- Filha, preciso falar com você. – Fala Paulo para a filha que estava terminando de se arrumar no quarto.
- Precisa ser agora, pai? Tenho uma reunião com um cliente e estou atrasada. – Responde Andreia enquanto pega a carteira, o batom e as chaves do carro que estavam sobre o colchão da cama de casal e coloca dentro da bolsa.
- Seria melhor que fosse agora, sem a presença do Antonio. Acho que o que eu quero sugerir a você, ele não concordaria.
- Então deve ser sobre o Davi. – Conclui Andreia, largando a bolsa e levantando os cabelos, amarrando-os em uma espécie de coque e se sentando na cama.
- É sobre ele sim. Sobre ele e sobre o Centro em que estivemos. – Responde Paulo enquanto afasta algumas peças de roupa para poder sentar-se na cama.
- Pai. O senhor sabe que meu casamento não está nada bem. E que uma briga sobre isso, agora, só iria piorar tudo.
- Mas não é sobre seu casamento que você precisa pensar, filhe. É sobre seu filho. Davi já está sofrendo há muito tempo. Não é justo com ele esse tipo de atitude.
- E conosco, pai? É justo criarmos esperanças mais uma vez de que tudo ficará bem? Acharmos que se o Davi começar a frequentar esse Centro ele vai ficar bom? E se nada acontecer, pai? Se mais uma vez for somente uma esperança infundada? Eu sei que é difícil, mas às vezes acho que o Antonio tem razão. Que o melhor é seguirmos a nossa vida cuidando do Davi como podemos sem termos mais esperanças de que um dia ele irá melhorar.
- Não faça isso, filha. Não perca a esperança de que seu filho pode ficar bem. Isso não é bom nem para você e nem para ele.
- Pai, por favor. Já levamos o Davi aos melhores especialistas que pudemos levar. Ninguém conseguiu diagnosticar nada.
- Exatamente por isso que ainda tenho essa esperança. Talvez o que ele tenha não seja um problema físico, talvez seja uma doença da alma e nesse caso a medicina não poderia ajudar mesmo.
- Pai, por favor... – Pede Andreia.
- Você esteve lá comigo. – Insiste Paulo. - Só o que eu peço é uma chance. O Antonio viaja nessa semana, podemos ir lá amanhã e ver o que deve ser feito.
- Por que isso novamente? O que fez o senhor voltar a tocar nesse assunto?
- Sua mãe.
- Como assim "minha mãe"?
- Sua mãe está cuidando do Davi.
Andreia olha assustada para o pai. Tentando acreditar nas palavras que acabara de ouvir.
- Pai... O que o senhor está falando? Que estória é essa?
- Não é estória, minha filha. Hoje de manhã, sua mãe esteve aqui em casa.
- Pai. A mamãe está morta.
- Eu sei filha. Ele esteve em espírito, em alma. E antes que você pense que eu estou ficando demente, converse com a Rosilda. Ela está comigo no quarto na hora em que aconteceu.
- Foi verdade, dona Andreia.
Na cozinha do apartamento, Andreia e Paulo estão de pé, perto de Rosilda que responde lavando as mãos sujas com a cebola que acabara de picar, na pia da cozinha.
- Eu não saberia lhe explicar exatamente como foi. Só sei que quando vi ela estava falando umas coisas que só a dona Marta podia falar.
- Ela? Ela quem?
Rosilda olha nervosa para Paulo.
- Quem esteve aqui em casa visitando o Davi, pai? – Pergunta Andreia, já nervosa.
- Ela não veio visitar o Davi, filha.
- Mas esteve no quarto do meu filho. Quem foi?
- Aquela moça que lhe falei. Aquela que me disse no elevador do prédio do advogado que eu deveria procurar o Centro.
- E, claro que, convenientemente, ela veio até aqui, agora para lhe dizer que a mamãe está cuidando do Davi.
- Filha...
- Papai! Me admiro do senhor. Um homem inteligente, culto, preparado.... Se deixar enganar desta maneira tão tola, tão infantil.
- Não me trate deste jeito. Você não estava aqui. Não sabe o que aconteceu naquele quarto. Não ouviu o que eu ouvi.
- O senhor ouviu o que qualquer homem na sua situação gostaria de ter ouvido. Palavras de consolo, um lampejo de esperança jogado no seu peito.
