Depois de uma madrugada reflexiva e triste, acordei pela manhã com o barulho de um soldado batendo na grade.
- Acorde logo! Visita do advogado. Está achando que isso aqui é uma hospedaria? – dizia o rapaz me olhando com desprezo.
Levantei de pressa e fui levado para uma pequena sala. Pequena mesmo. Onde Samuel me aguardava. O soldado permanecia na porta em guarda. Samuel colocou-me a par da minha situação, que não é muito boa e tentou me tranquilizar, dizendo que Annalize e minha tia estavam bem e logo seriam convencidas a sair da mansão. Disse que Arthur também estava as ajudando e isso realmente me tranquilizava um pouco, saber que não estavam sozinhas.
Claro, perguntei por Joana. Samuel deu uma tossida e começou a falar mais baixo.
- Ela pediu para lhe entregar algo – sussurrou. Arqueei as sobrancelhas de imediato e encarei Samuel, esperando que ele continuasse ou me entregasse o que quer que fosse.
- Não dá para lhe entregar assim. Mas fique atento. Você receberá de algum modo – ele afirmou, me deixando curioso e aflito. Samuel deu um leve sorriso me observando por alguns segundos.
Comecei a pensar se ele sabia do meu envolvimento com Joana. É claro que sim. Ele é como um pai para ela. Isso me deixou um pouco nervoso, será que devia pedir permissão a ele ou algo do tipo? Apesar de Joana ser independente e nada convencional? Mais que diabos! Sou um prisioneiro... O que diria?
"O senhor me permite cortejar a senhorita Joana para um compromisso, apesar de já termos pulado algumas etapas e já sermos bastante íntimos e eu estar preso por suspeita de assassinato?"
Não. Não seria nada bom.
Agradeço a ajuda de Samuel mais uma vez, como tenho feito sempre que o vejo. Ele disse que é seu dever e a justiça precisa ser feita e que acredita em mim. Antes de sair, ele disse uma última coisa, apertando meu ombro com uma mão.
- Você não se parece nada com seu pai meu jovem. Deveras, lembra muito seu avô Joseff – eu sorri e meus olhos encheram-se de lágrimas – fique bem rapaz. Volto ainda essa semana.
Assenti e fui levado de volta à cela.
Naquela noite, estava observando os desenhos de Tom na parede – ele desenha realmente bem – quando fui chamado pelo soldado Thomas do outro lado da grade. O corredor estava mal iluminado, mas pude ver sua expressão não muito boa. Fiquei preocupado, podia ser uma notícia ruim.
Alguns escárnios foram ouvidos das outras celas. Alguns prisioneiros diziam que eu estava recebendo muitas visitas hoje. Outros que eu tinha privilégios por ser rico. O soldado apenas lançou lhes um olhar fulminante, perguntando com voz grave se eles haviam esquecido quem ele era e o silêncio instalou-se. Ele parece ser bem respeitado por aqui.
Voltando-se para mim, que já estava de pé, ele aproximou-se da grade e apontou com o olhar para as mãos. Observei aquilo que parecia ser uma pequena colcha dobrada.
- Esta cela está com um prisioneiro a mais – disse ele me passando a colcha dobrada pelo vão das grades – segure com cuidado – sussurrou – cada um tem a sua coberta, não queremos nenhuma epidemia de tuberculose por aqui – disse um pouco mais alto.
Assenti um pouco confuso, mas ao pegar o tecido senti que ele envolvia algo duro. Instantaneamente lembrei-me do aviso de Samuel e segurei a colcha com mais afinco.
- Obrigado – eu disse baixo. Ele balançou a cabeça levemente em concordância.
- Desculpe, mas eu tive que ler, por precaução. – Dizendo isso o soldado se retirou.
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Pedra Negra
RomanceNo decorrer da história do mundo presenciamos objetos fazerem parte de nossas vidas, damos significados à eles e muitos atravessam gerações. Mas, o que é realmente interessante são as histórias de vidas inteiras que se atravessam nessas peças, entre...