CAPÍTULO 8

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[POV Valentina Albuquerque]

A luta não é muito diferente de uma dança, a única coisa que você precisa ser é uma dançarina razoável. Meu pai ama frases de efeito, o que sempre rende esse tipo de jargão.

Felizmente a academia de boxe não era muito distante de casa, o retorno seria breve.

-Boa noite, Albuquerque! - os atletas fizeram um coro ao me cumprimentarem todos ao mesmo tempo.

-Boa noite. -assenti.

-Se apresse, o técnico está empenhado em acabar com a gente hoje. - um dos lutadores ao fundo observou.

Agora pronta usando tênis, legging branca e top na mesma cor, me preparava pra iniciar o aquecimento dinâmico.

-Albuquerque, aqui por favor. - o técnico me chamou até sua sala, no canto do galpão.

-Oi? - perguntei para o técnico.

-Oi, como você está? - ele se levantou da mesa e caminhou impacientemente pela sala pelos próximos 30 segundos.

-Estou bem e você?

-Bem. Você lutou muito bem ontem, Albuquerque.

-Obrigada. Mas....? - questionei ajeitando na cadeira.

-Você conhecia a sua adversária? Digo, pessoalmente? - ele voltava para sua cadeira.

Droga. De novo não.

-Não. Não conhecia. - tentei manter a voz serena e despreocupada.

-Entendi. - eu podia sentir sua desconfiança. -Você estava distraída.

-Pai...

-Eu sou seu técnico! - ele bateu na mesa com força. -Me respeite como tal.

Na academia e nas lutas ele é Marcus Albuquerque, meu técnico.

A luta foi a virada de chave na vida de meu pai, antes dela ele não tinha muitas chances, mas foi lutando pelo colégio dele que chegou até os campeonatos mundiais e olimpíadas.

Ele sempre fala que o boxe deu tudo o que ele tem, então sim, ele respira esse esporte. O ponto é que ele sempre quis que eu trilhasse seus passos, sem me perguntar se era o que eu queria fazer. Essa postura colocava um abismo entre nós e fazia ele colocar uma série de regras nos treinos, fora que ele ainda havia o fator Alzheimer.

-Não te dei sequer motivo para me tratar dessa forma, Senhor Albuquerque.

-Você se distraiu! Estava no mundo da lua. - com certeza todos na academia ouviram.

-Eu não me distraí. -falei baixo mais uma vez.

-Todo mundo viu você hesitante, Valentina. - sua voz saiu baixa. -Espero que isso não se repita. Aqui é uma academia de boxe de verdade, não um lugar pra você paquerar e se distrair.

-Eu não estou aqui para ouvir você falar tanta besteira de uma vez só. Sempre dei e continuarei dando meu melhor por essa academia e pelo boxe. - levantei e me aproximei dele que estava sentado. -Isso aqui já deixou de ser por você há tempos, só meu amor pelo boxe me prende aqui. Não você.

-O boxe corre nas veias de nossa família, é nossa tradição, é SEU sonho. - ele me olhou nos olhos. -Você está estragando isso, não vê?

-Meu sonho? - esbravejei. -É SEU sonho projetado em mim, pa...Marcus.

Eu não tenho mais psicológico para suportar esse tipo de situação, de vê-lo perder o controle assim, me ofender no processo e envergonhar na frente de meus colegas de academia.

-Posso ir me aquecer? - engoli seco.

-Tem lutadora nova, não me mandaram a ficha dela, você vai ser a responsável por ela. - seu tom de voz era cheio de desprezo. -Veja se não falha nisso também.

Me retirei da sala incrédula que ainda me sujeito a esse tipo de coisa. Ele não pode mais lutar, não tem mais ninguém...

O silêncio na academia acabou assim que levantei os olhos para os atletas ali parados.

-Continuem o aquecimento. - ordenei.

-Tina, a nova atleta. - Joshua, um dos cutmans que estavam comigo na luta de domingo avisou.

Saindo do vestiário, uma garota de mais de 1,70cm, cabelos ondulados e compridos e olhos escuros caminhava séria e determinada em minha direção.

O quê? Quais as chances?

Luiza Campos se aproximou aparentemente tão surpresa quanto eu.

- Quais as chances? - ela sussurrou baixinho se aproximando de mim.

-Você vai ouvir coisas estranhas, mas por favor, me deixe conversar com você depois do treino para que eu explique?

-Está tudo bem, Valentina.

-Vamos lá, formem suas duplas! Ben, nada de sabotar o exercício, quero o movimento completo. - falei enquanto caminhava pelo ringue iluminado no centro do ginásio. - 30 burpees seguidos de uma sequência de jab, direto, uppercut e esquiva. Revezem a defesa.

Éramos em certa de 30 atletas, variando entre homens e mulheres, a academia Eagle Fire Of Manhattan era conhecida principalmente por causa de meu pai, o que atraía muitos atletas do mundo todo. Os critérios para ingresso na academia eram rígidos, Marcus inspeciona pessoalmente os processos seletivos.

-Campos, você está comigo. - falei colocando as luvas de boxe.

-Certo. - ela fez o mesmo.

-Podem começar. - o som dos golpes colidindo com as luvas de pancada.


Predestinadas - ValuOnde histórias criam vida. Descubra agora