Capítulo 3 - Diferença

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Luke desce do trem e fala com certa indiferença com o pai, lhe dando um abraço frio. Depois cumprimenta educadamente a prima e os tios. Seus olhos ficam um pouco marejados ao abraçar os dois. Ele é alto, cabelo loiro escuro, liso e um pouco cheio. Os olhos são verdes e é um pouco forte. Annalize reparou em sua mãos, tinham algumas pequenas cicatrizes de cortes, estranhou aquilo. "Em que um estudante de economia machuca tanto as mãos?"Pensou. Ela fica surpresa com a diferença entre pai e filho, em todos os sentidos. Daguerre demonstrou-se muito solícito a ajudar com as malas e deu uma boa gorjeta para o pajem. A viajem para casa se deu em silêncio. Chegando lá Luke foi direto para o quarto, antes do jantar ficou conversando com George e Antonia na biblioteca. Annalize se encheu de curiosidade para saber como estava seu primo, como ele era afinal.

Chega a hora do jantar e todos estão à mesa. Daguerre inicia a conversa.

- Então meu filho, como foi a viajem? - Pergunta ele cruzando as mãos e apoiando os cotevelos sobre a mesa.

- Cansativa, entediante... não acho outros adjetivos- disse friamente. Enquanto fala, Luke faz um som irritante com a faca cortando a carne no prato.

- Uhn, entendo - Diz Daguerre com um sorriso sem graça, voltando-se para seu prato.

- Bom - George fala, interrompendo aquele clima estranho - o importante é que você chegou, a família estará toda reunida para a entrada do novo ano!

Luke, assentindo, dá um sorriso gentil e fraternal para George. Annalize ficou pasma com o modo que ele tratou o pai. Ela não disse uma palavra a noite toda, ficou só observando, Luke também a ignorava. Depois do jantar George e Luke conversaram mais um pouco e os outros se retiraram.

No dia seguinte, no café da manhã, algo estranho aconteceu. Nina, a empregada, deixou a xícara de café de George cair ao servi-lo, parecia nervosa. Mas não é aí que está a estranheza. Estranho mesmo foi quando Daguerre se levantou, dispensou a empregada delicadamente - algo raro para não dizer impossível - e ele mesmo serviu George num jogo de movimentos - xícara, açúcar, café - que deixou Annalize tonta. Ela pôde ver os olhos incrédulos de Luke diante da cena.

- Obrigado meu irmão, não precisava se incomodar - Diz George com os olhos cheios de esperança, nunca vira seu irmão ser gentil com ninguém, com excessão de sua mãe, Mariana e Antonia.

- Imagina, não foi nada George, não foi nada - responde ele.

Antonia olhava a situação com expressão duvidosa e foi até a cozinha ver se Nina estava bem. Annalize percebeu. Depois do café ela foi para o jardim procurar o senhor Tatsuo.

Esses dias estavam um pouco vazios para Annalize, que costumava ter aulas particulares à tarde, algumas vezes por semana, apesar de não ser um costume da época mulheres aprenderem mais do que os deveres domésticos e sociais. Ela teve aulas de História, Geografia, Latim, Poética, Filosofia, dentre outros, dadas por Arthur, grande amigo de George que se tornou professor e pastor de uma capela batista da cidade. Arthur era um homem bem visto por todos da comunidade, pelas obras caridosas que fazia e por dar excelentes discursos que eram ouvidos por pessoas de diferentes classes. Muitas vezes políticos se aproximavam dele buscando algum tipo de apoio em sua boa fama. Arthur não se vendia a nenhum deles, mas precisava de muito jogo de cintura. Este mês ele viajou com sua esposa para Londres, visitar parentes e amigos e Annalize já via a saudade que sentiria das aulas que agora com seus 18 anos se completaram.

Já no jardim, depois que George e Daguerre saíram e Luke desapareceu de sua vista, ela voltou a pensar no envelope que encontrara na gaveta de Daguerre. "Se o tio Daguerre parece estar um pouco diferente, não ligando para a rispidez do filho, sendo gentil com empregados... Então será que está mesmo doente? Ou será sentimento de culpa? E se doente, seria algo grave a ponto de fazê-lo mudar o seu jeito de ser? Talvez acônito seja o remédio..." Enquanto andava teve seus pensamentos interrompidos ao ouvir uma voz que dizia: - Não acredito! - Procurando entre as roseiras encontra seu primo parado olhando para dentro de uma pequena fonte no meio do jardim. Ela leva um susto quando ele se vira rapidamente em sua direção, quando ouviu seus passos. Annalize não sabia o que dizer, pois ele não falou com ela desde que chegou.

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