03 - A f t e r C l a s s . . .

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Ela caminhou, apertando a alça da bolsa marrom e se sentou do outro lado da sala. Na segunda carteira.
Ela começou a tirar as coisas da bolsa, enquanto o seu cabelo escondia a maior parte do seu rosto.
Então ela parou tudo, arqueou o corpo e olhou em volta, como se sentisse um olhar queimar sobre sua pele.
Na hora, peguei o lápis e voltei a copiar os temas do quadro, porque não queria que ela me pegasse no flagra.
Mas aí, quando a professora voltou a explicar e ela se voltou á lousa, eu me voltei á ela.
Posso dizer que fiquei encarando ela, durante a aula inteira e reparando em todos os detalhes que eu pude daquela distância.
De vez em quando, enquanto a professora expunha uma questão ou fazia um comentário solto sobre o tema, a garota retribuía as especulações e apresentava comentários, no mínimo inteligentes.
Ela gostava de participar.
Ela era inteligente.
Fiquei prestando muita atenção; talvez eu pudesse descobrir o nome dela.
Mas isso não aconteceu.
E quando a aula acabou, ela foi uma das primeiras a levantar e passar pela porta.
Eu fiquei sentado lá; estático na cadeira por um tempo. Pensando sobre os poucos detalhes do rosto dela que eu sabia.
- Victor?
Fui até a mesa da professora.
- Está tudo bem? Você não falou muito.
- Desculpe, professora. Mas eu não costumo falar nas aulas, prefiro fazer as minhas anotações.
- Será que eu posso dar uma olhada? - ela convidou e eu assenti, a mostrando meu caderno. - Hum, muito bom. - ela assentiu, ainda lendo. - Gostei do seu jeito de se expressar. - ela me devolveu o caderno. - Se precisar de alguma coisa, pode me procurar, ok?
Eu apenas assenti, guardando meu material para ir para aula de inglês.
Pensei ainda em a perguntar o nome da garota de cabelos rosa. Mas não considerei a ideia. Seria muito inconveniente da minha parte, então eu peguei minha bolsa e fui embora.

Infelizmente, eu não a vi mais em nenhuma aula pelo resto do dia. Nem no intervalo. O qual passei sozinho com um dos meus mangás de one piece.
O engraçado era que, eu vira tanta gente, mas tanta gente e nenhuma chamou meus olhos, como ela fez. Ninguém parecia ser tão interessante como ela. Ninguém parecia poder superar aquele cabelo rosa.
Então eu passei a me perguntar, como alguém com um cabelo tão bonito, podia passar tão despercebida? Era como se ela não estivesse lá, depois da aula de história. Então por um momento, ela se tornou só uma lembrança na minha cabeça.
- Tragam um livro que gostem na próxima aula. - pediu Fabiano, meu professor de Literatura.
Eu gostara dele também. Ele era estranhamente animado e tinha um jeito meio esquisito de explicar, mas fazia a aula ser bem divertida.
Esperei o tumulto de pessoas passarem e só depois me arrisquei a descer as escadas.
Eu tirei meus fones de ouvido e guardei meu celular na bolsa.
Eu era meio paranóico e vivia há tempo suficiente em Guarulhos para não confiar nas ruas, nem nas paredes. Tudo era traiçoeiro.
Eu atravessei a rua; eu não queria ir de ônibus, então eu simplesmente precisava seguir e estava tudo exatamente bem, até algo do outro lado chamar minha atenção.
Era ela.
De novo, era ela.
Ela usava uma toca, que tinha orelinhas de ursinho e ela andava tranquila , com as mãos apertadas na alça da mochila. Achei ser um hábito dela, tão cotidiano, que ela fazia sem nem perceber.
Guardei aquilo para mim.
Nós estávamos praticamente no mesmo ritmo, a diferença era que cada um estava numa calçada diferente.
Ela estava ouvindo música; eu podia ver o fone preto se perdendo dentro da sua blusa de zíper.
E então, quando estávamos no final de nossas calçadas, quando íamos virar para nossos respectivos caminhos, ela olhou para o lado.
Senti como um choque, porque não deu tempo de eu desviar e fingir ser um cara normal.
Tirei o olhar dela o mais rápido que eu pude de mim, e continuei olhando reto; pareceria um encontro aleatório de olhos, se eu pelo menos conseguisse piscar.
Não sei por qual impulso eu olhei de volta; ela continuava me olhando. E meu Deus do céu, ela estava tão séria.
Não consegui a encarar por mais que três segundos, mas valeram três minutos inteirinhos.
Cruzei a próxima esquina.
Mas a minha casa era para onde ela estava indo.
Eu simplesmente parei numa lanchonete e fingi observar as balas de lá, até que o rosa do seu cabelo pudesse sumir do meu campo de visão.
Eu estava assustado.

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