Rosas Vanklein. Era o que estava escrito na grande placa na porta principal da fábrica. Nos fundos dela chegavam os carregamentos de rosas, de uma parte seria retirado o óleo essencial para a produção de perfumes e de outra a parcela para revendedores de flores e arranjos.
Beth e Annalize estão paradas na calçada encarando os portões.
- Então... É isso – diz Beth esfregando as mãos enluvadas para esquentá-las – entramos, você fala com Charlie, tira suas dúvidas e eu ganho um perfume de graça.
Annalize ri. Sabe que Beth está brincando, ela poderia comprar quantos perfumes quisesse.
- Me leva um dia ao roseiral?! – Beth pergunta como se acabasse de pensar nisso, com o tom um pouco esganiçado.
- Claro, um dia, agora vamos – Diz Annalize e as jovens caminham em direção ao portão.
Um homem na porta as encara um pouco surpreso.
- Senhorita Vanklein? – o homem parece um pouco constrangido, como se não soubesse que palavras usar.
A essa altura a tragédia da família Vanklein transcorria nas rodas de conversa da cidade. A alta sociedade estava atenta para saber como tudo terminaria e como ficaria a partilha da herança. Os mais simples da cidade, além das fofocas gerais, estavam um pouco preocupados, já que, se a desventura da família atingisse de alguma maneira as Rosas Vanklein, muitos poderiam perder seus empregos.
- Sim, sou eu – diz de maneira educada.
Percebendo que o homem não sabia o que fazer, Beth toma a frente.
- A própria, uma das donas da fábrica, será que poderia nos dar licença? – ela diz levemente ríspida.
- Cla... Claro – ele gagueja e abre caminho para que elas passem, mas sentindo que aquilo não era o certo a se fazer.
As moças deparam-se com a grande estrutura interna da fábrica. Centenas de homens andam de um lado para o outro carregando cestas cheias de folhas, caules, ou pétalas de diferentes cores. Outros organizam caixas de rosas ainda em botão. Máquinas de extração de um lado, homens com tesouras de outro.
Elas andam olhando ao redor e os operários as observam espantados, mas continuam o serviço. Em outro ambiente veem vidros de diferentes formas e tamanhos cheios de líquidos enfileirados em grande quantidade. Mulheres com conta-gotas e funis movimentam-se entre eles.
Elas respiram fundo. O cheiro é penetrante. Annalize tinha uma vaga lembrança das poucas vezes que foi à fábrica na infância. Mas agora muitas coisas haviam mudado, das quais ela ainda não tinha visto, apesar de saber das transformações.
A evolução da ciência na área química trouxe os laboratórios para a indústria perfumista, junto com a descoberta das estruturas das moléculas perfumadas. O que facilitava a criação de novas fragrâncias. As Rosas Vanklein proporcionavam a renomados perfumistas, alta qualidade de matéria prima que faziam toda diferença para suas essências.
- Com licença – um senhor baixinho de terno e óculos, que parece conhecê-las, as intercepta de maneira amigável – senhoritas, o que fazem aqui?
- Senhor Frederick – Annalize também o reconhece dos constantes jantares que já frequentaram – procuramos por Charlie.
- Ele está em minha sala, posso levá-las até lá. Há algo mais que eu possa fazer? – ele pergunta.
- Nos levar até ele já seria ótimo – Beth diz com seu sorriso costumeiro.
Senhor Frederick faz sinal para que elas o acompanhem. Passam por mais alguns ambientes e sobem uma escada. O fundo sonoro de vozes falando e máquinas trabalhando diminui um pouco. Um rapaz com uma pilha de papeis desce correndo enquanto eles sobem e provoca uma pequena chuva de possíveis documentos ao seu redor. Rapidamente se abaixa e sem olhar para cima começa a recolhê-los.
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Pedra Negra
RomanceNo decorrer da história do mundo presenciamos objetos fazerem parte de nossas vidas, damos significados à eles e muitos atravessam gerações. Mas, o que é realmente interessante são as histórias de vidas inteiras que se atravessam nessas peças, entre...