22 - H a n d s

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Um macarrão com molho de legumes.
E vários sorrisos numa mesa só.
Eu sinceramente não pensei que uma família pudesse ser tão compatível, como eles eram.
Ao contrario do que parecia, o senhor Sandle, era um homem muito sorridente e de vez em quando, ele arriscava uma brincadeira.
E sobre a senhora Sandle, agora eu entendia da onde Lisa herdara o astral alegre. Ela e Lisa trocavam diversas piadas internas e a mãe zombava dela como se fizesse parte de algum grupo adolescente. Era engraçado.
O sorvete de cereja era a coisa mais impressionante que eu já havia provado. O gosto brincava na minha língua como se dançasse.
Eu até repeti, e depois Lisa e a mãe dela disputaram pelo pequeno pote de sorvete.
Foi uma cena divertida, enquanto Lisa pulava em cima da mãe para tentar recuperar a caixa, e a mãe movimentava os braços curtos, por isso não tinha muita vantagem:
- Duas baixinhas brigando...
- Porque você é muito alto. - sua esposa disse.
- Elas são bem estressadas. - ele comentou para mim, como um segredo e eu sorri.
Peguei a liberdade de soltar um comentário:
- É assim toda vez que tem sorvete de cereja?
- Você não conhece a história do sorvete de cereja, não é? - eu neguei com a cabeça. - Vem cá. Deixa as duas se matarem. - ele colocou a mão nas minhas costas e me levou até a sala. - Quando eu conheci a Suzana, eu era um garoto muito tímido, então demorou meses para eu a levar para sair.
"Quando eu consegui, resolvi que a levaria à uma sorveteria no centro de São Paulo. Uma das melhores.
"Juntei dinheiro por um três meses, carregando compras de velhinhas e a levei para sair..."
- E aí, eu bati o olho no sorvete de cereja. - a senhora Sandle, veio andando com o pote de sorvete nas mãos e uma colher de cabo de canela. - Era o sorvete mais caro da sorveteria e eu quis, sem nem me importar.
- Então eu comprei um de cereja para ela, e um de limão para mim. - ele continuou.
- Mas aquele sorvete era a coisa mais impressionante que eu já havia comido, então eu decidi que ele tinha que provar. - ela arregalava os olhos, contando aquilo muito animada.
- Então, ela enfiou uma colher cheia na minha boca, tão fundo, que quase vomitei tudo.
- E você gostou? - eu perguntei, querendo saber o fim da história.
- Eu odiei. - os dois gargalharam furtivamente. - Mas aprendi a gostar. - eles trocaram um olhar que eu pensei que era exclusivo dos adultos, até encontrar Lisa.
- Cadê a Lisa?
- Quem sabe? - disse a mãe dela com a colher na boca. - Vá procurar por ela.
Eu apenas assenti e sai em direção as escadas.
Me guiei pelo som, até chegar a uma porta pintada de azul claro com nuvenzinhas de cartolina coladas.
- Lisa? - abri um pouquinho a porta e ela estava deitada na cama de solteiro, encarando o teto, com as mãos sobre a barriga.
Encarei o rostinho oval dela, embravecido e um sorriso interno, quase me escapou.
Me deitei do lado dela e também encarei o teto:
- Não precisa ficar brava. - considerei. - Eu compro mais para você.
- Compra mesmo? - eu assenti.
Depois disso continuamos em silêncio.
Até que os dedinhos dela se pousaram nos meus, e eles se entrelaçaram como se fosse o curso natural das coisas.
- Você ainda não disse se me desculpou.
- É obvio que eu o desculpei. - ela virou o rosto para mim e sorrimos um para o outro.
- Você tem olhos bonitos, Algodão Doce. - e eles pareceram ainda maiores quando sal sorriu.
Ela se aproximou de mim, e foi como se eu pudesse ver todos os detalhes do seu rosto.
Percebi que a boca dela abriu um pouquinho e a minha instintivamente abriu um pouco.
Me senti nervoso, mas eu sabia o que ia acontecer.
Ela fechou os olhos e eu pude ver seus cílios.
- Lisa, já são quase nove horas. - uma voz veio lá de baixo do pai dela.
- Acho que é melhor eu ir. - dei praticamente um pulo.
- Eu te levo no portão.
Nós descemos as escadas. Ambos com cara de culpados, foragidos da interpol, a inocência ainda estampada no rosto dela, traços de felicidade no meu.
- Boa noite, senhor e senhora Sandle.
- Boa noite, Victor. - disse a mãe dela com um leve aceno.
- Boa noite, rapazinho. - o pai dela apertou minha mão.
- Então, se você quiser me buscar aqui para ir para escola, eu não me importo. - ela me disse no portão.
- Vou estar aqui. - ela assentiu.
- Vai me dar um boa noite, ou não?
- Anh, me desculpe... - me senti meio deslocado. - Boa noite, Lisa.
- Boa noite, Victor.

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