- Não é verdade. Eu sei exatamente o que Marta disse para ela. E sei que essa moça não tinha como saber aquelas informações.
- O senhor não disse que essa moça trabalha no escritório de advocacia que o senhor procurou para processar os médicos do Davi?
- Sim, trabalha. E daí?
- Daí que ela pesquisou sobre o senhor, sobre o Davi, sobre nós. Sabe tudo o que precisa para lhe iludir, lhe enganar.
- Você está sendo leviana comigo e com a moça.
- Pai, eu estou sendo verdadeira. Não queira cobrir a verdade. Eu sei que dói muito. Eu sou a mãe do Davi e sei como vê-lo deitado daquele jeito, como um vegetal. Mas, infelizmente, essa é a nossa verdade. É o que aconteceu conosco e temos que aceitar.
- Não. Nunca. Eu não posso aceitar que Deus tinha sido seja tão cruel conosco.
- Deus esqueceu de nós, aceite.
Paulo leva a mão em direção ao rosto de Andreia com violência, mas para a alguns centímetros de lhe desferir um tapa. Andreia olha assustada para o pai e fala, nervosa:
- Em que isso ia lhe ajudar meu pai?
- Nunca mais blasfeme dessa maneira na minha frente. – Fala Paulo irritado. Ele respira fundo, baixa sua mão devagar, vira-se de costas para Andreia, se apoia com os dois braços na cadeira do conjunto de copa vermelho e branco, baixa a cabeça e fala para a filha. - Sempre lhe respeitei, mas agora, você passou de todos os limites. Por mais que você não queira acreditar, foi sua mãe que passou as informações que foram me ditas esta manhã aqui em casa. Aquela moça me disse coisas que só sua mãe e eu sabíamos. Ela me disse o que precisa ser feito para que meu neto, seu filho, seja curado e cesse esse terrível sofrimento pelo qual ele está passando. Se depender de mim, eu o levarei amanhã mesmo àquele Centro para tentar curá-lo de qualquer maneira. Acredito que iria até o inferno para ver meu neto saudável novamente. Mas, infelizmente, não depende só de mim. Como você e seu marido cansam de me dizer, o filho é de vocês, mas rezo que Deus ilumine seus pensamentos e mostre a vocês que ele é maior que tudo e que, apesar de todo o sofrimento que estamos passando, Ele nos ama sim e não esqueceu de nós como queres acreditar, filha. – Paulo levanta a cabeça e começa a caminhar para a porta da cozinha. – Me desculpem, mas estou muito cansado e preciso ir para o meu quarto descansar.
Andreia e Rosilda ficam caladas, olhando Paulo se afastar lentamente. Depois que ele sai, Andreia puxa a cadeira da mesa e se senta nela.
- Meu Deus! No que eu me transformei? O que está acontecendo comigo? – Suspira Andreia abaixando sua cabeça na mesa.
- É esse sofrimento toda que a senhora tá passando dona Andreia. – Fala Rosilda. – Não tem como alguém aguentar tudo isso sem explodir uma hora.
- Mas eu nunca pensei dessa forma Rosilda.
Rosilda pega um copo de água para Andreia, entrega para ela e se senta ao lado dela.
- Me desculpe pelo que eu vou lhe dizer dona Andreia. Eu trabalho para o seu Paulo e para a senhora há mais de vinte anos. Eu vi tudo que aconteceu, eu tava naquele quarto e não tinha por que lhe enganar, as coisas que aquela moça falou para o seu Paulo, só a dona Marta poderia saber mesmo. E a senhora vai achar que eu tô ficando maluca, mas até o perfume do quarto mudou quando a moça entrou com o seu Paulo.
- Como assim "mudou o perfume do quarto"?
- Era o cheiro da dona Marta. O mesminho perfume que ela usava. Perfume de rosas.
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Médiuns (Completo)
Romance🥇1º Lugar na Categoria ESPÍRITA nos meses de novembro e dezembro de 2023 e janeiro de 2024. 🙏🏻 🥈TOP 3 nas Categorias ESPIRITISMO, MEDIUNIDADE e PARANORMALIDADE, em Janeiro de 2024. 🙏🏻 Como você se sentiria entrando em um mundo que nunca acredi...