpo há tantos meses, uma recaída seria vergonhoso depois de tudo que passei.
Abro a tampa e sinto o cheiro, posso apreciar um pouco, é o melhor cheiro do mundo, um belo whisky. Salivo ao imaginar o gosto, meu coração dispara no peito, eu me lembro qual é a sensação de ter o álcool entorpecendo os meus sentidos, é ótima.
Então, já sem o controle das minhas próprias ações bebo aquele elixir sagrado para mim em alguns goles. Vejo meu reflexo no cantil bem polido e o jogo no chão.
O que eu fiz?
Droga! Acabei de jogar no lixo o trabalho de meses.
Meu emprego depende da minha sobriedade, os poucos amigos que me restam, a minha família... todos esperam que eu resista a tentação. Mas eu sou fraco demais.
Meu corpo dói pedindo por mais, me levanto e pego a chave do carro sobre a ilha central da cozinha, saio do apartamento em disparada sem ao menos trancá-lo
Acelero pelas largas avenidas, com as janelas abertas, tentando fazer com que o vento limpe o meu sistema e eu consiga voltar ao normal. Olho pelo retrovisor central e então vejo aquele par de olhos castanho esverdeado me encarando, piso no freio e o carro dá dois giros de 360º, por sorte não há ninguém nas ruas. Bato com a mão no volante e respiro fundo, é só a minha imaginação me pregando peças. Ligo o carro outra vez e o manobro até que ele fique alinhado, sigo o meu caminho enquanto meu cérebro dispara imagens daquele dia...
— Você é um fodido de merda, Pedro. - Jesy grita arremessando um de seus vidros de esmalte em mim, por sorte desvio a tempo.
— Eu tive um imprevisto, porra. - Grito de volta e vou até ela. — Para de ser louca, sua filha da puta. - Seguro seus braços com mais força do que pretendia.
Ela cospe em meu rosto e em seguida dá um tapa de mão aberta, sinto cada um de seus dedos ardendo sobre minha bochecha esquerda.
— Você é um mentiroso de merda, Pedro. Aposto que tá comendo aquela putinha, é por isso que tá chegando cada vez mais tarde.
Brigávamos feito cão e gato o tempo todo, mas estava ficando pior a cada dia, ela estressava por qualquer motivo, me xingava e jogava coisas em mim, então eu lhe dava um tapa e saia para beber, quando eu voltava da rua brigávamos de novo e tudo se repetia.
— Quantas vezes eu vou ter que dizer que eu estava trabalhando, porra. - Sacudo seu corpo ainda segurando seus ombros. — Maluca, você é maluca. - Digo olhando dentro dos seus olhos castanho esverdeados.
— Me bate, vamos, eu sei que você quer fazer isso. - Ela grita ensandecida.
Eu realmente estava com vontade de lhe dar uns tapas, mas respirei fundo e a empurrei com força, fazendo-a cair sobre o sofá. Peguei as chaves e sai, não ia ficar perto dela enquanto não me acalmasse.
[...]
— Serviço de emergência, em que posso ajudá-lo? - A voz feminina perguntou do outro lado da linha.
O celular escorregou das minhas mãos ensanguentadas, caindo sobre a cama, o peguei outra vez, tremendo ainda.
— A minha es-esposa. - Gaguejei, meus dentes batiam um contra os outros. — A minha esposa, ela... ela está morta. - A última palavra não passou de um sussurro inaudível.
Estaciono o carro incapaz de continuar a dirigir com aquelas lembranças me assombrando, deito a cabeça contra o volante e respiro fundo contando até 100.
Levanto a cabeça quando me sinto mais calmo e vejo que estou na porta de um bar, ótimo, talvez seja mesmo um sinal, não dá para fugir de quem eu sou.
Vou até o bar, todo o tipo de gente escrota se encontra sentada naquelas cadeiras sebosas. Me encosto num balcão e um velho vem me atender enxugando as mãos num pano sujo sobre o seu ombro.
— Mais uma dose. - Murmuro ao sentir minha cabeça rodopiar.
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Anjo Negro [CONCLUÍDO]
Любовные романыEm um quarto de motel barato, sobre um corpo nu, Katy empunhou a arma, registrando em sua mente a expressão de medo nos olhos da vítima. Enquanto o clímax se espalhava pelo seu corpo, ela disparou, tirando a vida de mais um que segundo o seu julgame...