Capítulo 20 - Cuide Dela

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Os acontecimentos que se seguiram naquele dia não eram esperados. O frio pareceu ter trago consigo uma névoa de farsa e dor. O coração do homem é enganoso, diz o provérbio, quem o conhecerá? Conhecemos o nosso? Talvez alguns lados dele. Nos surpreendemos quando nos deparamos com perversidades, maquinações para o mal, falsidades, mas cada um sabe a verdade de si que existe em suas mentiras.

As mentiras de Daguerre não se mostravam mais suficientes. Mas uma última, eficaz, poderia ajuda-lo a conquistar o que queria de uma vez por todas. Daguerre e seus contatos, sua altivez, sua presença imponente. Construiu-se assim, como uma questão de sobrevivência. E queria mais. Ele odiava o que considerava medíocre e sentia sua posição na vida medíocre. Ao lado de George isso só recebia mais destaque.

Sentado à mesa do escritório bebia seu chá trazido por Nina com tranquilidade. George chegou e sentou-se à sua frente.

- Bom dia Daguerre.

- Bom dia George – disse colocando a xícara sobre a mesa – está disposto a falar dos franceses agora?

- Na verdade quero conversar sobre outra coisa – disse apoiando os braços sobre a mesa.

- Sou todo ouvidos meu caro – sorriu.

George o encarou triste por uns segundos.

- Você sabe o que é acônito? – foi direto.

Daguerre não esboçou nenhuma reação, expressão impassível.

- Claro, é uma planta medicinal, também venenosa, por quê?

- Isso não te faz pensar em nada? Não quer dizer nada pra você?

Daguerre ajeitou a xícara e o pires sobre a mesa, sem necessidade. Com expressão triste Daguerre suspirou.

- Sim George – disse ele. O coração de George acelerou, ele torcia para que tudo fosse um grande engano.

- O que isso... O que isso quer dizer para você Daguerre? – perguntou com voz fraca, tossindo um pouco.

- Você descobriu não foi? – perguntou e os olhos de ambos estavam marejados. Uma primeira lágrima caiu de Daguerre ao piscar – me sinto completamente envergonhado.

George sentia tudo a sua volta desabar, não podia ser verdade.

- Como pôde? – suas lágrimas também caíram – somos irmãos! E ainda que não fôssemos isso é... Isso é um crime, é abominável... – perdia o ar. Daguerre arregalou os olhos e colocou a mão no peito.

- Mas... George, eu sei que isso não é autorizado pela lei, mas abominável? Eu só estava tentando vencer anos de sofrimento! – disse Daguerre gesticulando com as mãos.

- O que?! – havia revolta na voz de George.

- Sim, você sabe o sofrimento que sempre foi para mim lidar com essas manias – mexeu na xícara novamente com rosto sofrido – na barraca de flores, era terrível para mim vê-las todas misturadas, na escola, nas festas, visitando parentes... Controlar esses impulsos é desgastante George e às vezes, eu só tenho paz se os satisfaço...

Com o cenho franzido e a boca um pouco aberta George o encarava pasmo.

- Do que você está falando?! – Gritou ferozmente e tossiu mais.

- Mas não é disso que estamos falando?! Por eu ter comprado acônito para uma tentativa de tratamento aos meus problemas? Não imaginei que você ficaria tão irritado com isso – disse triste – tenho procurado por anos algo que possa funcionar e ouvi falar de acônito, pode perguntar ao Dr. Hall, era arriscado, eu sei, mas eu precisava tentar, com a idade parece que tem piorado George – disse passando as mãos sobre o rosto expressando uma angústia verdadeira. Começou a lembrar do passado e a justificar a sua distância e frieza por seu sofrimento, comparando-se com George, que segundo ele, teve uma vida melhor.

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